GILBERTO GIL
tima hora, não havia quartos em lugar algum, dai
deram a ele um hotelzinho de periferia. Eram umas
duas e meia da tarde quando chegamos na cidade e eu
falei: 'Gil
, vamos comer alguma coisa no hotel onde
estou e depois a gente vai procurar o seu! Quando
entramos no saguão, a diretora do hotel, um dos
melhores de lá, olhou pra ele e gritou assim: "Gilbe
eeerto Gili! [imitando sotaque). E aí veio, falou
que era få dele, que tinha todos os discos. No fim,
acabou que ele ficou hospedado nesse hotel e ainda
pagou metade do
preço que eu paguei, gentileza de
sua grande admiradora." Apesar das trajetórias tão
diferentes, Furlan diz que a amizade com Gil tornou-
se
e fraterna, deve perdurar. "Que eu me lembre, tive
uma só discordância com o Gil, que foi em relação
aos transgênicos - ele é contra os transgênicos e eu
defendo a tese de que é burrice você criar obstáculos
ao progresso da ciência. E foi uma divergência técni-
ca, nada de apaixonante."
A capacidade de Gil como gestor foi um dos pon-
tos bastante discutidos ao longo do mandato. Sua
formação como administrador de empresas, em 1964,
na Universidade Federal da Bahia, e a breve experi-
encia como executivo na Gessy-Lever, em 1965, não
foram suficientes para fazê-lo tão famoso na vida cor-
porativa como na arte. Mas é
existe, o que ele reconhece a suvel que essa faceta
que sim, tenho a
impressão de que isso deve colaborar, por causa das
noções de métodos e organização e gestão e... Os ru-
dimentos de mercadologia, de marketing que aprendi,
as relações, cadeias produtivas, as cadeias criativas,
essas coisas que são noções básicas da época acaba
ram ficando. São referências, orientações, o gosto
pelo negócio bem gerido, bem organizado." Furlan ve
nele os traços dos grandes líderes. “É um empresário
bem-sucedido, uma pessoa que tem respeito no setor
em que trabalha, constituiu um patrimônio, lidera um
grupo de pessoas que dependem dele, da organização
114 ROLLING STONE BRASIL, OUTUBRO 2008
Moreira que a Flora botou no colo, integralmente!
Mesmo ali, no próprio reduto afetivo da minha vida,
ela também ali foi. Meus filhos, meus parentes, meus
amigos, meus pais, minha mãe! Tudo! Ela assumiu
que há uma grande família Gil, e e que é dela também.
Jogou com habilidade esse jogo afetivo amplo dentro
das famílias e unificou tudo, incluindo os entornos
da família, com os amigos todos."
Preta é testemunha. "Flora sabe gerir, empreen-
der, tudo com uma precisão muito grande. As coisas
partem sempre da vontade dele.
o que ele está vislumbrando, as
idéias que
ele começa a rabiscar na
cabeça, a Flora tem a capacidade
de transformar num projeto rapi-
damente, o que é muito bom para
um artista. Eu vejo isso acontecer
há muito tempo. E sempre um dis-
co por ano, um filme por ano, acho que funciona mui-
to bem. Mas ele que rege a carreira dele, ele decide o
que quer, ao contrário do que as pessoas pensam. Tem
muito essa visão de que a Flora manda. Na verdade,
ela é uma realizadora dos desejos dele." Para Liminha,
Flora traz tranquilidade para Gil e para quem estiver
por perto. "É uma mulher inteligente, madura, muito
prática, tem muita energia, imaginação e é rápida pra
tomar decisões. Sempre tive seu apoio nos discos que
produzi. Com certeza o lado artístico de Gil cresce. E
todos na equipe adoram ficar ao lado dele, o que acaba
refletindo positivamente no trabalho."
