Plural
ATIVISTA TEATRAL
ENTREVISTA Homenageado pela Unesco, o diretor e dramaturgo
Augusto Boal afirma que a televisão pratica “crime estético”
A ANA PAULA SOUSA
Oi no Théâtre de Ville, em Paris,
que
Augusto Boal celebrou, na
sexta-feira 27, o Dia Mundial
do Teatro. Homenageado pela
Unesco, o diretor, dramaturgo
e ensaísta brasileiro de 78 anos via o
F
trabalho que realiza desde os anos 1960
ser mundialmente aplaudido.
formas de expressão e comunicação es-
tão nas mãos dos opressores. O que a te
O Teatro do Oprimido, o método que levisão oferece é um crime estético. E ain-
Boal desenvolve desde os anos 1960, é da acham estranho que alguém saia ma-
tão conhecido quanto impalpável. Muitando quinze pessoas de uma só vez. O
ta gente já ouviu falar dele. Mas o que cérebro das pessoas está impregnado des-
é, de fato, esse teatro que se propõe a sas imagens. As rádios também repetem
ser, a um só tempo, arte, ação social e o mesmo som o tempo todo. Sem falar no
movimento político?
tecno, que desregula até marcapasso, e é
pior que ouvir gente quebrando tijolo em
construção. O que a gente quer, no Tea-
tro do Oprimido, é lutar nestes três cam-
pos: palavra, imagem e som.
Boal, ex-integrante do Teatro de Are-
na e escritor incansável, diz, na en
trevista a seguir, que se trata de
uma ação capaz de transformar a
sociedade e de fazer frente à es-
tética dominante.
CartaCapital: Em poucas pala-
vras, como o senhor definiria o
Teatro do Oprimido?
Augusto Boal: Defendemos
que todos nós podemos fazer
teatro, que todos podemos ser
personagens, de fato, de
nossas próprias vidas. Por
que temos de seguir a esté-
tica determinada pela
classe dominante? O Tea-
tro do Oprimido traz con-
sigo a estética do oprimi-
do. Ou seja, queremos que as
pessoas retomem suas pró-
prias palavras, imagens e sons.
CC: Na prática, isso signifi-
ca o que?
AB: Significa compreen-
der que, hoje, todas as
CC: Dê um exemplo desse trabalho. Como
ele é feito, que resultados proporciona?
AB: O Teatro do Oprimido é seguido,
por exemplo, pelo MST. Há uns dez
anos, eles fundaram um grupo e quase
30 camponeses vieram conhecer o nos-
so trabalho. Passamos para eles tudo o
que podíamos. Eles não vieram para
consumir uma técnica, mas para rece-
ber instrumentos que pudessem usar
em suas terras. Esta é também a ideia
do Teatro do Oprimido ponto a ponto,
que difunde o trabalho pelo Brasil. Te-
mos multiplicadores do que fazemos
aqui no Rio de Janeiro. Estamos em de-
zesseis estados.
CC: O que significa, para uma organiza-
ção como o MST, ter grupos de teatro?
AB: Significa ter o direito de tratar de cer-
tos assuntos a partir da visão deles, expor
uma visão dos acontecimentos que não é
aquela dos jornais, que coloca o MST
como um bando de bruta-
66 Por que
seguir o teatro
dominante?
Todos somos
personagens 99
montes. O teatro permite
que o pensamento que está
por trás do movimento seja
exposto, retrabalhado.
CC: Em linhas gerais, qual
a sua avaliação do teatro
brasileiro hoje?
AB: Existe um mundo de tea-
tros no Brasil. Nunca vi um
espetáculo no Amazonas