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CLIPPING
CLIENTE: Gilberto Gil
VEÍCULO: Tribuna da Bahia - Salvador
SECÀO:
Cotidiano
DATA:
29/10/2007
Em Tempo
660 baiano é muitas
vezes mais eficiente
que o trabalhador das
outras regiões do
Brasil
A "preguiça baiana"
Professora de Antropologia, Elisete Zanlo-
renzi escolheu para tema de sua tese de douto-
rado na USP a folclórica assertiva de que nós,
baianos, somos preguiçosos. Segundo a
pesquisadora, a "preguiça baiana" é faceta do
racismo. Ela não teme em concluir que "o baiano
é muitas vezes mais eficiente que o trabalhador
das outras regiões do Brasil", contestando a
visão de que vivemos em clima de "eterna festa."
E aí, a pesquisadora deduz algo
que eu -
confesso que com visão preconceituosa, a
despeito de ser baianíssimo - já usei como
piada, tempos atrás, em alguns comentários
quando escrevia o "Tempo Presente", em A
Tarde: é justamente no período de festas que o
baiano mais trabalha.
Como cerca de 50%
da
mão-de-obra da população atuam no mercado
informal, as festas são uma oportunidade de
trabalho. "Quem se diverte é o turista", diz a
antropóloga.
Sabiamente, arrisco-me a opinar, a pesquisado-
ra concluiu, após quatro anos de pesquisas
históricas, que a imagem da preguiça derivou do
discurso discriminatório contra os negros e
mestiços, que são cerca de 79% da população
da Bahia.
O estudo mostra que a elevada porcentagem de
negros e mestiços não é uma coincidência. A
atribuição da preguiça aos baianos tem um teor
racista
Ainda conforme a tese, a imagem de "povo
preguiçoso" enraizou-se no próprio Estado, por
meio da elite portuguesa, que considerava os
escravos indolentes e preguiçosos, devido às
suas expressões faciais de desgosto e a
lentidão na execução do serviço" (pergunta-se: e
como seria possível trabalhar bem-humorado
em regime de escravidão?).
PÁG.: 13
Alex Ferraz
alexferraz@terra.com.br
Mais “preguiça” (1)
Seguindo a linha das
conclusões da pesquisadora,
a idéia do "baiano preguiçoso"
se espalhou de forma
acentuada Sul e Sudeste, a
partir das migrações da
década de 40. Todos os que
chegavam do Nordeste
viraram baianos. "Chamá-los
de preguiçosos foi a forma de
defesa encontrada para
denegrir a imagem dos
trabalhadores nordestinos
(muito mais paraibanos do
que propriamente baianos),
taxando-os como
desqualificados,
estabelecendo fronteiras
simbólicas entre dois mundos
como forma de proteção dos
seus empregos."
Mais “preguiça” (II)
Brilhante conclusão. Até
porque foi o "baiano preguiçoso"
um dos nordestinos que mais
trabalharam para construir as
magalópoles
brasileiras, Rio e
São Paulo, notadamente esta
última
Trabalhavam, entre os anos
1940 e 1970 (ou até um pouco
mais adiante) em regime de
semi-escravidão, já que o Norte
e Nordeste eram, na época,
guetos de miséria absoluta e
considerava-se a "redenção"
conseguir "um emprego" em
"Sumpaulo", com o sonho de
retornar cheio de grana para
buscar a família.
Mais "preguiça” (III)
Agora, vem a parte da tese
da professora Elisete que
certamente poderá gerar grande
polêmica nos chamados meios
intelectuais: ela afirma que os
próprios artistas da Bahia, como
Dorival Caymmi, Caetano Veloso
e Gilberto Gil, têm
responsabilidade na
popularização da imagem.
"Eles desenvolveram esse
discurso para marcar um
diferencial nas cidades
industrializadas e urbanas. A
preguiça, aí, aparece como uma
especiaria que a Bahia oferece
para o Brasil", diz Elisete. Até
Caetano se contradiz quando
vende uma imagem e diz: 'A
fama não corresponde à
realidade. Eu trabalho muito e
vejo pessoas trabalhando na
Bahia como em qualquer lugar
do mundo".
Mais “preguiça” (IV)
Mais uma conclusão
brilhante e polêmica: segundo a
tese, a preguiça foi "apropriada
por outro segmento: a indústria
do turismo, que incorporou
imagem para vender uma idéia
de lazer permanente. Só que
Salvador é uma das principais
capitais industriais do país, com
um ritmo tão urbano quanto o
das demais cidades."
O maior pólo petroquímico do
país está na Bahia, assim como
o maior pólo industrial do Norte
e Nordeste, crescendo de forma
tão acelerada que em cerca de
10 anos será o maior pólo
industrial na América Latina.
Mais “preguiça” (V)
As pesquisas da professora
levaram-na a concluir também
que "é no Rio de Janeiro que
existem mais dos chamados
'desocupados' (pessoas em
faixa etária superior a 21 anos
que transitam por shoppings,
praias, ambientes de lazer e
principalmente bares de bairros
durante os dias da semana
entre 9 e 18h), considerando
levantamento feito em todos os
estados brasileiros. A Bahia
aparece em 13 lugar."