JORNAL DO BRASIL
IGILBERTO GIL
Hai-Kai
Você reparou?
A sessenta por hora
Tudo adiantou!
NA CONTRAMÃO DOS TEMPOS
A primeira audiência pública de avaliação do projeto do túnel en-
tre o Leblon e São Conrado, na Zona Sul do Rio, foi um belo exercí-
cio de democracia e participação. Moradores dos bairros afetados, par-
lamentares, técnicos e representantes de ONGs realizaram uma dis-
cussão de bom nível, conduzida pela Feema. Para além do projeto em
pauta, discutiu-se o modelo de transporte do futuro. A despeito das
paixões e de uma ou outra farpa, imperou a civilidade.
Por iniciativa do próprio representante da Prefeitura, o secretário de
Transportes, Márcio Queiroz, o debate transcendeu os impactos am-
bientais da obra e tratou das perspectivas do nosso modelo rodoviaris-
ta, que privilegia o automóvel e prescreve sempre novos túneis, viadu-
tos, avenidas, vias expressas e garagens subterrâneas. O secretário ga-
rantiu que o ponto de saturação do automóvel no Rio só será atingido
o papel da Prefeitura seria investir no transporte ro-
em 2010. Até lá,
doviário, cabendo ao Estado e à União pensar no transporte de massas
sobre trilhos e hidroviário
São argumentos questionáveis. Precisaremos chegar ao caos de
São Paulo, não obstante as bilionárias obras rodoviaristas de Paulo
Maluf, a um engarrafamento terminal, apocalíptico, como aquele do
livro de Ignácio de Loyola Brandão Não Verás País Nenhum, para
constatar o tal "ponto de saturação" e mudar de paradigma?
Por outro lado, a Prefeitura pode e deve, sim, se preocupar com me-
trô, trens, VLT, HSST, catamarās
que reduzam
a demanda por transporte. Tudo que diz respeito à cidade tem a ver
com a Prefeitura, que há dez anos tem uma situação financeira melhor
que a do Estado e uma capacidade de realização maior. É preciso tra-
çar metas conjuntas e realizar parcerias, em vez de pulverizar recursos.
É a luz da necessidade de mudar nosso paradigma de transporte,
enquanto é tempo, que o túnel Leblon-São Conrado apresenta uma
equação custo-benefício duvidosa. Seus impactos ambientais são
certamente menores que os da duplicação da Avenida Niemeyer, ori-
ginariamente pretendida pela Prefeitura, mas não desprezíveis, so-
B
cademob@jb.com.br
bretudo em relação ao Leblon. Meses a fio de detonações, milhares
de viagens de caminhões retirando pedras e depois um intenso tráfe-
go na orla marítima.
Vale a pena o estorvo e o sacrifício por uma obra que terá como
grande efeito deslocar os gargalos de engarrafamento algumas cente-
nas de metros, criando a aguda demanda por um novo túnel sob o Joá
e mais vias expressas do outro lado? Vale a pena continuar empurran-
do com a barriga a crise do rodoviarismo, na contramão do tempo?
A PARCERIA POSSÍVEL: Mudando a destinação dos cerca de
100 milhões dos túneis Leblon São Conrado, Joá e Grota Funda, a
Prefeitura poderia tornar-se sócia do governo do Estado, da União e
da iniciativa privada na extensão do metrô de Botafogo até a Barra,
que acaba de ter o seu relatório de impacto ambiental encaminhado
à Feema e será objeto de audiência pública ainda em setembro. Este
aporte produziria um efeito bola de neve, viabilizando outras fontes
de financiamento
TRANSPORTE HIDROVIÁRIO: Catamarās semelhantes aos
usados no transporte Rio-Niterói, com pequenas modificações para
que se adaptem as condições de mar aberto, podem ser usados regu-
larmente, com conforto e segurança, entre o canal da Joatinga, na Bar-
ra, e a Praça 15, no Centro, em viagens agradáveis de menos de 40 mi-
nutos. Há empresas interessadas. Caberia ao poder público implantar
a infra-estrutura de embarque e desembarque e outros incentivos.
