corpo iria se dissolver; "As vezes ele
me dizia que achava que seu corpo es
tava aos pedaços", conta sua mãe.
nos quais justificava o suicídio, que
podem ser sintetizados nas frases
“estou perdendo minha melhor ami-
para meus próprios demônios" e
!
"eu simplesmente não consigo falar
com as pessoas, ou melhor, consi-
go, mas não sem corromper minha
identidade e me tornar alguém que
eu odeio".
INÍCIUS NUNCA DEIXOU
Luana ir até a sua casa
nem deu explicações
plausíveis para essa con-
duta. Mas as inúmeras
revelações contidas em seu blog e
V
em fóruns da internet explicam
por Maria Gageiro encontrou a letra de
que ele jamais revelou, nem para a "Suicide Song" sobre a cama de seu
melhor amiga, da existência desses. filho. “Me apavorei
, e vi que ele não
“Eu achava que ele não me escondia estava bem", recorda a professora e
nada, fiquei muito chateada quando
soube do blog e dos fóruns."
no rllmukforum, Yohlu agradeceu
os cumprimentos recebidos por di-
suas músicas e completou:
"Hoje eu voltei para casa pensando
em suicídio, mas depois de ler todas
estas palavras gentis resolvi adiar". À
noite, ao comentar a canção "I Know
What It's Like", que anexou para ser
ouvida, contou que "é [uma música]
muito popular entre os colegas, in-
cluindo minha ex-futura-namorada",
sobre "Untitled", revelou que é um
dos tantos sons que fez para a garota
que ama; de "Suicide Song", contou
que foi escrita e gravada rapidamen-
te durante um momento depressivo"
miu os diálogos e sentamos os três pra
conversar, aqui mesmo, nesta sala",
revela Ana Maria. “A gente dizia que
agora não era só uma música, havia
conversas, mas ele argumentava que,
se aquela era para ser uma solução,
teria que ser e
pronto.
Ele foi muito
categórico naquele dia." A partir da
conversa, os pais não o deixaram só
um minuto sequer“Mas ele come-
até o violão para a escola. Até que, já
nas férias de julho, ele inventou que
faria um churrasco para alguns co-
legas do colégio que não
tinham ido viajar" - com
a desculpa de que nunca
recebia amigos em casa e
em nome da privacidade,
pediu aos pais, professo
res em férias, que os dei-
xassem a sós.
A reunião de colegas
para um
um churrasco na co-
bertura, dia 26 de julho
de 2006, oava tão salu-
tar quanto o aniversário
de 12 anos de Vinícius,
que fez do Kiss, então sua
banda predileta, o mo
tivo da festa ele e três
vizinhos passaram o dia
inteiro maquiados com
Yoñlu
lembrado". "A foto é de uma festa de
São João no Colégio Maria Goretti,
onde ele fez o ensino fundamental",
revela Luiz Marques. “Ele parece es-
tar numa prisão, e não à toa escreveu
uma música chamada 'Prison', que
não entrou no disco. A sociabilidade
que a escola
impõe, para ele, sempre
um pesadelo" -
- "A minha música
foi "Prison", e, em
prediletan sem prebe
bora eu não soubesse que Yoñilu era
depressivo, acho que dizia muito a
respeito de como ele se sentia”, me
disse Sabrepulse, tão longe e tão per-
to do amigo virtual
"Eu falei com ele naquela manhã,
por MSN", conta Luana, que estava
de férias em Erechim, com a familia,
na semana em que Vinícius tirou
própria vida. Ela escreveu: “Não fal-
ta muito para a gente
ver. Estou
com saudade". Ele respondeu: "Eu
também estou".
