porque as pessoas iam às ruas gritar contra
a discriminação", diz o historiador Green.
No Brasil, grandes transformações na área cultu-
ral vieram no embalo da contracultura. A principal
delas foi o tropicalismo, que ainda hoje reverbera
vimento, liderado por Caetano Veloso, Nara Leão
especialmente na música popular brasileira. O mo-
e Gilberto Gil, entre outros artistas, propunha mu-
danças tão radicais que se revelaram inspiradoras
para todas as
as gerações seguintes. O tropicalismo
de Caetano incorporou o uso da guitarra elétrica
e de géneros como o bolero e as músicas de raiz.
De tão ousada, a mistura provocou reações iradas
dos setores mais conservadores, que consideram
aquilo uma agressão. O tropicalismo só foi possível
porque vivia-se uma época em que se experimen-
Fatek MTV Kiatin Stt kế Hài / Duc B
tava de tudo. Era o ano em que o principal grupo
de rock do mundo, os Beatles, ia à India conhecer
o guru Maharishi Mahesh Yogi. Aquela viagem,
que então parecia maluquice, apressou o contato
do mundo ocidental com as técnicas da meditação,
diz a escritora Sharon Begley num artigo publicado
na revista Newsweek.
O diretor de teatro José Celso Martinez
Corrêa, que encenou a peça marginal Roda Viva,
um dos marcos da contracultura do período, diz
que 68 foi fundamental para uma mudança não só
de comportamento, mas da própria visão de mun-
do. “Aquela geração tirou a máscara da hipocrisia”,
diz. “As pessoas se deram conta de que precisavam
viver o aqui e o agora, que não dava para esperar
os outros fazerem algo por você." Uma das trilhas
sonoras possíveis para o período, “Para não Dizer
Que não Falei das Flores", de Geraldo Vandré, traz
um verso, um tanto gasto hoje em dia, que traduz
esse espírito: "Quem sabe faz a hora, não espera
acontecer". Fazer a hora era um termo cujo
significado ia desde ingressar na luta
armada contra o governo militar
até o uso de drogas, praticar o
O tropicalismo propôs
inovações tão radicais que
virou inspiração para todas
as gerações seguintes
sexo livre ou vestir-se com calças
boca-de-sino. Hoje esse discurso soa
algo irreal. Desde então, o regime militar
foi sepultado e uma era individualista torna difícil
acreditar nas soluções coletivas. O escapismo das
drogas revelou-se um vício associado à violência,
muito mais que a abertura da mente". A aids fez
to com a percepção de que, embora prazeroso, ele
refluir o comportamento sexual sem limites – jun-
felizes.
E, no entanto, poucas das grandes mudanças por
que passamos nessas
naquela época. Da tolerância à diversidade ao re-
décadas não surgiram
is quatro
conhecimento dos direitos das mulheres e mino-
rias, do movimento ambientalista às organizações
comunitárias, da valorização dos prazeres à busca
da espiritualidade pela meditação, a geração de 68
atingiu, sim, seu ideal de transformar o mundo.
não tornava as pessoas
7 DE JANEIRO DE 2008 I REVISTA ÉPOCA I 67
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