JORNAL DO BRASIL
GILBERTO GIL
Porque eu quero,
O amor flui nas asas
Do meu bolero.
O MAL-ESTAR DO MCMUNDO
Explodiu em Seattle um profundo mal-estar ambiental, so-
cial e cultural com o novo e supostamente maravilhoso Mc-
Mundo. O encontro da Organização Mundial do Comércio re-
velou uma frustração cada vez maior com o reinado absoluto
do mercado. Mais e mais pessoas preocupam-se, de um lado,
com a perda de controle dos estados nacionais sobre os fluxos
de capital e as ondas econômicas; e, de outro, das pessoas so-
bre as suas vidas.
A comida, o trabalho, o lazer e os sonhos escorrem co-
mo água de lavar o rosto, que mão nenhuma consegue se-
gurar por muito tempo. A cidadania reduz-se ao consumo;
o público cede posto ao privado. Despossuídos do próprio
destino e das referências e tradições culturais, somos go-
vernados por necessidades e ânsias impingidas pela frené-
tica oferta de bens cintilantes. A privação nos desespera,
mas a posse nos aborrece.
Os estados nacionais tornam-se impotentes para regular as
suas economias e as condições de vida de suas sociedades.
Aumentam os abismos sociais nos países e entre os países.
Trilhões de dólares cruzam diariamente, de modo virtual e
caótico, as fronteiras físicas, buscando sempre a aplicação
mais lucrativa. É um dinheiro anônimo e volúvel: pode ser de
George Soros, pode ser dos operários de Detroit.
Fundos de pensão bilionários, geridos por obscuros aplica-
dores-digitadores que jamais terão os quinze minutos de gló-
ria prescritos por Andy Warhol, a não ser nos eventuais casos
de graves desfalques, movem fortunas de um lado a outro do
globo terrestre. Ataques especulativos, apostas em futuros... O
dinheiro vira patrão de sua reprodução e acumulação. O rabo
balança o cachorro. O virtual substitui o real.
B
cademob@jb.com.br
Neste cenário, parece inútil sonhar com a volta ao projeto de
um desenvolvimento nacional em separado. Ou apenas lamen-
tar. A globalização é um dado definitivo. Beco sem saída? A
resposta à crise não deve ser a do nacionalismo estreito, mas a
da globalização da solidariedade, da articulação geral, horizon-
tal e transversal das tribos humanas, em novas formas de regu-
lação e de governo, agora obrigatoriamente internacionais.
A busca dos encontros em rede e das geléias gerais, para fa-
zer frente à virtualidade zura e à acumulação sem alma nem
família, conforme enunciaram os mais de 50 mil representan-
tes de ONGs e associações civis em Seattle, pode ser uma se-
nha. A humanidade tem a chance de reinventar-se a cada mo-
mento na arte, na cultura, na ecologia e na solidariedade. Glo-
balizaram a usura? Vamos globali-
zar o coração.
Parabolicamente, camara.
MOTOSSERRA: A pressão dos
ambientalistas levou a um adia-
mento da votação, no Congresso,
do Projeto de Lei de Conversão 77-
99, relativo à Medida Provisória
1.885-42, proposto pela Casa Civil
da Presidência da República e
apoiado pela Confederação Nacio-
nal da Agricultura, que prevé a
anistia das multas por desmata-
mento, a redução das áreas de flo-
resta que os proprietários rurais
são obrigados a preservar e outras
revisões absurdas do Código Flo-
restal. O rolo compressor da ban-
cada ruralista não avançou.
CENTRO-BARRA: A Alternativa Carioca promove no pró-
ximo domingo, às 10h, um passeio de catamarā, previsto para
durar cerca de 40 minutos, entre a Praça XV e o Quebra-Mar,
no Rio, com o objetivo de demonstrar a viabilidade da ligação
hidroviária entre o Centro e a Barra da Tijuca. Será usado um
dos catamarās que levam passageiros do Rio a Niterói e vice-
versa. No exterior, porém, existe um modelo ainda mais apro-
priado ao trajeto proposto, em mar aberto, com estabilização
eletrônica. Segundo o projeto, um terminal seria construído no
Quebra-Mar e uma rede de vans faria a conexão com os con-
domínios e pontos de ônibus. A concessão já existe, há empre-
sários interessados e tudo depende da disposição do poder pú-
blico de estabelecer uma parceria.
MAROLAS
- A Suécia dá passos decididos para sair do nuclear. Foi desati-
vada a usina Barsebak 1, a primeira das 12 a serem fechadas em
virtude de um referendo popular realizado no início dos anos 80.
TERÇA-FEIRA, 7 DE DEZEMBRO DE 1999
. Os trechos de mão única da ciclovia Mané Garrincha, no in-
terior do Túnel Novo, no Rio, são vetados a pedestres, que têm
uma passagem própria do outro lado. Embora as placas de ad-
vertência sejam bem visíveis, a transgressão é freqüente. Os
guardas municipais e os seguranças do Shopping Rio Sul (que
adotou a área) são omissos. Acidentes à vista.
A Prefeitura do Rio continua permitindo os pregões. No úl-
timo domingo, o Voyage de placa LHE 4743 perturbava os
moradores do Flamengo com mensagens comerciais. E aí?
. A Agenda 21 virou moda. Fala-se muito e faz-se pouco.
Como se vê no recém-lançado Pequeno guia da agenda 211
local (Hipocampo), de Patricia Kranz, é preciso incluir
nos orçamentos de prefeituras e estados uma verba a ser
gasta de forma participativa, ou
seja, com a sociedade decidindo
o que fazer com ela. Sem isso, é
só para inglês ver.
- O que acontece com o realoca-
mento das famílias que moram
em área de risco na favela Tava--
res Bastos, em Laranjeiras, no
Rio? A prefeitura iria agir em se-
tembro, mas nada foi feito.
Já o conserto do emissário sub-
marino de Ipanema (também agen-
dado para setembro) começou, fi-
nalmente, na semana passada.
. Os moradores do Leblon, no
Rio, não querem a construção de
um shopping center na sede do
Flamengo, em terreno público ce-
dido ao clube.
.A ONG Cidade Inteligente pro-
move no dia 14/12, às 10h, na Uerj, no Rio, o seminário De-
mocracia Digital, com Mike Featherstone.
NAVEGAR É PRECISO
- Rets - a revista do terceiro setor: www.rits.org.br/rets
. Campanha contra as mudanças no Código Florestal
http://www.socioambiental.org/noticias/brasil/campanha.htm/
LER TAMBÉM
0 circo, de Clarice Abdalla. Lançamento: hoje, às 20h, na
Timbre (Shopping da Gávea, Rio).
A medida do possível, de Luiz David Castiel. Lançamento:
14/12, às 20h, na Contracapa (Rua Dias Ferreira, Rio).
• Manual de impactos ambientais (Banco do Nordeste), de
Marilza do Carmo Oliveira Dias e equipe.
com Sergio Sá Leitão e Alberto Santos/Fundação OndAzul
e-mail para esta coluna: ondazul@ondazul.org.br
Hide TranscriptShow Transcript