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Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil
Brasil

  • Título: Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil
  • Transcrição:
    A cultura, como o meio ambiente, já foi encarada como um custo ao desenvolvimento . Vista de outra maneira, torna-se um manancial de recursos positivos. Trata-se do que o próprio Banco Mundial denominou win-win, ou seja, 'oportunidades duplamente vencedoras'. A produção de um conhecimento abrangente, complexo, capaz de lidar com a multiplicidade, a fragmentação e as incongruências do real, pode ser a chave para o duplo win, na gestação de um projeto democrático e plural de Nação, que incorpore tanto o planejamento tradicio- nal quanto a gestão das demandas, o imponderável, as surpre sas, aquilo que Cartola chamaria de 'as voltas que a vida dá', muitas vezes intangíveis e implanejáveis, mas inexoráveis. Este nosso diálogo de hoje pode desdobrar-se não apenas em estu- dos e reflexões, mas também no desenvolvimento de novas tecnologias e ações culturais que acionem uma espécie de revolução cultural digital. Não aquela de Mao Tse Tung, que reeducava o literato para lavrar a terra, mas uma que desperte no lavrador e no literato o seu potencial criativo e imaginativo, ainda que para lavrar a terra, ou para falar dela, e de si, para os que se dispuserem a ouvir. As novas tecnologias potencializam o movimento básico cultura e o seu impacto sobre o desenvolvimento. Nosso desafio não é mais dar o peixe, nem ensinar a pescar, mas maximizar as pescas que se fazem nas periferias e nos centros do País. Desde o início do governo estamos lidando com as imensas possibilidades e potencialidades da cultura brasileira, medin- do a realidade a partir dos sonhos, dos desejos e dos projetos de quem sabe que o Brasil e o povo brasileiro podem e mere cem muito mais. Também estamos lidando com as impossibi- lidades, tentando driblar os obstáculos, superar as atrofias, alargar o horizonte do possível. Mas incorporamos definitiva- mente esta noção do papel estratégico da cultura para o de senvolvimento do Brasil. Este conceito de que a cultura consti- tui uma economia dinâmica, poderosa, inclusiva, o que exige atenção e ação. Pensando em tudo o que fizemos e em tudo o que podemos fazer, estou convencido de que a cultura brasileira é o princi- pal ativo deste país. Estou convencido também de que o po- der público, nas três esferas, precisa acordar para o potencial a que me referi. O que falta não é talento, não é qualidade, não é vontade, não é capacidade produção, de preservação e de difusão de bens e serviços culturais. O que falta é política pública de cultura de verdade!!! Estamos falando daquilo de que somos feitos enquanto indiví- duos, enquanto grupos sociais, enquanto sociedade; do que nos é mais essencial, básico e profundo; do que nos identifica, nos impulsiona e nos potencializa; daquilo, enfim, que nos faz brasileiros, para além da carne e dos ossos, ou seja, para além do que é natureza. Esta essência, que se apresenta de um modo plural, é a cultura. O recente Relatório de Desenvolvimento Humano - 2004 da Organização das Nações Unidas (ONU) destaca o papel es- tratégico da cultura na atuação dos governos. Também in- corpora o acesso à cultura como indicador para avaliar a qualidade de vida e o desenvolvimento. O IDH (índice de desenvolvimento humano), a partir de agora, põe a cultura ao lado da educação, da saúde e de outras questões vitais. A cultura, portanto, não apenas é assumida pela ONU como tarefa de governo, mas como uma tarefa prioritária, capaz de definir o grau de desenvolvimento de um país e de uma sociedade. E não se trata exatamente da diversidade cultural ou da in- tensidade da produção cultural, do talento dos artistas, dos gestores, mas do grau de acesso da população à produção e à fruição da diversidade e da intensidade. É aí que entram as políticas públicas. É aí que a cultura se torna um dos direitos fundamentais do homem. É aí que os governos têm um papel que o mercado não substitui, até porque se trata de ajudar a desenvolver o próprio mercado cultural. A cultura é, portanto, um componente vital da cidadania e um componente vital do que chamamos desenvolvimento. Para que ela cumpra o seu papel nessas duas áreas, é fundamental que o governo crie um ambiente favorável à sua multiplicação, à sua afirmação, à sua viabilização. Quem faz cultura é a soci- edade, não é o Estado. Mas ao Estado cabe amplificar as pos- sibilidades da produção cultural e multiplicar os canais de difu- são e as oportunidades de acesso. A cultura também é um dos pontos centrais no que podemos chamar de projeto nacional”, ou seja, do País que temos e do país que queremos construir. Na globalização de hoje, os países em desenvolvimento têm a possibilidade real de uma inser- ção soberana a partir de estratégias consistentes de cresci- mento sustentável, inclusão social e desenvolvimento cultu- ral, incorporando as novas tecnologias da era do conhecimen- to, da informação, que também é a era da cultura. No Brasil, a cultura movimenta muito mais do que 1% do PIB (produto interno bruto). Apenas na cidade do Rio de Janeiro, para dar um exemplo, as atividades culturais são responsá- veis por 7% do PIB, empregam diretamente 600 mil pessoas e geram nada menos do que 2 bilhões de reais apenas em impostos municipais. Um trabalho recente feito pela Uni- versidade Federal do Rio Grande do Sul mostra que cada 1 real investido pelo poder público em cinema gera mais três reais para a economia local. Cultura, portanto, também é economia, e nesta economia da cultura, nós, brasileiros, temos muito a oferecer e a conquistar. Como diria Câmara Cascudo, em frase resgatada recentemente por uma panha: 'o melhor do Brasil é o brasileiro; e o melhor do bra- sileiro é a sua cultura.' Temos de fato uma cultura rica, intensa, plural, que é reco- nhecida no mundo inteiro. Curiosamente, nunca tivemos, à exceção de um ou de outro momento, uma política pública de cultura, uma ação de governo, à altura da excelência da nossa produção cultural e do talento dos nossos criadores. Há, portanto, um potencial imenso a realizar. E uma dívida social histórica a resgatar. O investimento nesta área é um investimento no desenvolvimento do País, com impactos objetivos e subjetivos sobre a vitalidade da economia e da sociedade brasileira. Cultura gera auto-estima e renda. Cul- tura faz um País. E um povo!!! Historicamente, porém, os governos têm se omitido do seu
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