a
Um ano e meio, dois capucccinos
e muitas revelações depois, era eu
que estava sentado numa mesa de
café diante da garota que "tem o
dom de deslocar assim/ a lua de Ne-
tuno no ar”, como Yonlu a descre-
veu em "Mecânica Celeste Aplica-
da", sua única canção com letra em
português, faixa 20 do CD cujos
eventuais lucros serão investidos
No dia da morte, ele simulou tudo. Foi comigo comprar
comida no supermercado, me fez arrumar a mesa antes de
eu sair... Lembro dele me olhando em êxtase, em paz. Eu tinha
falado para ele que seria desesperador pensar em perdê-lo
psicanalista. "Chamei ele para con-
versar e ele disse que era só uma mú-
sica'. Eu disse: "Não é só uma música,
é uma música que fala de suicídio. Eu
vejo que tu não tá bem'. Mas ele esta-
va sempre muito decidido, as coisas
batiam e voltavam, ele estava se iso-
lando cada vez mais."
e destacou "como é bacana ouvir a
produtos de um kit adquirido pela em um site dedicado à brilhante
voz de um suicida".
internet; o aniversariante encarnou produção artística do garoto que
Em relato
posterior a uma ida ao
Paul Stanley. "No dia da morte, ele produziu muito para quem viveu
cinema com Luana, Yonlu descreveu
simulou tudo", recorda Ana Maria. tão pouco, mas ainda assim fez mui-
seu próprio comportamento como
"Foi comigo comprar comida no su-
to pouco para quem demonstrou
péssimo, contou que sentia estar se
permercado, me fez arrumar a mesa tanto talento. Yonlu é um disco que
afastando de mais uma pessoa que
antes de eu sair, dizia que tinha dú- deveria ser apenas um cartão-de-vi-
amava e pediu
que rapidamente al
vida de quantas pessoas iriam. Não visitas, mas se transformou em testa-
guém dissesse algo gentil sobre suas No mesmo período, Luana relata tristeza, depressão, pavor. Lembro mento, é a celebração de uma vida
músicas, antes que decidisse se ma- que Vinícius "começou a quebrar dele me olhando em êxtase, em paz. com vocação para banquete que fi-
Eu tinha falado para ele que seria de-
w
cou no aperitivo, é uma amostra em
fórum a música que fez para
a amiga mais falar comigo
, se isolou muitoa na sesperadamenesaes em perderlo morate sean delos dias conheciso que en realis
para o Viníciusestar vivo ou morto
dizer para quem era). Recebeu diver- parou de fazer
piadinhas”. Alertado
zou, das angústias que não superou,
sos elogios, como de costume. Dia 8, pelo analista, Mariolando em se que se bebesse apenas acrescentariamente pela música, como deixou re
,
ma droga, não bebeu nada - dizia de sua paixão pela
arte e especial-
revelou ela
que
da música,'e
gostou
seu paciente
enfatizou que não fez a canção para matar, Luiz Marques abriu a barra
de acessos do computador do filho
conquistá-la, mas para amenizar a
e descobriu que ele frequentava um
gamento, a garota teria
dele – àquela grupo virtual de suicídio - chegou a
pegar um diálogo do grupo no qual
Yonlu sugeria para uma norte-ameri-
cana com uma espingarda apontada
para a cabeça que desistisse e fosse
procurar um analista. "O Luiz impri-
era um detalhe. Ele não usou nenhu-
Corso, de
altura, ele já tinha declarado em seu
blog que lhe causara muita surpresa
o fato de ter se apaixonado por al-
guém, e estava entrando numa fase
depressiva que culminou com textos
mais um problema aos muitos que já gistrado na carta derradeira escrita
para os pais, afixada na do
porta ba-
nheiro, em parte reproduzida no en-
carte do álbum
póstumo: "Eu acre
dito
que a a cadência e a harmonia
certas no momento certo podem
despertar qualquer sentimento, in-
clusive o de felicidade nos momen-
tos mais sombrios".
tinha. Foi a convicção que deixou ele
No último post de seu blog, Yonlu
publicou uma foto em que está de
costas entreolhando para a câmera,
parecendo assustado, aparentemente
numa cela. Um clique no alt-text re-
vela a frase "É assim que eu quero ser
ROLLING STONE BRASIL, MARÇO 2008 99