serafina FOLHA DE S.PAULO AGOSTO 2009
É Osso duro ser a Preta que a
Preta quer ser: Preta Maria Gadelha
Gil Moreira, 35, 82 quilos, 13 tatua-
gens, três vezes descasada, um filho
adolescente, batalha para ser reco-
nhecida como cantora, respeitada
como artista, mas tudo o que tem
recebido como resposta é entulho e
palavrão. Vai pagando o preço da
imagem que ela mesma ajudou a
construir: superficial, destempera-
da, falastrona, inconsistente, pega-
dora, bissexual, surfista da fama da
familia com uso abusivo da imuni-
dade de ser filhinha de papai.
Mas Preta é mais ela. Quando de
seu primeiro CD, "Prêt-à-Porter"
(2003), fez para o encarte fotos sem
roupa, peitos a mostra. Na entrevis-
ta de lançamento, não quiseram nem
saber das músicas: só se fazia per-
gunta sobre a reação de seu pai, en-
tão ministro da Cultura. "Não posso
acreditar que, por ser gordinha e ter
assumido minha bissexualidade, eu
tenha de ter essa patrulha pesada
em cima de mim. Quiseram me trans
formar na Neusinha Brizola do go-
verno Lula", diz.
O fato é que Preta faz a festa dos
mexeriqueiros, indo à praia de biqui-
ni cu respondendo a tudo que o per-
guntador quiser ouvir: Já falei de-
mais em entrevistas minhas decla
rações ficaram maiores do que eu.
Mas eu sou exibida, gosto de dar en-
trevistas. A gente fala e repensa a
vida. Por isso eu digo: 'não faço te-
rapia, dou entrevistas"
Tudo isso é dela mesmo, Preta
não renegao que diz o ônus,porém
é a dificuldade de provar que é mais
do que uma capa, um rótulo, um es-
tereótipo. Lá dentro, há, sim, uma
alma autêntica de artista, uma can-
tora verdadeira -alguém acredita?
Poucos se dispõem a acreditar, ela
sabe-e sofrenão é fácil ser Preta
Para fazer esta reportagem,
Serafina passou quatro dias acom-
panhando Preta Gil em casa, no es
tudio fotográfico, na rua, num teste
de roupa, no palco. No primeiro dia,
ela estava em casa (um apartamen-
to classe média em São Conrado, no
Rio). Era uma segunda-feira e ela
voltava da praia, onde passara o dia
com amigos. Estava exultante, co-
mo se tivesse se libertado de um de
mônio. Há muito tempo não ia à
praia, substituindo esse hábito por
anêmicos (e anônimos) banhos na
piscina do condominio. "Fui criada
na beira do mar Nasci no Rio, fui pa
ra Salvador com um ano e ali vivi
até os seis, quando meus pais se se-
pararam e vim morar com minha
mãe no meio do 'bafo de Ipanema,
Chegava da escola e ia pro mar. Pois
hoje completei um ano, sete meses
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