CO-1541
Deinhard, Hanna; Deinhard, Fritz. [Carta] 1949 out. 17, New York, NY [para]
Candido Portinari; Maria Portinari, [s.l.]. 2 p. [datilografado]
Amigos Maria e Candinho
Como vão todos em sua casa? Espero que muito bem, e também espero que ainda não se esqueceram de mim. Tive grande alegria quando Lisota Byington me mandou as fotografias do “Tiradentes”. Gostei imensamente e achei particularmente interessante pelo fato de ser, ao mesmo tempo, verdadeiro painel histórico e moderno. Isso é tão raro, hoje em dia. Quase sempre as pinturas históricas ficam umas drogas, do ponto de vista artístico; ou, se estão bem resolvidas artisticamente, cadê o caráter histórico?
Em Dezembro, as fotos vão sair publicadas em “Art News”, com texto explicativo meu. Foi muito engraçado, quando telefonei para o diretor de “Art News” dizendo que tinha fotos de uma obra recente de Portinari para oferecer. Eu disse que não mandaria, pois que só tinha uma cópia e que era coisa importante. Ele então me disse, - como querendo dizer: “se a senhora faz questão de perder o seu tempo” –, que poderia mostrar a ele. Ora, quando ele viu e que expliquei o que era, ele era entusiástico – imediatamente achou a figura do jovem Tiradentes muito parecido com Jefferson, com Danton e mais uma porção de gente revolucionária. Eu disse que era isso mesmo!
Ele pediu também fotos de estudos para o painel. Eu inventei que não tinha, que você apenas fazia estudos e detalhes em quantidade, depois usando livremente. Um evidente absurdo num painel de 18 metros. Mas o homem achou certo. Parece (não tenho certeza) que quer publicar, juntamente, alguma coisa de você, da embaixada cultural inglesa. Mas, uma coisa ele pediu: ter uma ou duas fotos do edifício do Oscar, onde o Tiradentes será colocado. Eu prometi a ele, indagar se era possível. Pois eu gostaria muito que sejam publicados, juntos, os seus nomes – os mais conhecidos (praticamente, os únicos conhecidos) artistas do Brazil. Agora, estou-lhe pedindo um favor: já escrevi ao
Oscar Niemeyer pedindo tais fotos. Mas, como não sei se ele é um pouco do jeito do Santa – sabe como é, sempre esquecendo milhares de coisas – gostaria que Maria ou Candido indagassem, de vez em quando, se ele já mandou, ou se não pode ser. Preciso das fotos até fins de Novembro, ao mais tardar. Não posso oferecer pagamento, pois também não estarei pago pelas fotos. É provável que receba alguma coisinha para o texto, quanto não sei.
Fiquei meio desapontada com o tal famoso Museum of Modern Art. Todo mundo me diz, é verdade, que pioraram nos últimos anos. Pois, atualmente, eles não fazem mais distinção alguma, assim me parece, entre coisas de qualidade artística e, simplesmente, drogas que se intitulam “modernas”. Acho isto muito ruim, pois o público, que, às vezes, já não entende muito, fica tomando as coisas mal feitas por exemplos de arte moderna “tout court”.
Não vi nada de novos artistas americanos, que seria coisa extraordinária; é verdade que o lado puramente técnico é, quase sempre, bastante bom, mas o lado invenção ou estilo ou expressão, ou como quer que queira chamar, é muito banal e, muitas vezes, tipo Picasso mal entendido, sobretudo um tal Milton Averey.
Como nós não vínhamos com a idéia de encontrar aqui um paraíso terrestre, mas sim com a idéia de encontrar museus, bibliotecas, escolas etc., estamos muito contentes aqui. Achei, em muito pouco tempo, um lugar para ensinar história da arte, e os alunos estão gostando de mim. Um dos meus cursos do ano passado tinha por título “Art of Our Time”. Começava com Courbet e tinha marcado no programa que a última aula seria sobre os mexicanos e Portinari.
Infelizmente não deu tempo bastante, mas, este ano, já mostrei 3 coisas de Candido. Na primavera, um curso meu terá o nome: “Revolutionary” art from David to Picasso. Procurarei mostrar como o termo “revolucionário”, em arte, pode ter significações as mais diversas. Que, porm exemplo, Portinari pintando negros não é, necessariamente por isso, um artista “revolucionário”, só em certos ambientes etc.
Vocês estão vendo, não esqueço a sua casa amiga.
Nunca tivemos notícias diretas do Leskoschek. Apenas ouvimos, indiretamente, que ele está trabalhando muito (entre outras coisas, faz crítica de teatro), que está passando muito bem e que Marusja está na Suíça. Será?
Bom, vou parar aqui. Como seria bom poder conversar, de vez em quando, com vocês!
Um abraço e saudades para Maria, Candinho e João Candido
Hanna e Fritz
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