8 JORNAL DO BRASIL
Hai-Kai
Pão em demasia
Fabrica corpo mole
E alma vazia
A PÁTRIA EM CHAMAS
Quando a floresta arde é o
Brasil que queima. A pátria é povo
mais território, um universo vivo de ecossistemas e biodiversidade.
Amazônia, Pantanal, Mata Atlântica, São Francisco, até o pequeno
bosque do nosso bairro, todo cercadinho de asfalto e cimento, a ár-
vore solitária da nossa rua, tudo isso é Brasil.
Dito assim, nos cíni-
cos tempos pós-modernos, talvez soe piegas. Mas a natureza brasi-
leira é uma questão de identidade. Devastada, passa a ser
uma ques-
tão de defesa
nacional. Vê-se na TV que as matas queimam na Ca-
lifórnia. Incêndio florestal então
então também é
coisa de primeiro mun-
do, certo? Uma fatalidade, certo? Não há nada a fazer, certo? Erra-
e
s entre o fogo deles e o nosso há toda uma
Wanizacão institucionales Social para nincs
com sistemas de alerta, aviões-pipas, unidades
especiais
, bombeiros
voluntários; cada cidadão sente-se responsável e motivado a preve-
nir e lutar; o fogo quase sempre ocorre por acidente, favorecido por
do HA
cia,
ou diversão
de canaviais, agricultura primitiva. Nas áreas urbanas ou periféri-
cas, a queima de lixo ou os balões. A piromania, no Brasil
, não é
loucura; trata-se de um
cro, da ignorância miserável ou da irresponsabilidade. Nossos in-
esporte nacional
amparado na lógica do lu-
cêndios são mais dolosos do que culposos. Precisamos de uma po-
literapia: conscientização, instrução, organização e articulação ins-
precisamos de uma repressão firme às queimadas criminosas. Go-
verno, forças armadas, judiciário, prefeituras, ONG's, sindicatos,
MST, todos precisam assumir suas responsabilidades, antes que as
nuvens de fumaça estacionem sobre as grandes cidades. Aconteceu
na Indonésia há um ano: aeroportos fechados, aulas suspensas, pro-
dução reduzida, cidades envoltas em fumaça por semanas a fio, pes-
soas tossindo, adoecendo, lacrimejando sem parar.
PARADOXO: Na Amazônia, a pecuária é predadora do meio am-
biente; no Pantanal, é aliada. Os rebanhos amazônicos ocupam
B
cademob@jb.com.br
áreas devastadas nos anos 70 com incentivos fiscais e financiamen-
tos subsidiados. No Pantanal, criar gado é uma atividade tradicio-
nal, praticada em grandes extensões e em harmonia com a natureza.
Vem de longe mas, atualmente, passa por uma crise brutal. Está de-
saparecendo, o que cria um efeito ambiental perverso: livre do piso-
teio dos grandes rebanhos, o capim da região cresce alto e vira ex-
celente combustível para incêndios. O boi está para o Pantanal as-
sim como a borracha para a Amazônia: são atividades econômicas
tradicionais, em crise, que precisam ser salvas por que têm um va-
lor ecológico agregado
TIRA-TEIMA: No seminário promovido pelo Conselho das
Águas da Zona Sul e Crea, na semana passada, o governo do Rio
garantiu para este mês o início do conserto dos 64 pilares abalados
do emissário de Ipanema. A obra deverá
durar 14 meses. Os pilares em pior estado
serão reforçados até o final de outubro.
Também foram prometidas para breve
obras na tubulação do canal da Av. Viscon-
de de Albuquerque, do Jardim de Alá, da
Av. Niemeyer e da Rocinha, para tirar es-
gotos de canais e galerias pluviais. Vamos
ficar de olho.
