Do Museu do Amanhã
Museu do Amanhã
A humanidade deu um salto gigante ao pisar na Lua. Mas não foi o único. Há milhares de anos nós desbravamos, ocupamos, exploramos e transformamos o planeta. Nas últimas décadas, causamos mais mudanças do que em toda a nossa existência. Ultrapassamos os limites da Terra não só pela exploração espacial, mas porque extraímos os recursos da natureza mais rápido do que ela pode repor. Estamos no Antropoceno, a época dos humanos. Como chegamos até aqui?
Museu do Amanhã | Um planeta em transformação (2016-01-01), de Google Earth EngineMuseu do Amanhã
UM SEGUNDO NA HISTÓRIA DO PLANETA
A Terra tem 4,6 bilhões de anos. Nós, humanos, 200 mil. O que significa que se a história do planeta fosse resumida em um dia, só surgiríamos no último segundo. Isso não nos impediu de construir cidades, desmatar florestas, escavar solos, poluir os oceanos e o ar, nem de levar outras espécies à extinção, enquanto nos tornamos mais de 7 bilhões de pessoas. Em face às mudanças no clima, atmosfera, rios e na biodiversidade, cientistas apontam que o planeta já não é o mesmo que os nossos ancestrais encontraram, nem o da época geológica em que vivemos nos últimos 12 mil anos, o Holoceno, no qual o clima terrestre foi propício para o nosso desenvolvimento. Agora, eles pesquisam em qual momento da nossa história entramos nesta nova época profundamente marcada por nós, o Antropoceno.
LONGA JORNADA DA HUMANIDADE
A humanidade percorreu uma jornada de 60 mil anos da África aos outros continentes. Atravessou desertos, mares, florestas, geleiras, cordilheiras, enfrentando uma era do gelo. Ao longo do caminho, criou línguas, ferramentas, tradições, modos de viver e de entender o mundo. Também aprendeu a cultivar e a domesticar os animais, dando sinais de que começava a entender os ciclos da natureza e o comportamento das outras espécies. Alcançamos todos os continentes há 10 mil anos, e a humanidade havia se diversificado. Agora era etíope, egípcia, assíria, suméria, hindu, hia, grega, romana, aborígene, melanésia, inuíte, cheroqui, cheyenne, maia, asteca, inca, tupi, pataxó, nambikuara, guarani e uma infinidade de outros povos.
Uma mulher da República Democrática do Congo (UN Photo Marie Frechon CC BY-NC-ND 2.0) (2007-03-11), de (UN Photo Marie Frechon CC BY-NC-ND 2.0)Museu do Amanhã
Mãe e o seu bebê no Vietnã. (UN Photo Kibae Park CC BY-NC-ND 2.0) (2011-06-23), de (UN Photo Viviane Holbrooke CC BY-NC-ND 2.0)Museu do Amanhã
Indígena em Copán Ruinas, Honduras. (UN Photo Evan Schneider CC BY-NC-ND 2.0) (2015-01-15), de (UN Photo Evan Schneider CC BY-NC-ND 2.0)Museu do Amanhã
Indígena da tribo Apiwtxa, Acre, Brasil. (MinC Pedro França CC BY 2.0) (2010-09-02), de (MinC Pedro França CC BY 2.0)Museu do Amanhã
PRIMEIRAS MARCAS DA NOSSA PRESENÇA
Junto com a agricultura surgiu a possibilidade de estocar alimentos. Com isso, alguns povos deixaram a estrutura simples de caça e coleta, que nos levava a vagar sem cessar, para uma outra de cultivo, que deu base aos primeiros povoados. Berços das cidades, esses locais começaram a ser construídos há cerca de 4 mil anos às margens de grandes rios, como o Nilo, no Egito, o Tigres e o Eufrates, na Mesopotâmia, o Huang Ho, na China, o Ganges e o Indo, na Índia, o Eurotas, na Grécia, o Pó, na Itália, o Rio Grande de Santiago e o Balsas, no México. Assim como os hieróglifos e os antigos monumentos, essas foram as primeiras marcas que deixamos no planeta. O potencial da agricultura ainda aumentaria com canais de irrigação, arados e a rotação do solo, mas o próprio ciclo da natureza assegurava a regeneração do que era extraído por esses povos.
DOMÍNIO DA MEMÓRIA, DO TEMPO E DAS MEDIDAS
Há cinco mil anos, o desenvolvimento da escrita nos permitiu controlar a memória, a começar pela escrita cuneiforme que usava desenhos. Duzentos anos depois, a observação da Lua nos levou a criar os primeiros calendários e, com isso, controlamos o tempo. Já os primeiros textos matemáticos surgiram há quatro mil anos na Babilônia e no Egito, o que nos permitiu controlar as medidas do mundo. Continuaríamos desenvolvendo formas de compreender o planeta, a natureza, as outras espécies e a nós mesmos. A informação também começou a cruzar o planeta a partir de 1440, com a invenção da prensa, que permitiu a impressão em série, muito mais rápida do que qualquer técnica anterior. Ainda foram criadas as lentes, em 1608, os microscópios, em 1665, além das teorias sobre a evolução humana, o sistema solar, cosmos, a genética e muito mais.
