Dolce Farniente, um arrojado retrato de Florentina Noronha, mulher do artista é categoricamente ocidental. A pose e a composição são inspiradas nas conhecidas cenas de nus reclinados ou harém dos Orientalistas do século XIX, com um dramático jogo de luz, paleta sensual e drapeados luxuriantes. Este é sem dúvida um retrato ousado para o seu tempo e lugar, expondo não só a atitude provocante e forte personalidade da mulher do artista como também a predisposição do pintor para ostentar sua modernidade.
A sociedade ocidental estava já familiarizada com esse tipo de pose sedutora, mas esse não era o caso com o público indiano. Apesar de seu carácter provocador, este retrato presenteou Trindade a maior honra a que um artista poderia aspirar na época, a medalha de ouro da Bombay Art Society em 1920.
Florentina parece convidar o observador para o seu boudoir. Confortavelmente encostada num monte de colchas macias, pressiona num gesto provocante um lenço sobre o seu seio exposto. Este gesto já era uma convenção na pintura europeia dos séculos XVIII e XIX. Numa mão segura um pequeno leque, com os dedos numa posição que chamam a atenção para a sua perna despida. A modulação da luz e o uso de contrastante de panejamentos vermelho-escuro justapostos à pele radiosa e ao pano dourado e branco acentuam também o carácter erótico desta pintura.
Referências: Shihandi, Marcella, et al, António Xavier Trindade: An Indian Painter from Portuguese Goa (catálogo de exposição), Georgia Museum of Art, University of Georgia, 1996; Tavares, Cristina Azevedo et al, António Xavier Trindade: Um Pintor de Goa (catálogo de exposição), Lisboa, Fundação Oriente, 2005; Gracias, Fátima, Faces of Colonial India: The Work of Goan Artist António Xavier Trindade (1870-1935), Panjim, Goa, Fundação Oriente, 2014.