NEOVILÕES: Reportagem recente do
jornal The New York Times, inspirada em
estudos das universidades de Duke (EUA)
e Abeerden (Escócia), decreta categorica-
mente: golfinhos nada têm de Flipper,
na verdade, assemelham-se mais ao malé-
volo tubarão de Spielberg. Ataques a seres
humanos, torturas de filhotes, brigas san-
grentas e oportunismo (acompanham bar-
cos apenas para aproveitar o empuxo, por
exemplo) são alguns dos "crimes" atribuí-
dos aos ex-queridinhos dos aquários norte-
americanos, agora qualificados de "assas-
sinos frios". Será? Talvez os tais estudos
sejam sérios, mas a reportagem certamente
não é. Atribuir comportamentos e sentimentos humanos aos golfi-
nhos, seja para santificá-los, seja para satanizá-los, talvez satisfaça
nossas carências e perversões, mas não passa de sensacionalismo
barato. E perigoso: pode gerar uma caça às bruxas no mar e justifi-
car crimes ambientais, esses sim dignos do nome, porque cometidos
por seres humanos. Os golfinhos livres são animais selvagens. Co-
mo todos os animais, têm hábitos próprios. Atuam segundo a sua
natureza e podem reagir a invasões de território. Melhor deixá-los
em paz. E tentar entendê-los. A distância.
ONDACULTURAL: "Não sabemos o que somos. Há tanta escora e
espeque e amarrilho de cipó na nossa estrutura social, que ninguém
consegue ver a forma do nosso edifício. Parece democracia e não é. Pa-
rece país e não é. Parece que está vivo e não está." Ainda atual, a cons-
tatação traz a assinatura de Monteiro Lobato, veio à luz em 1931 e aca-
ba de reaparecer, obra e graça do fundamental Claros e escuros - Iden-
tidade, povo e mídia no Brasil (Vozes), do jornalista e sociólogo Mu-
niz Sodré. Determinado a desvendar o enigma da identidade brasileira
e ressaltar, a despeito das banalizações do mercado, o que há de negro
nela, o autor do livro poderia acrescentar: parece uma democracia ra-
cial e não é. Trata-se de leitura indispensável para quem deseja enten-
der as singularidades do país em que vive e do povo do qual faz parte.
Em tempor espeque e escora são sinônimos; amarrilho é cordão.
TERÇA-FEIRA, 7 DE SETEMBRO DE 1999
FALA, LEITOR: "A supervalorização do automóvel ocasionou
danos terríveis às grandes e médias cidades. Precisamos trazer para
o debate novas formas e meios de transporte. Não se pode resolver
um problema transformando-o em outro. O carro é o grande vilão
deste final de século" (Ricardo
"Em nenhuma capital do mundo o transporte de massa é
feito
por automóvel. Nas grandes metrópoles, que nosso arqui-
teto-prefeito tanto admira, o transporte baseia-se no metrô e
nos trens. A solução para o trânsito caótico no Leblon, em São
Conrado e na Barra não é o túnel, mas o metrô” (Rodrigo
Girdwood, Rio).
MAROLAS
. O Comitê Rio da Ação da Cidadania
Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida lan-
ça a campanha Recicle uma vida. Centenas
de urnas foram espalhadas pela cidade. Pa-
ra participar, doe cartuchos vazios de tinta
de impressora, que serão vendidos para re-
ciclagem. A receita vai bancar uma versão
não-estatal do programa bolsa-escola, em
que famílias de baixa renda recebem R$
136,00 para que suas
crianças estudem. Informações: 0800
202000
O Brasil possui 12,5 % do total mundial
de água doce. Temos reservas de 47.000m3
por ano, por habitante; nos EUA, são ape-
nas 10.000m3. A água será a grande rique-
za estratégica do próximo milênio.
Greenpeace denunciou a existência de
um gigantesco depósito a céu aberto de cal
contaminada por dioxinas, perto da represa
Billings. Detalhe: a Billings abastece de
água a cidade de São Paulo...
A prefeitura de Niterói sabiamente desistiu da garagem sub-
terrânea do Campo de São Bento. Agora só falta a do Rio fazer o
mesmo com as que deseja construir na Av. Atlântica e na praça Nos-
sa Senhora da Paz.
O túnel sob o Dois Irmãos, que ligaria São Conrado ao Leblon, es-
tá orçado em cerca de R$ 60 milhões, e não R$ 30 milhões, como
informamos na semana passada.
Esta coluna está aberta à participação de leitores e a contribuições
de ONGs. Entre em contato.
NAVEGAR É PRECISO
- Feema: www.feema.rj.gov.br
. Greenpeace: www.greenpeace.org.br
Instituto Socioambiental: www.isa.org.br
LER TAMBÉM: Ecologia urbana e poder local, de Alfredo Sir-
kis (Fundação
OndAzul).
com Sergio Sá Leitão e Alberto Santos/Fundação OndAzul
e-mail para esta coluna: ondazul@ondazul.org.br