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Documents from Gilberto Gil's Private Archive

Instituto Gilberto Gil

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Brazil

  • Title: Documents from Gilberto Gil's Private Archive
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    rascunho do ato institucional. Mas, apesar de todas as pres- sões, o presidente recolheu-se aos seus aposentos e decidiu deixar a decisão para o dia seguinte. Ao ministro do Exér- cito, Lira Tavares, ele disse: "Hoje, nada, Lira. Amanhã." Alheio às pressões dos colegas de farda, o presidente pas- sou a noite ouvindo música clássica e fazendo palavras cruzadas. Dormiu mal e, logo ao acordar, ouviu do chefe do SNI, general Garrastazu Médici, o seguinte comentá- rio: "O senhor não caiu durante a noite porque é o se- nhor. Outro no seu lugar teria caído." O marechal Costa e Silva sabia muito bem o que tinha de fazer para continuar na Presi- dência. Desde a marcha dos 100 Mil contra a ditadura, no fim de junho, os militares da linha dura cobravam uma ação enérgica. Ga- minha não escondia que seu sonho era o fechamento do Congresso. Finalmente, era chegada a hora. Numa reunião pre- liminar, ás 13 horas, o presidente co- municou suas decisões aos chefes mili tares, "em caráter sigiloso". Às 16 ho- ras, foi examinado por seu médico e uma hora depois deu inicio à reunião do CSN. Com o presidente na cabecei- ra, sentaram-se à mesa 24 autoridades. Costa e Silva fez um pequeno discurso introdutório e retirou-se da sala por 15 minutos para que os conselheiros les- sem a integra do AI-5. Quando voltou, deu a palavra ao vice-presidente da Re- pública, Pedro Aleixo, político liberal da UDN mineira. Aleixo defendeu um remédio constitucional o estado de Sítio e atacou o conteúdo autoritário do Al-5. "Estaremos instituindo um pro- cesso equivalente a uma própria dita- dura", advertiu. Mas ficou por ai. "Em nenhum momento ele disse diretamen- te que condenava a promulgação do Ato", afirma o jornalista Elio Gaspari, no livro A ditadura envergonhada, pri- meiro dos quatro volumes que escreveu sobre o regime militar. Todos os outros presentes deram apoio ostensivo à medida de força. O jovem e ambicioso ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto, achou pouco e pediu mais poderes para legislar sobre matéria econômica e tributá- ria: "Estou plenamente de acordo com a proposição que está sendo analisada no Conselho. E se Vossa Excelência me permitisse, direi mesmo que creio que ela não é suficiente. Porém, a frase que entrou para os anais como exemplo de oportunismo e vassalagem foi da lavra do ministro do Traba- lho, Jarbas Passarinho, coronel da reserva que surgira na política do Pará em 1964: "As favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência." Sem escrúpulos em relação à ditadura, o Al-5 foi aprova- ISTOÉ/1987 28/11/2007 do por unanimidade, à exceção de Pedro Aleixo. "Quando as portas da sala se abriram, era noite. Duraria dez anos e dezoi- to dias”, resumiu Gaspari, ao narrar a malfadada reunião. Tanto ele quanto Zuenir Ventura, autor de 1968, o ano que não terminou, com base nos depoimentos que colheram, con- cluíram que o episódio que envolveu Márcio Moreira Alves foi mero pretexto para a linha dura. "O discurso do Marcito não teve importância nenhuma. O que se preparava era uma ditadura mesmo. Tudo era feito para levar àquilo", afirmou Delfim Netto a Gaspari, em meados dos anos 80. Marcito pediu a palavra no pinga-fogo da Câmara, no dia 2 de setem- bro, para criticar a invasão da Universidade de Brasilia por PMs e agentes do Dops em 29 de agosto. Ele acabara de assistir em São Paulo à peça Lisistrata, do grego Aristófanes, na qual a personagem principal incita as mulheres de Atenas a não se deitarem com seus maridos enquanto eles não puses- sem fim à guerra contra Esparta. Inspirado no texto clássico, o deputado sugeriu uma greve femini- na contra os militares durante as come- morações da Semana da Pátria. E per- guntou: "Até quando o Exército vai ser valhacouto de torturadores?" No dia se- guinte, só a Folha de S.Paulo publicou um pequeno registro num pé de página. A linha dura, entretanto, não perdeu tempo. Em poucas horas, foram distri- buídas nos quartéis dezenas de cópias do texto. Nas palavras de Heráclito Sa- les, assessor de imprensa de Costa e Silva: "Foi como uma chuva sobre o Palácio. Uma chuva torrencial de tele- gramas de todas as guarnições milita- res, exigindo punição para o autor do discurso. Uma coisa organizada." 7 CARTA MARCADA O fechamento do Congresso era planejado havia meses Poucos dias depois, o ministro do Exército, Lira Tavares, enviou oficio ao presidente Costa e Silva, dizendo- se "confiante nas providências que Vossa Excelência julga devam ser ado- tadas". Lira Tavares não chegou a pe- dir que Márcio Moreira Alves fosse processado. O processo saiu da cabeça do general Jayme Portella, que não ces- sou de alimentar a crise e de fomentar a indignação da tropa. Emparedado pelos ministros militares, Costa e Silva mandou que Gama e Silva estudasse uma fórmula jurídica para punir o parlamentar. Gaminha não pensou duas vezes: cabia ao governo pedir à Câmara licença para processar o deputado. Mas a Câmara sempre negara licença nas tentati- vas de processo por opinião e votos no exercício do manda- to parlamentar. O Palácio, porém, não deu ouvidos ao presi- dente do partido governista, senador Daniel Krieger, que sugeriu a suspensão do colega. Gaminha se mexeu para assegurar a vitória na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O governo substituiu nove membros da CCJ para garantir a aprovação, mas teve de engolir a renúncia do
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