TERRA INCÓGNITA
Espalhados pelo planeta, alguns povos se tornaram grandes impérios, outros continuaram isolados. Europeus, africanos e asiáticos se conheciam de longa data, mas por séculos não tiveram contato com as terras que viriam a chamar de América e Oceania. A cartografia do planeta ficou inacabada até as grandes navegações do século XVI ao XVIII, quando os europeus conheceram os territórios e os povos do novo mundo. Estas expedições permitiram o ‘descobrimento do planeta’ como o conhecemos hoje: seis continentes, cinco oceanos, centenas de arquipélagos e milhares de espécies. Mas este foi um período marcado tanto pelo fascínio das descobertas quanto pela escravização e dizimação de povos inteiros. Também foi este o momento em que uma rede de rotas comerciais cruzou continentes e oceanos, envolvendo todo o planeta.
O PLANETA ENTRA NA ESTEIRA DA INDÚSTRIA
A paisagem do planeta começou a mudar radicalmente com a Revolução Industrial, no século XVIII. Fábricas, máquinas, invenções e novas ocupações retiraram as pessoas de casa e do campo, onde eram artesãos e agricultores, para trabalharem nas indústrias dos centros urbanos que surgiam na Europa e nos Estados Unidos. A invenção das máquinas a vapor deu início ao consumo de combustíveis fósseis, que serviam como fonte de energia para as indústrias, substituindo a tração animal, a força dos ventos e o calor das madeiras. A partir daí, carvão, petróleo e gás natural passaram a movimentar mais e mais o progresso tecnológico. No século XIX, o mundo inteiro já estava ligado a um mesmo modelo de desenvolvimento econômico que transformou a natureza em uma fonte de recursos, e não mais em um habitat.
Museu do Amanhã | Vista área de Alberta Tar Sands (2012-01-01), de GreenpeaceMuseu do Amanhã
SELVAS DE PEDRA
As marcas da humanidade sobre o planeta ficaram maiores, mais evidentes, a partir do século XIX. A começar pela população e as grandes cidades. Na Inglaterra, berço da Revolução Industrial, Londres atingiu 1 milhão de habitantes em 1800, sendo a primeira cidade moderna a ter este número de moradores. Em 1900, já eram 12 cidades com essa população, sendo que 15% da população mundial, que girava em torno de 1,65 bilhões, vivia em áreas urbanas. Esses números não pararam de aumentar. Em 1927, éramos de 2 bilhões de pessoas no planeta; em 1950 mais de 2,5 bilhões, e, em 1960, 3 bilhões. Na virada do milênio, a população mundial já se aproximava de 6 bilhões e quase a metade dela vivia em cidades. Mais de 400 cidades tinham mais de 1 milhão de habitantes e 19 tinham mais de 10 milhões. Todo este crescimento em apenas um século fica ainda maior ao ser considerado que a humanidade demorou desde sua origem, há 200 mil anos, até 1800, para atingir um bilhão. Hoje, mais da metade da população mundial vive em cidades. Quarenta e quatro cidades têm entre 5 e 10 milhões de habitantes, 29 têm mais de 10 milhões.
Trânsito em Delhi, India. (Azri Azahar CC BY 2.0) (2015-11-06), de (Azri Azahar CC BY 2.0)Museu do Amanhã
Cidade de Nova Iorque (Kaysha CC BY-NC-ND 2.0) (2007-11-06), de (Kaysha CC BY-NC-ND 2.0)Museu do Amanhã
Tóquio, Japão. (Moyan Brenn CC BY 2.0) (2014-11-25), de (Moyan Brenn CC BY 2.0)Museu do Amanhã
Piccadilly Circus, Londres, à noite (Kintarojoe CC BY-NC 2.0) (2012-02-21), de (Kintarojoe CC BY-NC 2.0) e Piccadilly Circus, Londres, à noite (Kintarojoe CC BY-NC 2.0)Museu do Amanhã
SOBRECARGA DA TERRA
O crescimento acelerado da população mundial no século XX foi acompanhado pelo aumento do consumo de combustíveis fósseis, alimentos, água, produtos e minérios. Se antes a natureza era capaz de repor o que extraíamos, isso já não acontecia na década de 1970, quando a quantidade de recursos naturais explorados em um ano passou a ser maior do que a capacidade que a natureza tem de repor neste mesmo período. Em 1971, ultrapassamos este limite em dezembro, em 1981, em novembro, atualmente, a ‘sobrecarga do planeta’ acontece em agosto. A pressão sobre o planeta está tão alta que seria necessário um ano e meio para a natureza repor o que consumimos em um ano. Mas isto não significa que haja uma distribuição igualitária dos seus recursos. A desigualdade é uma das marcas do mundo globalizado capitalista: um norte-americano consome cerca de 11 vezes mais que um africano ou sul-asiático e tem a pegada de carbono 250 vezes maior que a de um etíope.