OUTRAS SOLU-
ÇÕES: Estão enga-
vetados o VLT, veícu-
lo leve sobre trilhos,
CURITIBA É AQUI: Também dá para viabilizar em curto prazo a
ligação Barra-Sul-Centro por canaletas exclusivas, permitindo a livre
e rápida circulação de ônibus articulados, de alta capacidade, con-
fortáveis e de preferência movidos a gás natural, como em Cu-
ritiba. Na Linha Amarela, hoje praticamente restrita aos
carros, essa solução poderia ser rapidamente im-
plementada, com baixo custo.
Tudo combinado com um sis-
tema de vans entre o termi-
nal e os condomínios.
que fracassou por es-
casso estímulo da Pre-
feitura, e o HSST, O
famoso trem magnéti-
co japonês, peça-chave
de uma certa campanha
eleitoral.
leitoral
MATO GROSSO EM CHAMAS: É impressionante a escalada
do fogo em Mato Grosso. Até 1992, o estado apresentava 30% do nú-
mero total de focos de incêndio. Em 1999, no período de junho, julho
e agosto, passou a 62,25%. Isso deve ao incremento do desmata-
mento, principalmente na Região Norte, e à ampliação da agroindús-
tria de cana-de-açúcar, que usa a queimada controlada para facilitar o
corte. A esses fatores econômicos somam-se as queimadas involuntá-
TERÇA-FEIRA, 14 DE SETEMBRO DE 1999
rias e criminosas em unidades de conservação e à beira das estradas; e
a queima de quintais e lotes urbanos. As campanhas oficiais contra as
queimadas fracassaram por falta de orçamento e empenho do gover-
no. O deputado Gilney Viana (PT-MT) apresentou um projeto de lei
que proíbe as queimadas no Mato Grosso a partir de 2000.
SOJA CONTRA FLORESTA: O Grupo de Trabalho Amazôni-
co (GTA) denuncia que 1 milhão de hectares de floresta tropical (área
três vezes maior que o Estado do Rio de Janeiro) está sendo desmata-
do no Sul do Amazonas, nos municípios de Humaitá e Apuí, para plan-
tação de soja pelo Grupo Maggi, com incentivos do governo.
FALA, LEITOR: "Gostaria de parabenizar a OndAzul por tornar
público o drama do saneamento na orla do Rio. Não consigo enten-
der o descaso das autoridades. É sempre uma tortura ir à praia e não
cair na água. Com as praias limpas, mais turistas viriam.” (Luciana
Soares de Souza, Rio)
MAROLAS
.Pitadas de humor não faltaram a audiência pública sobre o túnel Le-
blon-São Conrado. Enquanto o deputado estadual Carlos Minc (PT)
discursava, um cidadão, no fundo da sala, passou a contraditá-lo vee-
mentemente, agitando os braços e vaiando. Era um sósia do orador.
"Erro de clonagem", observou, na platéia, uma cidadã
pós-moderna.
.O vereador Alfredo Sirkis (PV) lembrou ao secretário de Transpor-
tes uma discussão entre ambos, ocorrida em 1994, quando da constru-
ção da Ciclovia Mané Garrincha. Queiroz não queria que as pistas ex-
clusivas ocupassem as laterais
rias do Túnel No
vo. Sua alternati-
va: um novo tu-
nelzinho, no
meio, só para bi-
cicletas!
.0 GTA organiza
no Rio um ciclo de
congo
debates sobre a Ocupação
humana na Amazônia no sécu-
lo 21. Quinta-feira, das 9h às 13h, no Museu
do Jardim Botânico; sexta-feira, no mesmo horário, no
Centro de Ciências da Saúde da UFRJ, na Ilha do Fundão; e no
sábado, das 19h às 23h, na Casa de Cultura Laura Alvim. Informa-
ções: 0XX21-522-0132, ramal 208, ou 0XX21 9605-4602.
A Coppe/UFRJ promove o seminário Mudanças globais e emissões
de gases de efeito estufa. Sexta-feira, às 14h, na Casa da Ciência da
UFRJ, na Rua Lauro Miller, 3, em Botafogo.
.Contribuições de leitores e ONGs são bem-vindas. Entre em contato
NAVEGAR É PRECISO
.GTA: www.gta.org.br
Earth Council: www.ecouncil.ac.cr/
Fundação Biodiversitas: www.bdt.org.br
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Cinema Orly, de Luís Capucho (Interlúdio Editora).
com Sergio Sá Leitão e Alberto Santos/Fundação OndAzul
e-mail para esta coluna: ondazul@ondazul.org.br
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