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Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil

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Brasil

  • Título: Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil
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    ARQUIVO PESSOAL realizar o nológicas que servem para sonho da filosofia iluminista". inter de- Além de e participar de grupos nacionais de fotografia, Vinícius senhava muito bem (seus traços e co- lagens remetem a Stanley Donwood, aptidão musical impressionante. Na teoria, demonstrava conhecimento e senso crítico em análises profundas sobre a música pop, sempre escritas em inglês e disponibilizadas na inter- net. Com 13 anos, fez uma compilação em CD, que enviou para amigos virtu- ais mundo afora, selecionando os artis- tas que julgava mais importantes para a história evolutiva do rock: Beatles ("A banda"), Mutantes ("a mais inovado- ra do Brasil"), David Bowie ("antena britânica”), Bob Dylan ("pioneiro"), Clash ("o grupo punk definitivo"), R.E.M. (baliza pós-punk que apre- senta o guitar pop como alternativa ao rock"), Smiths ("demarcaram o fim da new wave e o começo do guitar VIDA DE ARTISTA AOS 4 anos, Vinicius já sabia tocar bateria. (Ao lado) uma amostra das habilidades do adolescente como desenhista Yoñlu Vinícius, o parceiro de programas adolescentes, que ela mais se ressen- te. "Sempre tive dificuldade de entrar nessa empolgação do CD", afirma Ana, referindo de Luiz Mar- o-se ao empenho perpetuar a arte de Yonlu. ques em "Passei a encarar a morte de uma ma- nalan neira gulhei no trabalho para tentar seguir adiante. Ou tu engata na vida, e vive mesmo com uma dor destas, mergu- lha em alguma coisa [longo silêncio). Tudo termina em nada. Aprendi que tem que pegar leve. Porque, olha (sus- piro profundo], de uma manhã para uma tarde, tudo muda. A vida escorre pelo dedo. Pega a leve." "É diferente a maneira como um ho- mem se relaciona com o luto em rela- ção à mulher”, teoriza Luiz Marques, “Para o pai, acabou a transcendência", declara, enquanto prepara um revi- gorante café para dar seqüência à en- trevista, logo depois de ter me levado para conhecer o quarto e o estúdio Ele era sério, até demais, e costumava se aprofundar em tudo antes de tomar qualquer atitude. Desde cedo, eu percebia que a antena sensível do Vinícius para o mundo também era a fragilidade dele pelo pôr-do-sol / se quer saber a mi- nha opinião, é bem triste / acho que não vou estar / presente para ver o seu rosto". rock”), Jeff Buckley ("o mais impor- tante letrista americano"), Blur ("jun- to com o Oasis, sólido parâmetro do brit pop"), Super Furry Animals (primeira banda pós-alternativa") e Radiohead (“para fechar com chave de ouro o ciclo iluminado"). do filho - mais tarde, ele me enviou um e-mail confessando que sentiu demais o "peso de revirar os CDs e mexer nos livros de Vinícius". lançou o disco. "Fiquei imaginando como, em tão pouco tempo, ele captou a magia da música popular de forma a desenvolver algo tão bacana", ques- tiona Bello. "Adorei a maneira como ele usa os tempos, as melodias e as harmonias, e também as letras que escrevia”, analisa Arthur de Faria, que e também é jornalista. al Na prática, Vinícius registrou cen- tenas de canções movidas a a teclado, guitarra, violão e o e efeitos no quarto que transformou em estúdio. O disco pós- tumo, embora seja apenas um esboço de seu potencial, revela conexão com o pós-rock, vocação para o experi- mentalismo eletrônico, noções de rock industrial e capacidade de criar delicadas melodias melancólicas, algo entre Badly Drawn Boy, Radiohead, Tortoise e Nick Drake. Mesmo destruído depois da perda, Luiz percebeu que tinha uma possi- bilidade de satisfazer sua necessidade masculina da transcendência fazendo algo que, acredita, deixaria seu filho, finalmente, feliz: dedicou-se a divul- gar a obra musical dele. A tarefa foi impulsionada por uma iniciativa do próprio Vinicius, que se revelou de- pois de sua morte. NA MARIA GAGEIRO, QUE estudou violão e tem boas noções musicais, sempre foi uma grande incentiva Entre o lirismo poético e um salutar dora da vocação do filho, nonsense, as letras, escritas em inglês, não por acaso batizado em homenagem ajudam a desvendar quem era Vinícius. a um dos mais importantes letristas da Assuntos como depressão, inadequa- bossa nova. "Casualmente, o último fil- ção e suicidio estão espalhados entre as me que ele assistiu foi o documentário faixas selecionadas para o disco “Katie sobre o Vinícius de Moraes”, lembra Até o fatídico 26 de julho de 2006, Don't Be Depressed", uma pérola mu- mãe, que apresentou ao garoto bandas Luiz não conhecia nenhuma música, sical com guitarras quentes e letra po- como Queen er e passou a gostar de artis- muito menos sabia da rede de interlo lar, é sombria: "Katie não fique depri- tas como R.E.M. e Los Hermanos por cução do filho. Antes de se trancar no mida / é sério, quero dizer, que porra causa dele. “De vez em quando, sentá banheiro para abandonar a vida, Viní- Os artistas gringos, porém, não tran- ?/um pensamento se lança pela vamos para tocar e cantar, e ele e me pe- cius seguiu uma orientação do te fórum sitavam com exclusividade na órbita e sobre de influências garoto contaminado berrar / apesar de uma mão o segurar que estava com algumas das músicas virtual de suicídio que frequentava há do pela consciência universal propiciada apesar de ser jogado no chão": "Humi pela internet. Nada colonizado, ele liation”, voz, violão e incapacidade de agregava ao seu som a paixão pela bos- declarar uma paixão, é pungente: "Por sa nova, a atenção às rupturas tropica- que isso sempre acaba em humilhação listas (considerava Gilberto Gil o gran de gênio do movimento) e a influência Eu vou morrer"; a balada triste de de músicos gaúchos como Vitor Ramil , palavras cuidadosamente mastigadas seu predileto, e Nico Nicolaiewsky. "Suicide Song", escrita um mês antes Foi outro músico local, Arthur de Fa- da data fatal, é assustadora: "Agora ela ria, quem recomendou Yoñlu para San- se foi como todo mundo que conheci dro Bello, do selo goiano Allegro, que / agora o meu suicídio está iluminado e essa? / um / SC cerca de dois meses e redigiu uma carta Apesar de ter sido uma efetiva inter- de despedida - para não incriminar os locutora musical, Ana confessou, an- familiares. Escrita no computador, im- tes mesmo de eu ligar o gravador, que pressa e colocada junto do aviso "Cui- dado - Monóxido de Carbono" afixa- não consegue ouvir o disco de Yonlu da - mais no final entrevista admitiu do na porta, a carta explicava que aqui- que "aquilo i pra mim é um inferno, lo não era uma contingência ou algo né?", referindo-se ao quarto do garo precipitado, pedia que sua vontade to, que o marido preferiu manter arfosse respeitada porque a vida estava rumado, como nos velhos tempos de insuportável, indicava o endereço de convivencia a três. seu blog, agradecia o apoio dos pais e lhes recomendava ouvir música quan- É das brincadeiras cotidianas de ROLLING STONE BRASIL, MARÇO 2008 95
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