Convite: "Exposição Retrospectiva de Modesto Brocos” (1952)Museu Nacional de Belas Artes
Em 1952: "Exposição Retrospectiva de Modesto Brocos”.
Essa exposição concentrou-se nos trabalhos produzidos pelo artista em Roma, quando da sua estada entre os anos de 1883 e 1887.
Convite - exposição “Modesto Brocos: um estrangeiro nos trópicos” (2007) by Convite - exposição “Modesto Brocos: um estrangeiro nos trópicos”Museu Nacional de Belas Artes
Em 2007, a exposição “Modesto Brocos: um estrangeiro nos trópicos” enfatizou que o artista, naturalizado brasileiro, produzira obras de caráter social no Brasil, tratando os trabalhadores da terra e os negros de maneira muito valorosa.
Dentre as obras produzidas por Brocos que pertencem ao museu, duas delas, “Engenho de mandioca”, de 1892, e a gravura “Descascando goiaba”, de 1912, evidenciam a preocupação do artista em retratar o trabalho da mulher.
Descascando goiaba (1912) by Modesto BrocosMuseu Nacional de Belas Artes
Em “Descascando goiaba”, a trabalhadora é a única personagem na cena.
Engenho de mandioca (1892) by Modesto BrocosMuseu Nacional de Belas Artes
“Engenho de mandioca” traz a predominância do trabalho feminino
De acordo com Mary del Priore, “assim como estiveram à frente de fazendas e outras atividades agrícolas, as mulheres também dirigiram engenhos [...]”
e havia também as que trabalhavam no cultivo de milho, farinha de mandioca e, principalmente, açúcar. Essas obras, portanto, tematizam o quotidiano de mulheres trabalhadoras.
Outra obra de destaque na coleção do museu é “Redenção de Cam”.
Redemption of Can (1895) by Modesto BrocosMuseu Nacional de Belas Artes
Brocos recebeu a medalha de ouro por esse trabalho na Exposição Geral de Belas Artes de 1895.
Esta pintura nos permite muitas questões e discussões.
Uma avó negra agradece aos céus
pela filha mulata ter dado à luz um bebê branco, fruto de sua união com um homem branco.
O branqueamento do bebê pode ser visto nessa cena como uma bênção.
A geração de Cam, da Bíblia, teria, finalmente, se purificado?
Essa obra, de 1895, dialoga com seu tempo. No século XIX, a concepção mais difundida era a de que alguns povos seriam superiores e outros inferiores, e fundamentava-se em teorias sobre raça e meio geográfico. Os europeus seriam o “ápice do progresso”, numa visão evolucionista. No Brasil, esse foi o momento da construção de uma identidade nacional, baseada na noção de atraso cultural, que reforçava a ideia de que uma raça inferior estaria destinada à escravização e à exploração.
Redemption of Can (1895) by Modesto BrocosMuseu Nacional de Belas Artes
Mas, e hoje? Como poderíamos ler uma obra como essa?
A emancipação preta passa hoje por quais processos?
Essa leitura racialista ainda permanence?
Para além das discussões sobre raça, voltemo-nos para as técnicas de Brocos na produção dessa obra. Um de seus desenhos preparatórios é o Estudo para Redenção de Cam, que mostra os detalhes do bebê, que compõe o centro da tela.
Outra gravura por nós destacada é o retrato de Rodolpho Bernardelli, de 1902.
[Retrato] R.[odolpho] Bernardelli (1902) by Modesto BrocosMuseu Nacional de Belas Artes
Rodolpho foi professor da AIBA e o primeiro diretor da ENBA, a partir de 1890.
Da mesma forma que Brocos fez o retrato de Bernardelli, este último igualmente retratou o amigo.
A amizade entre ambos está evidenciada em nosso acervo, onde temos, por exemplo, algumas cartas enviadas por Bernardelli a Brocos, que versam sobre assuntos interessantes, como a questão da (des)valorização do artista em fins do século XIX;
Carta de Rodolfo Bernerdelli a Modesto Brocos (1893) by Rodolfo BernardelliMuseu Nacional de Belas Artes
A participação das obras na Exposição Universal de Chicago de 1893; a preocupação com a febre amarela, epidêmica no Brasil desde os fins do século XVII, e que assolava o Rio de Janeiro na última década do século XIX e sobre a mudança do prédio da Escola Nacional de Belas Artes.
Carta de Rodolfo Bernerdelli a Modesto Brocos by Rodolfo BernardelliMuseu Nacional de Belas Artes
A carta data de 1897 e traz a preocupação do artista com o novo edifício da instituição, que seria erguido na primeira década do século XX, em terreno obtido através da demolição do Morro do Castelo, como parte do processo de modernização e saneamento da Capital.
Além de professor, pintor, gravador e desenhista, Brocos também foi escritor e autor das publicações “A Questão do Ensino das Belas Artes”, “Viagem a Marte” e “Retórica dos Pintores”.
Recibo de livraria que atesta a aquisição de exemplares do Livro “Retórica dos Pintores” (1933)Museu Nacional de Belas Artes
Em “Retórica dos Pintores” de 1933, que integra o acervo bibliográfico do museu, Brocos trata da arte nacional, tema muito discutido na época em que escreve, e das reformas do ensino artístico.
Seu intuito com o livro era auxiliar os estudantes de pintura nos seus estudos de formação, dando-lhes uma orientação que ele julgava ausente até aquele momento.
O acervo do Museu Nacional de Belas Artes dispõe de alguns recibos de livrarias que atestam a aquisição de exemplares dessa obra do artista para venda. Os recibos trazem a informação de que cada exemplar custara na época cinco mil réis.
Esperamos ter proporcionado com essa exposição uma percepção de Modesto Brocos para além de suas pinturas, passando por outras produções artísticas, pelas produções literárias e pela ternura em suas relações afetivas, tanto com sua família quanto na amizade entre os artistas-professores.
Essas novas propostas permitem outras construções de conhecimento e de narrativas, outros caminhos de pesquisa e de saberes.
Modesto Brocos: para além das pinturas
Curadoria
Cintya Callado
Idealizada especialmente para o Google Arts & Culture, 2022.
Referências
Anuário do Museu Nacional de Belas Artes. n.11 (1951-1952)
GONZAGA DUQUE. A arte brasileira. Campinas: Mercado de Letras, 1995, pp. 9-231.
CAPEL, Heloisa. Modesto Brocos (1852-1936) e a questão do ensino na Escola Nacional de Belas Artes (1890-1915). In: CAVALCANTI, Ana; MALTA, Mariza; PEREIRA, Sonia Gomes; (Orgs.). Histórias da Escola de Belas Artes: revisão crítica de sua História - Painéis de pesquisa. RJ: EBA/UFRJ/2016, pp. 180-186.
NUNES, José. Modesto Brocos: A Retórica dos Pintores. 19&20. RJ, v. V, n.1, jan.2010.
PRIORI, Mary del. Histórias da gente brasileira. Volume 1: Colônia. RJ: LeYa, 2016.
REIS, Miguel. Louvor ao embranquecimento? Uma análise da pintura A Redenção de Cam (1895) por suas historicidades.na Universidade Federal de Uberlândia, pp. 101-139.
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