DESASTRES AMBIENTAIS
A exploração indiscriminada da natureza também causou grandes desastres ambientais. Acidentes em usinas nucleares como Chernobil, na Ucrânia, em 1986, e Fukushima, no Japão, em 2011, ainda contabilizam vítimas. Em 2010 e 2011, os vazamentos de petróleo no Golfo do México e na bacia de Campos danificaram habitats e acarretaram a perda de vida humana e marinha. O rompimento da barragem de Fundão, em 2015, maior desastre ambiental do Brasil até o momento, estrangulou o Rio Doce e afetou a vida dos habitantes de uma pequena cidade em Minas Gerais.
MUNDO CONECTADO
A travessia de longas distâncias foi facilitada pela invenção dos navios, trens, automóveis e aviões. A velocidade da informação também aumentou, após a prensa, com o telégrafo, o telefone, o rádio, a TV. Para que elas fossem possíveis, as cidades demandaram a construção de sistemas com milhares de fios e tubos de chumbo que atravessavam os subsolos – posteriormente substituídos por cabos de cobre e, depois, de fibra ótica. Hoje, uma conversa global acontece em tempo real por meio dos telefones celulares, da internet e das novas tecnologias da informação e da comunicação. Cruza o planeta via SMS, tweets, hashtags. O poder de comunicar está literalmente em nossas mãos, e o mundo parece menor, cada vez mais conectado.
PLANETA FINITO
Uma nova perspectiva da Terra começou a ser revelada, enquanto todas essas mudanças aconteciam. Foi quando a humanidade pode ver o planeta, sua casa há 200 mil anos, do espaço sideral. O primeiro a ter essa chance foi o cosmonauta russo Yuri Gagarin, em 1961, que ficou embevecido com a luz azul que envolve o planeta. Já em 1968 foi a vez dos três norte-americanos a bordo da Apollo 8 que deram uma volta ao redor da Lua e viram a Terra a 386 mil quilômetros de distância. O astronauta Bill Anders registrou esse momento, fotografando a superfície da Lua e um hemisfério iluminado pelo Sol. Nosso poder nos levou para fora o planeta. Hoje, fazemos planos de voltar a Lua, buscamos por água em Marte, procuramos planetas fora do Sistema Solar.
Astronauta da NASA que tripula a Estação Espacial Internacional. (NASA CC BY-NC 2.0) (2014-03-14), de (NASA CC BY-NC 2.0)Museu do Amanhã
Vista o planeta Terra filmada da Estação Espacial Internacional. (NASA) (2016-04-19), de NASAMuseu do Amanhã
Hoje, somos mais de 7 bilhões de pessoas. À esta distância, nossa presença na Terra passa despercebida, a não ser à noite, pelas luzes das cidades. A bela cor azul cobre os desmatamentos, as secas, a escassez de água doce, a erosão do solo, a perda da biodiversidade, a poluição do oceanos e da atmosfera provocadas por nós. Mas, vista de tão longe, finalmente entendemos que o planeta tem limites, que, ao contrário do que o modelo desenvolvimento atual leva à crer, é finito. E, se continuarmos neste ritmo, pesquisas apontam que precisaremos dos recursos de três planetas Terra para suprir as demandas da população mundial até 2050.
Presidente do Conselho de Administração do IDG: Fred Arruda
Diretor Presidente: Ricardo Piquet
Curador Geral: Luiz Alberto Oliveira
Diretor de Conteúdo: Alfredo Tolmasquim
Diretor de Operações & Finanças: Henrique Oliveira
Diretor de Desenvolvimento de Públicos: Alexandre Fernandes
Diretor de Planejamento & Gestão: Vinícius Capillé
Diretora Captação de Recursos: Renata Salles
Gerente de Exposições e Observatório do Amanhã: Leonardo Menezes
Pesquisa e Redação: Davi Bonela
Edição de vídeos: Eduardo Carvalho
Edição de textos: Emanuel Alencar
Fotos: NASA, Nações Unidas, Johnny Miller (http://www.unequalscenes.com/), Flickr/Creative Commons
Vídeos: Google Earth Engine, Greenpeace e NASA