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Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil
Brasil

  • Título: Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil
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    corpo iria se dissolver; "As vezes ele me dizia que achava que seu corpo es tava aos pedaços", conta sua mãe. nos quais justificava o suicídio, que podem ser sintetizados nas frases “estou perdendo minha melhor ami- para meus próprios demônios" e ! "eu simplesmente não consigo falar com as pessoas, ou melhor, consi- go, mas não sem corromper minha identidade e me tornar alguém que eu odeio". INÍCIUS NUNCA DEIXOU Luana ir até a sua casa nem deu explicações plausíveis para essa con- duta. Mas as inúmeras revelações contidas em seu blog e V em fóruns da internet explicam por Maria Gageiro encontrou a letra de que ele jamais revelou, nem para a "Suicide Song" sobre a cama de seu melhor amiga, da existência desses. filho. “Me apavorei , e vi que ele não “Eu achava que ele não me escondia estava bem", recorda a professora e nada, fiquei muito chateada quando soube do blog e dos fóruns." no rllmukforum, Yohlu agradeceu os cumprimentos recebidos por di- suas músicas e completou: "Hoje eu voltei para casa pensando em suicídio, mas depois de ler todas estas palavras gentis resolvi adiar". À noite, ao comentar a canção "I Know What It's Like", que anexou para ser ouvida, contou que "é [uma música] muito popular entre os colegas, in- cluindo minha ex-futura-namorada", sobre "Untitled", revelou que é um dos tantos sons que fez para a garota que ama; de "Suicide Song", contou que foi escrita e gravada rapidamen- te durante um momento depressivo" miu os diálogos e sentamos os três pra conversar, aqui mesmo, nesta sala", revela Ana Maria. “A gente dizia que agora não era só uma música, havia conversas, mas ele argumentava que, se aquela era para ser uma solução, teria que ser e pronto. Ele foi muito categórico naquele dia." A partir da conversa, os pais não o deixaram só um minuto sequer“Mas ele come- até o violão para a escola. Até que, já nas férias de julho, ele inventou que faria um churrasco para alguns co- legas do colégio que não tinham ido viajar" - com a desculpa de que nunca recebia amigos em casa e em nome da privacidade, pediu aos pais, professo res em férias, que os dei- xassem a sós. A reunião de colegas para um um churrasco na co- bertura, dia 26 de julho de 2006, oava tão salu- tar quanto o aniversário de 12 anos de Vinícius, que fez do Kiss, então sua banda predileta, o mo tivo da festa ele e três vizinhos passaram o dia inteiro maquiados com Yoñlu lembrado". "A foto é de uma festa de São João no Colégio Maria Goretti, onde ele fez o ensino fundamental", revela Luiz Marques. “Ele parece es- tar numa prisão, e não à toa escreveu uma música chamada 'Prison', que não entrou no disco. A sociabilidade que a escola impõe, para ele, sempre um pesadelo" - - "A minha música foi "Prison", e, em prediletan sem prebe bora eu não soubesse que Yoñilu era depressivo, acho que dizia muito a respeito de como ele se sentia”, me disse Sabrepulse, tão longe e tão per- to do amigo virtual "Eu falei com ele naquela manhã, por MSN", conta Luana, que estava de férias em Erechim, com a familia, na semana em que Vinícius tirou própria vida. Ela escreveu: “Não fal- ta muito para a gente ver. Estou com saudade". Ele respondeu: "Eu também estou". a Um ano e meio, dois capucccinos e muitas revelações depois, era eu que estava sentado numa mesa de café diante da garota que "tem o dom de deslocar assim/ a lua de Ne- tuno no ar”, como Yonlu a descre- veu em "Mecânica Celeste Aplica- da", sua única canção com letra em português, faixa 20 do CD cujos eventuais lucros serão investidos No dia da morte, ele simulou tudo. Foi comigo comprar comida no supermercado, me fez arrumar a mesa antes de eu sair... Lembro dele me olhando em êxtase, em paz. Eu tinha falado para ele que seria desesperador pensar em perdê-lo psicanalista. "Chamei ele para con- versar e ele disse que era só uma mú- sica'. Eu disse: "Não é só uma música, é uma música que fala de suicídio. Eu vejo que tu não tá bem'. Mas ele esta- va sempre muito decidido, as coisas batiam e voltavam, ele estava se iso- lando cada vez mais." e destacou "como é bacana ouvir a produtos de um kit adquirido pela em um site dedicado à brilhante voz de um suicida". internet; o aniversariante encarnou produção artística do garoto que Em relato posterior a uma ida ao Paul Stanley. "No dia da morte, ele produziu muito para quem viveu cinema com Luana, Yonlu descreveu simulou tudo", recorda Ana Maria. tão pouco, mas ainda assim fez mui- seu próprio comportamento como "Foi comigo comprar comida no su- to pouco para quem demonstrou péssimo, contou que sentia estar se permercado, me fez arrumar a mesa tanto talento. Yonlu é um disco que afastando de mais uma pessoa que antes de eu sair, dizia que tinha dú- deveria ser apenas um cartão-de-vi- amava e pediu que rapidamente al vida de quantas pessoas iriam. Não visitas, mas se transformou em testa- guém dissesse algo gentil sobre suas No mesmo período, Luana relata tristeza, depressão, pavor. Lembro mento, é a celebração de uma vida músicas, antes que decidisse se ma- que Vinícius "começou a quebrar dele me olhando em êxtase, em paz. com vocação para banquete que fi- Eu tinha falado para ele que seria de- w cou no aperitivo, é uma amostra em fórum a música que fez para a amiga mais falar comigo , se isolou muitoa na sesperadamenesaes em perderlo morate sean delos dias conheciso que en realis para o Viníciusestar vivo ou morto dizer para quem era). Recebeu diver- parou de fazer piadinhas”. Alertado zou, das angústias que não superou, sos elogios, como de costume. Dia 8, pelo analista, Mariolando em se que se bebesse apenas acrescentariamente pela música, como deixou re , ma droga, não bebeu nada - dizia de sua paixão pela arte e especial- revelou ela que da música,'e gostou seu paciente enfatizou que não fez a canção para matar, Luiz Marques abriu a barra de acessos do computador do filho conquistá-la, mas para amenizar a e descobriu que ele frequentava um gamento, a garota teria dele – àquela grupo virtual de suicídio - chegou a pegar um diálogo do grupo no qual Yonlu sugeria para uma norte-ameri- cana com uma espingarda apontada para a cabeça que desistisse e fosse procurar um analista. "O Luiz impri- era um detalhe. Ele não usou nenhu- Corso, de altura, ele já tinha declarado em seu blog que lhe causara muita surpresa o fato de ter se apaixonado por al- guém, e estava entrando numa fase depressiva que culminou com textos mais um problema aos muitos que já gistrado na carta derradeira escrita para os pais, afixada na do porta ba- nheiro, em parte reproduzida no en- carte do álbum póstumo: "Eu acre dito que a a cadência e a harmonia certas no momento certo podem despertar qualquer sentimento, in- clusive o de felicidade nos momen- tos mais sombrios". tinha. Foi a convicção que deixou ele No último post de seu blog, Yonlu publicou uma foto em que está de costas entreolhando para a câmera, parecendo assustado, aparentemente numa cela. Um clique no alt-text re- vela a frase "É assim que eu quero ser ROLLING STONE BRASIL, MARÇO 2008 99
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