GIL, EX-MINISTRO DA CULTURA
1. Em Brasília, no cargo que ocupou por cinco anos.
2. Recebendo um abraço do Presidente Lula durante
cerimônia de posse do novo ministro da Cultura, Juca Ferreira
dele - o que não é muito comum nesse segmento de
atividades, juntar esses dois talentos. Há muitos casos
de artistas conhecidos que não conseguem se desen
volver, manter o patrimônio, e o Gil segue uma carrei-
ra de sucesso, como gestor também."
Jorge Mautner, amigo desde os tempos de exilio
em Londres, autor de "Maracatu Atômico" e várias
composições em parceria com Gil, concorda e vai
mais longe. "Ele foi escolhido, em uma época de um
Brasil nitidamente muito racista, nos anos 60, ele foi
nomeado em uma grande empresa, entre centenas
de candidatos. Então, nesse sentido de empresário
“FLORA ASSUMIU QUE HÁ UMA
GRANDE
GIL,
FAMILIA
QUE E DELA TAMBÉM
e executivo, ele é um vencedor, um gênio. Organiza
tudo, sabe de todos os contratos, se informa de tudo,
de detalhes de produção, uma meticulosidade inacre-
ditável. E isso tudo com ações ininterruptas e ver
tiginosa velocidade. São decisões instantâneas. Ele
consulta, conversa, faz." Mautner é muito próximo
de Gil e sua família, sempre aparece na Gegé quando
o patriarca está por
r lá e frequenta
a casa de Araras,
E nem é preciso ser um expert para identificar
algumas das boas práticas corporativas da Gege.
Recorrer aos melhores e deixá-los trabalhar é uma
delas. Por exemplo, o novo cenário do show é de
Hélio Eichbauer, discípulo do tcheco Josef Svobo-
da, o mito da arquitetura cênica nos anos 70. He-
lo é tido com um dos renovadores da cenografia
brasileira e, entre dezenas de trabalhos, desenhou
o cenário e a indumentária em O Rei da Vela, de
Oduvaldo Viana Filho, em 1967. Já assinou shows
onde com sossego e inspiração a dupla tem feito can-
ções como "Os Pais" e "Todos Viram", incluídas no
CD mais recente de Gil
, Banda Larga Cordel. Rasga de Caetano Veloso, Gal Costa, Marisa Monte,
vá-
se pelo amigo e o eleva à condição de um neo-capita-
lista. "Ele tem um envolvimento, uma visão do bem
rias peças de teatro, óperas e filmes. Ora, nome e
experiência contam muito.
comum, [um impeto] de transformar a humanidade,
de mostrar a grande importância de nossa cultura
em
nivel universal e pra nós mesmos. Isso tudo é uma
coisa so, da irradiação da emoção dele, dessa empatia
imensa que se transforma em atos concretos, sejam
humanos, musicais, poemas, sejam manifestações
políticas, seja na família – o tempo todo."
Mas a corda sempre nos leva de volta pra ela: Flo-
ra. E compará-la a Paula Lavigne, que dirige os negó-
cios de Caetano, não é suficiente. “O Caetano não
tinha uma família anterior, propriamente. Tinha um
filho e uma ex-mulher. Eu, não! Eu tinha vários filhos,
várias ex-mulheres e tudo mais. Um pacote do Gil
Mas que não se tome isso como receita - pelo me-
nos não na Gegë. Porque para cuidar das ações na
internet, em vez de uma grande agência ou nome de
grife, chamaram a Gruda em Mim
que o Boi Não Te
Lambe, uma empresa nova, pequena, totalmente fo-
cada em web 2.0-a segunda geração da internet, na
qual a interatividade e a democracia na geração de
conteúdo prometem revoluções para o futuro próxi-
mo. Com uma câmera na mão, a agência vem seguin-
do os passos de Gil em shows pelo Brasil, Estados
Unidos e Europa, nos ensaios e no fim de semana em
casa. Boa parte desse material está disponível em si-
tes como YouTube, em que Gil foi distinguido com
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