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Letter

Rosinha Leão

Projeto Portinari

Projeto Portinari
Rio de Janeiro, Brazil

Faz um relato, detalhado, da encomenda, negociações, execução, dificuldades, exposição no Brasil e da entrega oficial dos painéis de Portinari, para o edifício sede da ONU, em Nova York.

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  • Title: Letter
  • Creator: Rosinha Leão
  • Date Created: 1972-01-04
  • Location: Rio de Janeiro RJ
  • Provenance: Portinari Project Collection
  • Subject Keywords: Vida Artística, Premiações, internacionais, Carnegie Institute, Vida Artística, Premiações, internacionais, International Fine Arts Council, Vida Pessoal, Entrevistas/Declarações, 1950-62, Vida Política, Perseguição política, EUA (Macartismo)
  • Transcript:
    CO-1817 Leão, Rosinha. [Carta] 1972 jan. 4, Rio de Janeiro, RJ [para] Rubem Ricupero, [s.l.]. 4 p. [datilografado] Caro Ricupero Quando comecei a escrever sobre os painéis da ONU realizei que me faltavam vários dados. Tive então que conversar com Bianco e outras pessoas, fiz perguntas à FAU, Universidade de S. Paulo, que tem grande documentação sobre Portinari. Por isso é que só hoje lhe mando as informações pedidas. PAINÉIS DA ONU O governo brasileiro resolvera fazer uma doação à nova sede da ONU em Nova York. (A primeira idéia fora doar uns móveis de jacarandá). O Embaixador João Neves da Fontoura, então Ministro das Relações Exteriores, incumbiu o Ministro Jayme de Barros, colecionador e cultor das artes plásticas, chefe da Comissão de Organismos Internacionais, de entrar em contato com o arquiteto Wallace K. Harrison, que era presidente da Comissão Internacional dos Arquitetos da ONU, e com o Superintendente do Edifício da ONU, e da conversa surgiu a possibilidade do Brasil doar 2 painéis pintados por Portinari para o hall dos Delegados da Assembléia Geral das Nações Unidas. O hall ainda parecia incompleto. Toda a parte fronteira fora envidraçada, mas as duas paredes laterais continuavam vazias e despidas. Eram 2 superfícies colossais, medindo 14 metros de altura por 10 metros de comprimento. Nesta ocasião Portinari era muito conhecido nos Estados Unidos. Em 1938, o seu quadro “Café” recebeu 2ª menção honrosa na Exposição Internacional de Pintura do Instituto Carnegie (N.Y.) Em 1938 o quadro “Morro” (1933) foi adquirido pelo Museu de Arte Moderna d Nova York. Em 1940 Portinari levou pessoalmente aos Estados Unidos 3 grandes painéis (3mx3m) (pintados a tempera), encomendados pelo Sr. Armando Vidal, comissário geral do Pavilhão Brasileiro na Fera Mundial de Nova York, para decorar o mesmo. Nesta mesma ocasião Portinari participou (com 25 quadros) da Exposição de Arte Latino-Americana, no Museu Riverside. Os painéis e os quadros valeram-lhe o convite do diretor do Museu de Arte de Detroit, o sr. Valentiner, para fazer uma exposição individual naquela cidade (agosto 1940). Esta exposição que era constituída de 130 quadros foi dividida em 3 exposições que percorreram os E.U. durante 1 ano. Ela foi apresentada, simultaneamente, em Chicago e no Museu de Arte Moderna d Nova York em outubro de 1940. A exposição em Nova York foi um grande sucesso (mais de 2000 pessoas na inauguração) e contou com a presença de Portinari. O sucesso alcançado pelo artista está testemunhado no álbum “PORTINARI his Life and Art”, com introdução de Rockwell Kent, publicado em inglês e português, por iniciativa da Universidade de Chicago, e composto e impresso na Imprensa daquela Universidade. Portinari, nesta ocasião e também mais tarde, fez por encomenda vários retratos, entre eles de Nelson Rockfeller, Arthur Rubinstein, mulher e os dois filhos, Helena Rubinstein, etc. Em 1941, após curta estadia no Brasil, Portinari voltou aos Estados Unidos, comissionado pelo Presidente Vargas para, a convite do poeta Archibald Mac Leish, diretor da Biblioteca do Congresso de Washington, decorar uma sala da seção hispânica da Biblioteca. São 4 grandiosos afrescos onde o artista renova os assuntos da “Descoberta” e “Colonização”. Em 1947, a União Panamericana, em Washington, fez uma exposição d Portinari com quadros cedidos por colecionadores norte-americanos e com os estudos preparatórios dos murais da Biblioteca do Congresso. Em 1955 Portinari