Nossa Senhora, vestida de vermelho e de verde escuro, senta-se numa grande rocha como num trono apoiando-se em uma vultosa árvore. Segura o menino Jesus nu no colo e lhe oferece, com a mão direita, um pequeno cacho de uvas, símbolo do sacrifício da cruz. Atrás dela, abre-se ampla paisagem com castelos, casebres, vilarejos e campos cultivados, em que aparecem pequenos animais, entre os quais se nota um macaco. O tema do papel redentor de Jesus e do seu destino é apresentado numa atmosfera de idílio campestre que confere humilde ternura à cena familiar, destacando a carinhosa relação entre a jovem mãe, trajada singelamente, de longos cabelos loiros soltos nos ombros, e a criança, cujo corpo grácil e nu evidencia sua condição indefesa e precária. Por outro lado, a pose do menino sentado, que parece abençoar ao receber o singelo presente da mãe, lembra a majestade da criança divina que passa desapercebida aos olhos do mundo. Obras semelhantes na composição e no formato, atribuídas a Adriaen Isenbrant, encontram-se na Alte Pinakothek de Munique e no Fine Arts Museum de San Francisco, ambas representando a cena evangélica do repouso durante a fuga para o Egito. No quadro da Casa Museu Eva Klabin, entretanto, a composição parece ter servido para traduzir um significado simbólico e não narrativo, faltando os episódios acessórios extraídos dos evangelhos apócrifos como a queda dos ídolos, o milagre das palmeiras e o dos campos de trigo. A comparação com as pinturas mencionadas evidencia uma maior dureza no desenho das figuras, na representação da paisagem e da vegetação, assim como no tratamento da cor desprovida das sutis nuanças que se encontram em outras obras de Isenbrant. É possível, portanto, que a obra da Casa Museu Eva Klabin seja um produto do ateliê, de toda forma realizado em parte com a intervenção de colaboradores, utilizando idéias e desenhos derivados das composições do mestre. As partes figurativas são inspiradas na grande tradição artística da cidade de Bruges, em que Isenbrant foi ativo desde cerca de 1510 até a morte. As fisionomias, em particular, possuem influências da arte de Hans Memling e de Gerard Dou, enquanto a paisagem poderia ser aproximada às obras de Joaquim Patinir, como o Repouso da Fuga para o Egito do Minnesota Art Institute de Minneapolis, datado de cerca de 1515, ou o retábulo com o mesmo tema do Museo del Prado, em Madrid, pela nova importância expressiva dada à representação da natureza, que caracteriza dentro da história da arte européia a originalidade dos mestres desta época da pintura flamenga.
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