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CLIENTE: Gilberto Gil
VEÍCULO: Diário do Pará - Belém
SEÇÃO: Cultura & Arte
DATA:
30/05/2010
Dlário do Pará
domingo, Belém-PA. 30/05/2010
CULTURA &
DE VOLTA
Até que nem tão complexo
Após seis anos como ministro da Cultura, Gilberto Gil, 67,
lança balões e forrós "juvenis” em seu novo CD,"Fé na Festa"
JULIO MARIA
São Paulo/ Folhapress
os 67 anos, Gilberto
Gil quer diminuir e
A
um
diminuir até se tornar
simples homem
tocando seu tambor. Não se ins-
pira mais em explicar as comple-
xidades do mundo, cantar os
s di-
lemas da existência humana,
impressionar a si e aos outros
cada disco. Seu primeiro passo
pode ser o álbum que lança ago
na
,
forrós cheios de segundas in-
tenções juninas, nove deles iné-
ditos. E novidade maior é a for-
ma
ma como trabalha agora. Gil, pela
primeira vez, é patrocinado por
uma empresa privada, a Natura,
que bancou gravação, lançamen-
to e turnê. O caminho, para ele, é
irreversível. "Por uma gravadora
isso não seria mais possível. A in-
dústria está falida."
P: Há dois anos você decla-
rou que a composição não o
fascinava mais, que não tinha
mais prazer em compor. Seu
disco vem com nove inéditas. O
que houve?
R: 0 O Seu Jorge me mostrou
uma nova afinação no violão, di-
ferente, e isso me desencadeou
uma vontade imensa, uma busca
jüvenil. Essas composições são
todas ingênuas, como de um me-
nino que pega o violão pela pri-
meira vez. Eu me sinto assim
P: "Fé na Festa" é um disco
para ouvir e dançar, sem preci-
sar pensar muito. Isso é você
"Eu tive que pas-
sar quase seis
anos ali na tensão,
na cobrança. Eu
praticamente não
dormia. Eram 24
horas de plantão."
hoje?
R: Sou eu. Estou me aproxi-
mando daquilo que declarei há
muitos anos: quero terminar
minha vida batendo um tambor.
Aos 67 anos, estou chegando
perto disso, diminuindo a preo-
cupação em explicar minha
complexidade.
P: E onde aprendeu isso?
R :
Com as porradas.
P: No Ministério da Cultu-
ra, por exemplo?
R: Ah, muito, muitíssimo. Eu
tive que passar quase seis anos ali
na tensão, na cobrança. Eu prati-
camente não dormia. Costumo
dizer que eram 24 horas de plan-
tão ali, o que é? onde é? onde está
entrave? onde está o desgaste?
onde está o perigo?, onde está
arapuca, onde està ia armadilha'.
Imagina isso o tempo todo.
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P: E isso ensina o quê?
R: Ensina que ainda que
você tome todos os cuidados
com as cascas de banana, tem de
deixar isso de lado. Isso é da
vida. É como a música "Não Te-
nho Medo da Vida" (do disco
novo)."Toda vez que eu vejo um
nó, me assalta o temor. Saberei
como desatá-lo?" Olha, isso que
eu vou dizer é verdadeiro, não é
simbólico não. Toda a vez que
eu vejo um nó, me coloco diante
dessa questão: será que eu vou
eu terei habilidade suficiente?
Então você aprende
que não
adianta, a vida vai sempre botar
um nó na sua frente. É como di-
zia Caetano: o homem velho é o
rei dos animais (risos). Outra
coisa que Caetano diz: o homem
que não morre envelhece. Cae-
tano sempre sábio né?
P: E você não tem proble-
ma em envelhecer?
R:Eu não, eu tô vivo! (risos)
P: Música fica mais ou me-
nos importante aos 68 anos?
R: Mais, porque ela deixa
de ser importante. Não tem
mais competição, concorrência,
exuberância, procura pelo ex-
traordinário reconhecimento,
'eu sou bom', 'eu sou o melhor",
essas coisas vão desaparecendo.
P: E você passou por todas
elas?
R: Todos nós artistas passa-
mos. Isso tudo vai desaparecen-
do, e você entrarem uma relação
mais frugal com a música. A mú-
sica é uma fruta que você só sabo-
reia, a música é a manga (risos)..
P: Essa história de lançar
disco bancado por empresa pa-
Gilberto Gil: sem
problemas para
envelhecer
rece ter virado uma espécie de
caminho para a sobrevivência.
R: As
gravadoras não têm
mais condições de fazer isso
(bancar o artista), estão desca-
pitalizadas, aquele modelo en-
trou em colapso. A difusão pelo
rádio também se diversificou.
As gravadoras não impõem
as agendas das rádios, o
jabá (dinheiro que emissoras
recebiam para tocar certas mú-
sicas) está na encruzilhada.
mais
P: Um dos dilemas da nova
era será o preço das músicas.
Quanto vale uma música?
R: A média mundial está
em torno de R$ 2 por faixa.
P: Mas esse preço é justo?
Quanto vale uma música de
Luiz Gonzaga para você?
R: Não tem valor, não tem
valor. Luiz Gonzaga pode valer
R$ 200, R$ 500, R$ 1 mil. Um
disco de coleção não tem preço.
É como um quadro de Picasso.
VOCÊ 9
P: E há ainda a corrente
que
defende a música de graça.
R: Eu acho que essa corren-
te precisa ser levada em consi-
deração. Para isso, as parcerias
com bancos, empresas telefoni-
cas e outras empresas é funda-
mental. Se eu tenho minha pro-
dução financiada por alguém,
eu posso dar minha música de
graça. O que me custou produ-
zir essas canções deste meu
disco já foi pago. Meu interesse
é que as canções cheguem ao
consumidor, que elas sejam ou-
vidas, não que sejam vendidas.
P: Vai ver a Copa na África?
R:Não, eu sou um pé frio.
Fui a três copas e em todas o
Brasil perdeu.
P: E quando a Copa for aqui
no Brasil? Vai viajar?
R: Não, vou ficar. Mas se o
Brasil for para a final, não sei não
se vou pisar no estádio (risos).
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