recebeu a medalha de ouro do “International Fine Arts Council” de Washington, “melhor pintor de 1955”. Em 1959 faz em Nova York uma exposição individual na Galeria Wildenstein. Para os painéis da ONU Jayme de Barros consultou o chefe do Departamento Político Cultural, Vasco Leitão da Cunha, sobre a possibilidade do Brasil doar os painéis. Neves da Fontoura aprovou a idéia e, juntamente com Vasco, foi feito o convite a Portinari, em meados de 1952. O Ministério apresentou diversos temas, dentre os quais Portinari escolheu “Guerra e Paz”. “Eu escolhi o tema “Guerra e Paz” depois de um meticuloso estudo. Para a “Guerra” inspirei-me na Bíblia, nos Quatro Cavaleiros do Apocalipse...” (Entrevista de Portinari para A Gazeta de S. Paulo – 7.6.1955). “Para a “Paz”, Portinari foi buscar inspiração em Esquilo” (Folha da Tarde, S. Paulo, 23.10.1952). Em 1953 o artista entregava ao Itamaraty 2 maquetes (1m35x1m), que foram enviadas a Nova York. W. Harrison redigiu memorandum declarando “haverem sido aceitas, definitivamente, as suas pinturas murais, pelas quais manifesta irrestrito entusiasmo” (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 21.5.1953). Foi feito, então, um contrato com o Itamaraty. As 2 maquetes tinham custado 100 contos cada e, pelos 2 painéis de 10x14m, Portinari pedia 2.800 contos de réis – 3 mil contos ao todo. Na época foi julgado o preço elevado, porém o Ministro Neves da Fontoura autorizou a despesa. O dinheiro foi pago parceladamente. A ONU enviou as plantas com todos os detalhes e medidas e Portinari manteve grande correspondência com o arquiteto Harrison. No contrato, Portinari se comprometia a pintar os painéis em... (?) Portinari levou 2 anos fazendo estudos para o painel. Fez 150 desenhos. Cada mão, cada pé, cada rosto era motivo para um estudo detalhado. Pintou 14 grandes quadros a óleo – estes estudos pintados alguns no tamanho em que deviam ficar na trama da composição e outros em escala mais reduzida foram expostos numa Sala Especial da III Bienal d São Paulo em 1955. E fez ainda mais 2 maquetes para servirem de modelo. Portinari teria gostado de pintar os painéis da ONU em Nova York mas, em vista das exigências da lei Macarran, não lhe foi concedido o visto dos Estados Unidos. Houve dificuldade em conseguir um local grande bastante para servir de atelier. O jornalista Assis Chateaubriand, fundador dos Diários Associados e do Museu de Arte de São Paulo, resolveu o problema oferecendo um local nos fundos de um prédio em construção – o auditório dos estúdios da Televisão Tupi, na Rua Paulino Fernandes 39, em Botafogo. Os painéis foram pintados em madeira. Portinari disse numa entrevista ao Correio da Manhã (2.2.1956): “Quando estive na Itália em 1951, procurei estudar a obra de vários pintores antigos, em relação ao material empregado e seus suportes. Constatei que, entre as obras de um mesmo artista, estavam em mau estado aquelas feitas diretamente nos muros, em flagrante desvantagem com as que foram feitas sobre tela ou madeira”. Os painéis foram feitos de madeira compensada (cedro) à prova d’água e foram construídos por carpinteiros navais. O painel em baixo quase encosta no chão e em cima tem uma forma irregular, mais alto de um lado do que o outro, para adaptar à parede. Cada painel foi dividido em 12 painéis de mais ou menos 2.20x5m, e todos eles aparafusados, tendo por trás ripões de peroba, fixados, a cada 10cm, por parafusos galvanizados com buchas tapando – correspondendo portanto a uma parede sem os inconvenientes desta. Os painéis foram lixados e preparados com uma base de cola Totin e uma segunda mão de cola Totin e gesso. Na hora de pintar os painéis foram unidos no centro e formavam então faixas de 2.20x10m. Começou-se a pintar de cima para baixo – os painéis eram pintados 2 a 2. Quando ficavam prontos retirava-se o de cima, suspendia-se o de baixo e encaixava-se o novo. E Portinari dizia: “Não tem problema – a maquete está perfeita – é só segui-la. O painel foi pintado como um quadro de cavalete. Portinari foi auxiliado por Enrico Bianco e Rosalina Leão. A tarefa foi transferir a composição original para uma superfície 100 vezes maior, sem lhe alterar o desenho, o valor ou a cor. Sobre esta base Portinari trabalhava. O painel foi pintado em 9 meses – começou-se