ENTREVISTA meio&mensagem 30 DE MARÇO DE 2009
Danilo Santos de Miranda
À francesa
Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc São Pau-
lo há 25 anos, é presidente do Comissariado responsável
pelo Ano da França no Brasil. O evento será realizado pelo
governo federal e acontecerá em 80 cidades de todo o País, entre 21 de abril
e 15 de novembro. O financiamento das atividades provém de ambos os gover-
nos nacionais e de um Comitê de Patrocínio – formado por 16 corporações
francesas e pela Caixa Seguros, além de algumas companhias que têm interesses nas duas nações. Contudo,
apenas 200 projetos dos 650 aprovados devem ser concretizados, por causa do pequeno investimento de
empresas brasileiras na comemoração.
RENATO PEZZOTTI
FOTOS DE PAULO MÚMIA
Meio & Mensagem - Como funcionou o Comissariado?
Danilo Santos de Miranda - Enfrentamos muitas di-
ficuldades por falta de recursos. No início, tivemos
alguns problemas por falta de sinergia entre todos os
membros, mas agora estamos muito mais integrados,
articulados. O Comissariado foi formado por sete
pessoas: eu, como presidente; o embaixador Roberto
Soares de Oliveira, que é comissário geral brasileiro;
Marcelo Dantas, diretor de Relações Internacionais do
Ministério da Cultura; Áurea Leszczynski Gonçalves.
assessora da presidência do Comissariado; José Mario
Ferreira Filho, chefe da divisão de Divulgação Cultural
do Ministério das Relações Exteriores: Eliana Zugaib,
diretora do Departamento Cultural do Ministério das
Relações Exteriores; e Rodrigo Galletti, gerente de
Intercâmbio e Projetos Especiais do Ministério da
Cultura
M&M-Como foi o processo de escolha dos projetos?
Miranda – Nós tivemos urna resposta absolutamente
surpreendente. Embora seja um assunto bastante
atraente para muita gente, nós não imaginavamos
que a resposta fosse tão intensa por parte da comu-
nidade em geral cultural, científica, acadêmica e
econômica. Para você ter uma ideia, mais de 2 mil
projetos foram apresentados, na França e por aqui.
E em absolutamente todos os gêneros,
M&M - A maioria dos projetos veio da França?
Miranda -Não, a maioria é do Brasil. Da França vieram
ótimas propostas, sobretudo ligadas a cultura e diá-
logos. Isso porque muitas instituições francesas têm
algum tipo de conexão com empresas brasileiras --e,
com a definição da realização do evento, muitas dessas
conexões foram sendo azeitadas a fim de permitir o
crescimento de ideias. A instituição francesa que cuida
de pesquisa acadêmica tem contato com a Capes, aqui,
por exemplo. Antes mesmo de nós organizarmos uma
ação por aqui, eles já estavam se entendendo.
M&M - Em 2005, ocorreu o Ano do Brasil na França. Isso
exerceu influência?
Miranda - Aliás, é bom que se diga uma coisa bastante
interessante: o Ano do Brasil na França foi um evento
absolutamente extraordinário para os padrões daquele
país, que costuma fazer esse tipo de atividade. Eles
já desenvolveram iniciativas desse gênero com vários
países, mas o do Brasil, em 2005, foi o mais extraor-
dinário, segundo testemunho dos próprios franceses.
Isso do ponto de vista de repercussão, quantidade,
abrangência, importância e publicidade no país inteiro.
E o sucesso despertou nos franceses o desejo de fazer a
reciproca na sequência. É coisa rara, isso não acontece.
M&M - O senhor acredita nesse sucesso porque, por
incrível que pareca, o Brasil não leva sua cultura para
fora do Pais?
Miranda - E. A cultura brasileira conhecida é o fu-
tebol, Caetano Veloso, Gilberto Gil, café, samba...
Mas eles não conhecem como tudo nasceu, as ori-
gens disso, a nossa tradição barroca, colonial, de
arte engajada em diferentes momentos históricos,
semelhante ao que se fazia em diversos lugares do
mundo e até na Europa. Mesmo com a música: você
escuta uma do Padre José Maurício e acha que está
ouvindo Mozart. Isso traz uma ideia de um Brasil que
nós nem sempre divulgamos; só falamos do que há de
mais estereotipado, que é mais fácil, e que leva a uma
conclusão nem sempre adequada para nossa imagem.
Brasil: samba, futebol, mulata e sexo fácil. E isso tem
consequências graves.
M&M-E em 2005 a essência da cultura tupiniquim foi
parar na Europa, mostrando que o Pais não é só isso.
Apagamos essa imagem, de alguma forma?
Miranda - Nós não fizemos o Ano do Brasil na França
com a intenção de apagar tudo isso. Levamos o que
o País é mesmo, uma nação que tem de tudo - a
questão do acolhimento, por exemplo, traço caracte-
ristico da população brasileira, que é real. Assimilamos
influências culturais e étnicas do mundo inteiro, o
tempo todo. Do ponto de vista
econômico, os produ-
tos brasileiros ganharam uma projeção muito forte na
França e em toda a Europa. Vemos em algumas partes
do continente pessoas vestidas de verde e amarelo,
coisa que nem nós fazemos aqui.
M&M-De onde partiu a rápida idéia de realização dessa
reciproca?
Miranda -Logo em 2006, o presidente francês, Jac-
ques Chirac, assinou um documento com o presidente
Lula para acelerar esse processo, que foi renovado por
Nicolas Sarkozy. E em 22 de dezembro do ano passado
foi feito o lançamento do Ano da França no Brasil,
com a visita de Sarkozy ao Pais. Esse traço diplomá-
tico político e institucional é importante, porém mais
importante é a troca cultural da relação entre povos.
Receberemos a França atual e não a clássica, que já
conhecemos de alguma forma
M&M - Como não poderia deixar de ser, falando de este
reótipos: o Ano da França no Brasil começou no carnaval,
com o patrocinio de cidades francesas ao desfile da
Grande Rio
Miranda - Os franceses adoram carnaval e adoraram
ainda mais com a Grande Rio no sambódromo cario-
ca. Até um grupo do Moulin Rouge veio ao Pais na
ocasião, mesmo porque é uma data fixa e não poderia
ficar de fora. Mas o que queremos por aqui é a França
negra, muçulmana árabe, misturada com a França
tradicional, conhecida. Na periferia de Paris também
encontramos aspectos semelhantes aos nossos, de
integração, infra-estrutura e preconceito. De nossa
parte, pretendemos que a França seja mostrada no
Brasil inteiro, e não só nas grandes capitais.
M&M - Quantos foram os projetos inscritos? Quantos
deles foram chancelados?