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Township wall (XI)

António Ole2004

Culturgest - Fundação Caixa Geral de Depósitos

Culturgest - Fundação Caixa Geral de Depósitos
Lisboa, Portugal

GEOMETRIA EMOCIONAL
É um lugar estranho aquele que é delimitado por esta parede de fragmentos de casas.
Na colagem das suas múltiplas superfícies está todo o léxico da rua: chapa zincada, bocados de parede, janelas e fragmentos de portas, tabiques de madeira, restos de camadas de tinta, sobreposições de tintas. São fragmentos retirados a casas e a lugares, a restos do que foi um lugar de habitação, mas cruzados com a história do grande mistério da pintura ocidental que reside na abstracção criada por Mondrian, Kandinsky e Malevich cerca de 1910. Nos planos monocromáticos que se inscrevem pelo meio da vernacularidade da pele da parede real está contida uma exacta perspectiva sobre a dicotomia entre real e abstracto que configura a arte do século XX, mas também uma noção, mais epidérmica e humanista, de que o plano de cor que instaura a pintura tanto pode ser encontrado como produzido, porque é no momento do encontro estético com a obra e o seu lugar que se produz o reconhecimento que configura o processo artístico.
A poética de António Ole exerce-se, no entanto, a partir de um outro dispositivo: a colagem, processo introduzido por Picasso e Braque em 1912 e que consiste na introdução de elementos do mundo físico (um papel de parede, um tampo de cadeira) na superfície da tela, desnudando perante o espectador o processo de ficção das imagens produzidas pela pintura. Se a história das imagens da pintura assentava numa reacção de crença na imagem composta dentro do seu suporte rectangular, pedindo ao espectador que acreditasse no trompe-l’oeil da perspectiva, a inclusão de elementos “reais” desmonta esse mecanismo perante os nossos olhos, construindo uma distância em relação aos processos de crença na imagem. Aquilo que António Ole produz nos seus enormes muros é o desenvolvimento deste processo: no meio dos despojos reais que configuram o palimpsesto da obra encontram-se pinturas – o que coloca em causa a dimensão realista que à primeira vista a veracidade dos suportes podia fazer supor, para nos propor uma outra instância, mais universal e simbólica.
E o que simboliza ela, então?
Simboliza a complexidade da realidade, a multiplicidade de lugares e superfícies, de paredes e cores que definem o espaço da habitação, a construção da cidade e o curso da História. Simboliza a fina fronteira entre subjectividade e realidade, o campo de esborratamento entre arte e vida que é o material da sua poética.
Perante o grande muro que nos devolve a cidade que reconhecemos mesmo sem a termos visto, espreita o rigor da pintura, a utopia de Malevich quando, em 1921, decidiu pintar a cidade de Vitebsk de cores em formas geométricas.
A cidade é, agora, a moldura desta geometria feita emocional.

Delfim Sardo

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  • Título: Township wall (XI)
  • Criador: António Ole
  • Data de Criação: 2004
  • Localização: Lisboa
  • Dimensões físicas: 418 x 1280 cm
  • Tipo: Instalação
  • Direitos: © Culturgest - Fundação Caixa Geral de Depósitos
  • Material: Madeira, chapa de ferro, zinco, portas, janelas, vidro e fibras sintéticas
  • Inventário: 590296
  • Fotógrafo: © DMF, Lisboa
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