a pintar em abril de 1955 e foi concluído em dezembro do mesmo ano. Portinari fez a entrega oficial dos painéis ao Secretário Geral do Itamaraty, Embaixador Antonio Camillo de Oliveira, no dia 24 de agosto de 1955. E depois ainda continuou trabalhando, até dar por pronto. Os painéis prontos só iriam ser vistos no Edifício da ONU. Mas começou então movimento de opinião pública e um grupo de artistas e intelectuais apelou para o Chanceler Raul Fernandes para que os painéis fossem expostos no Brasil antes do embarque para os E.U. O problema sempre era a dimensão dos painéis. Afinal, eles foram expostos no Teatro Municipal. (O Teatro ainda estava todo modificado para o Baile de Carnaval (13.2.) Os painéis foram montados (com grande dificuldade) junto ao palco e o tablado de dança serviu de salão de exposição. Ficaram impressionantes. Às 22 horas, muito bem iluminados, os painéis foram solenemente inaugurados pelo Presidente Juscelino Kubitschek, no dia 27 de fevereiro, 1956. À solenidade compareceram o Ministro do Exterior (Macedo Soares), Ministros da Educação e da Fazenda, Prefeito do Distrito Federal, corpo diplomático, mundo oficial, político, social e artístico. Ficaram expostos até o dia 6 de março e verdadeira multidão acorreu ao Municipal para vê os painéis. Para esta ocasião o Itamaraty publicou uma plaquete com apresentação do Embaixador Jayme de Barros. Logo depois, os painéis foram encaixotados e enviados à ONU. Os dois imensos caixotes ficaram no porão da ONU durante 1 ano e 6 meses. Houve um silêncio inesperado. Ninguém soube da chegada, nem quando seria montado e inaugurado. Nada. Portinari enervadíssimo, apavorado que os quadros mofassem – fechados nos caixotes, sem ar, sem luz. Perguntava-se a um, a outro; os jornais comentavam, os literatos escreviam, reclamavam. Nada. Afinal, no dia 6 de setembro de 1957, os painéis foram entregues ao Secretário Geral da ONU. Presentes o Embaixador Cyro de Freitas Valle; o chefe da Comissão de Organismos Internacionais, Jayme de Barros, e senhora; o Cônsul Geral Chermont e senhora; a cônsul Dora Vasconcellos. O Embaixador fez um pequeno speach; Dag Hammarskjöld recebeu os painéis – “the greatest monumental work given to the United Nations...”. Como essa cerimônia foi realizada poucos dias antes da abertura das Sessões não se achava presente nem um único membro da ONU a não ser o Delegado Geral. Não estava presente nem um único crítico de arte, um único artista, um único jornalista. Não houve convites. Presentes, os brasileiros mencionados e alguns brasileiros de passagem. Depois houve um pequeno cocktail entre os poucos presentes no 2º andar da Sede. Eu por acaso estava entre os brasileiros de passagem. Em fins de agosto fui, a passeio, a Nova York e prometi a Portinari informar-me a respeito dos painéis. Não conseguindo nenhuma informação fui à ONU e lá vi a grande armação metálica que estava sendo construída para receber os painéis. Fiquei boquiaberta com o trabalho. As 12 partes de cada painel iam ser presas separadamente na armação para não haver perigo de esmagamento pelo grande peso e também permitindo a dilatação da madeira. As armações eram, por sua vez, presas à parede por meio de pinos metálicos que varavam a parede de lado a lado e eram aparafusados pelo lado oposto. Essas armações gigantescas custaram à ONU 10 vezes o preço pago pelos painéis. Telefonei, dias seguidos, a Dora Vasconcellos, perguntando a data da inauguração e pedindo convite. O Consulado não sabia de nada. Afinal, telefonei a Marina de Barros, pedindo convite e ela me disse que não havia convites – era no dia seguinte a inauguração e bastava dizer que era brasileiro que deixavam entrar. Foi o que eu fiz. Esta a razão porque Mr... nunca teve a menor notícia a respeito dos 280m²de pintura de Portinari doados pelo Brasil à ONU. Lembranças a Marisa e para você e todos os seus um 1972 muito feliz PS. Mando junto um estudo de Flavio Motta sobre Portinari com uma esplêndida bibliografia e xérox de alguns jornais. 3
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  • Type: letter
  • Publisher: Projeto Portinari
  • Rights: Rosinha Leão
  • External Link: http://www.portinari.org.br
  • Number: 1817
  • Collection Data Type: CO
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