“Analisando o conjunto da produção de Iberê Camargo, o crítico Paulo Herkenhoff faz a seguinte consideração: ‘Iberê pinta como pintor, desenha como desenhista e grava como gravador. (...) Cada técnica é trabalhada com justeza no seu campo de tensão próprio. (...) Sempre abraçou outros múltiplos suportes que lhe são oferecidos: biombo, louça, cerâmica, tapeçaria, saia, camiseta, macacão, faixas, outdoor. Enfim, pode pintar tudo: como se o mundo pudesse (ou devesse) ser uma grande pintura…’.
A cerâmica foi um desses suportes sobre o qual Iberê produziu muitas pinturas, num curto espaço de tempo. A Fundação tem registros fotográficos de 60 peças [...]. Realizados, majoritariamente, sobre porcelana industrial, os trabalhos, datados de 1960, 1961, 1964 e 1965, revelam que o artista soube explorar muito bem o campo de tensão próprio dessa técnica, experimentando possibilidades temáticas e estilísticas que iria desenvolver na pintura.
O primeiro grupo de trabalhos produzidos por Iberê reúne as peças datadas de 1960 e 1961, que foram realizadas com o acompanhamento da ceramista Luiza Prado. As tintas usadas no processo de pintura em porcelana são à base de minerais, suas cores e texturas são modificadas quando submetidas ao forno, e a temperatura e o tempo de queima têm que ser exatos. Assim, os conhecimentos técnicos são indispensáveis para produzir esse trabalho.
A realização das cerâmicas de Iberê ocorre no período em que o artista está em Porto Alegre, ministrando o curso Encontros com Iberê Camargo (10 a 30 de dezembro de 1960), que se tornaria a semente do Atelier Livre da Prefeitura. [...]
Em janeiro de 1961, essa produção foi apresentada em Torres, RS, com o patrocínio da Associação Riograndense de Artes Plásticas Francisco Lisboa. A sede da Sociedade Amigos de Torres foi o local da mostra, que reunia 40 peças. [...]
Numa de suas frases favoritas, Iberê dizia: ‘Não nasci para enfeitar o mundo’, e suas pinturas em porcelana certamente passam bem longe de propostas decorativas. Nessa produção de 1960-61, alguns trabalhos são grafismos, com o uso de poucas cores, entre cinzas, marrons, vermelhos e amplo predomínio do preto. [...] Em algumas peças, o artista imprime ritmo e dinamismo com o uso do scratch, o risco seco, a retirada da tinta com o cabo do pincel, técnica que, até então, usara pouco, mas que viria a tornar-se uma marca de sua pintura. [...]
Ainda no início da década de 1960, Luiza Prado deixa Porto Alegre e Iberê retoma a produção de cerâmicas com Marianita Linck.”
MATTAR, Denise. In: POSSAMAI, Gustavo (Org.). Iberê Camargo: o fio de Ariadne. Fundação Iberê Camargo: Porto Alegre, 2020. p. 13-14. (Observar notas na fonte).
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