Simplício João Rodrigues de Sá (atribuído a) Rio de Janeiro, Brasil, c.1811-1812 Têmpera sobre marfim 6,1 cm (diâmetro)
Mostrar menosLer mais
Detalhes
Título: D. Pedro, Príncipe da Beira
Descrição detalhada: A miniatura representa, ao que tudo indica, o Príncipe D. Pedro de Alcântara. Pela observação constata-se que o jovem retratado, vestido em farda de gala, ostenta uma série de insígnias que só um príncipe português poderia usar: o colar do Tosão de ouro ao pescoço, no peito a placa da Grã-cruz das três ordens militares portuguesas, a Grã-cruz da ordem de Torre e Espada, o hábito da ordem Soberana de Malta e a Grã-cruz da ordem de Carlos III. As ordens militares portuguesas haviam sido reformadas no tempo de D. Maria I, criando-se pela primeira vez o grau de grã-cruz das três ordens onde se colocavam em paridade as ordens de Cristo, Avis e Santiago, simbolicamente reunidas sob a égide do Sagrado Coração de Jesus (como se vê na medalha que o príncipe ostenta nesta miniatura) numa só insígnia, distintivo que apenas a soberana e os seus herdeiros poderiam usar. Na mesma altura D. Maria consegue a prorrogativa papal de tornar independente a ala portuguesa do grão-mestrado de Malta ficando esta, a partir de 1793, completamente isenta da interferência temporal e espiritual de Malta. O Grão-Priorado do Crato, a mais alta dignidade da Ordem Soberana, Militar e Hospitalária de São João de Jerusalém, de Rodes e de Malta em Portugal, era exercido exclusivamente pelos infantes, e foi assim que o infante D. Pedro de Alcântara pôde ser representado com esta insígnia. A Grã-cruz que se vê debaixo da faixa que corre no peito do jovem retratado é da ordem de Carlos III criada por este soberano em 1771, por altura do nascimento do seu primogénito Carlos Clemente. A mais alta distinção honorífica entre as ordens civis espanholas, a Grã-cruz e colar de Carlos III, a segunda em termos de precedências logo a seguir ao Tosão de Ouro, estava preferencialmente destinada aos membros da família real espanhola. O Príncipe D. Pedro de Alcântara recebeu este distintivo no dia oito de novembro de 1801, naturalmente, por ser neto, por parte da mãe, dos reis de Espanha. A outra insígnia ostentada pelo retratado é a Grã-cruz da Torre e Espada, criada no Brasil por D. João, por decreto de 13 de maio de 1808, para compensar aqueles que, não sendo católicos, tinham prestado e prestavam serviços à coroa. Naturalmente, a Grã-cruz ficava reservada para a família real.
Quer pela moda da figuração, em particular os cabelos em desalinho penteados em direção à testa, quer o tipo de técnica aplicada nesta pequena pintura, tudo indica que a miniatura terá sido feita no início do século XIX. À exceção do rei, a única figura que nessa época em Portugal poderia reunir todas estas condecorações, era o príncipe D. Pedro. A corroborar esta identificação estão os retratos divulgados em gravura de Jean-Francois Badoureau sobre desenho de Jules Vauthier, de que se conhecem duas versões, uma colorida, de 1808, e outra com os traços do rosto mais vincados, de 1821, em que o príncipe é representado com as mesmas condecorações e idênticos traços fisionómicos. Outro dos retratos de D. Pedro e ainda mais semelhante ao desta miniatura, foi feito em 1812 por Simplício João Rodrigues de Sá que, em 1815, deu origem a outra gravura que, de tão próxima a este retratinho, se poderia afirmar tratar-se de obra do mesmo artista. A gravura não parece copiar exatamente esta miniatura, mas qualquer outro retrato perdido de Simplício, pois faltam-lhe alguns elementos aqui presentes, nomeadamente as dragonas, e a figura é representada noutra perspetiva, com o príncipe sentado numa cadeira. Em todo o caso, a miniatura terá sido pintada pelos anos de 1811 e 1812, visto o artista situar a figura do príncipe sobre cenário aberto numa janela onde se identifica uma paisagem, não do Brasil, mas de um “Portugal" idealizado, saudosista de uma grandeza que o reino já não tinha.
SOBRE SIMPLÍCIO
Simplício nasceu em Cabo Verde em 1785 e foi batizado Simplício João Rodrigues de Brito. Em 1794 foi enviado para Lisboa. Não sabemos o ano em que chegou ao Brasil, apenas que em 1812, é referido no Rio de Janeiro como Simplício João Rodrigues de Sá, pintor retratista, anunciando uma mudança de endereço na Gazeta do Rio de Janeiro. Nesse ano pintou o referido retrato de D. Pedro, hoje perdido, gravado em 1815 [1]. Não se conhecem outras obras de sua autoria dessa época, e toda a gravura interpõe uma nova “mão” entre o trabalho original e o desenho transposto. Contudo, a idade do modelo, o rosto alongado, o tratamento dos cabelos e o pescoço “curto” remetem para uma outra miniatura anónima do príncipe, talvez um ano mais novo, da qual, tal como esta, poderá ter sido autor.
Em janeiro ou fevereiro de 1815, o pintor partiu do Brasil para a Argentina, mas volta a estar documentado no Rio de Janeiro em novembro de 1820, onde se torna aluno de Debret. Seria mais tarde professor da Academia Imperial e mestre de desenho de D. Pedro II, antes de morrer, cego, no Rio de Janeiro, em 1839.
[1] (...) se vende o retrato [de] D. Pedro (...), pintado por Simplício João Rodrigues de Sá em 1812, e gravado nesta Corte no prezente anno. (Gazeta do Rio de Janeiro – 2/8/1815).
Criador: Simplício Rodrigues de Sá (Cabo Verde, 1785-Rio de Janeiro, 1839)