Painel do retábulo da capela-mor da Sé de Viseu (1501-1506) alusivo ao tema da Circuncisão.
O realismo minucioso, a que não é alheia uma evidente intensão pedagógica, é o valor dominante na representação deste tema. Os vestígios de sangue na faca e sobre a toalha, ou a ponta de osso que remata o bordão de S. José, são pormenores que denotam um sentimento peculiar, talvez uma sensibilidade meridional e, por isso, invulgares na pintura nórdica. Os rostos crispados e os olhares dirigidos para o Menino, que se oriente no sentido do observador com uma expressão de alheamento quase patética, dão a dimensão real do sacrifício, bem simbolizado pela faca ainda representada na diagonal, como elemento cortante.
Numa composição dominada pelas linhas verticais do fundo, acentuadas pelo brocado que se estende sobre um altar marmoreado, dispõem-se as figuras definindo uma essencial linha diagonal. A figura de São José, demasiado volumosa, parece resultar de uma tentativa de equilibrar a composição e da necessidade de preenchimento do espaço em virtude da dificuldade em sugerir o seu aprofundamento. É natural que uma gravura de o Mestre E. S. tenha inspirado a sua representação, cujo capuz em perfil assume uma forma caprichosa. A técnica minuciosa é visível na transcrição do brocado de desenho correto, no belo friso de pedras preciosas da figura colocada por trás da Virgem ou, ainda, na qualidade plástica das esculturas e elementos decorativos da arquitetura de fundo.
Na figura do Sumo-sacerdote, no cabeção à altura do peito, foi identificada a inscrição VASCO, que apesar de não permitir qualquer conclusão positiva ou definitiva para a complexa questão da autoria deste conjunto retabular não deixa de ser sugestiva.