8 JORNAL DO BRASIL
GILBERTO GIL
Vida é ida:
Finda, volta ao ponto
De repartida.
O LIXO BATE À PORTA
O Rio de Janeiro produz cerca de 7 mil toneladas de lixo
por dia.
A grande maioria dos resíduos sólidos vai para Jardim Grama-
cho, em Caxias, onde fica o famoso "aterro de Gramacho", que
na verdade está longe de ser um aterro sanitário. Em quase todo
o país o que se observa não é muito diferente: 76% do lixo brasi-
leiro vai para vazadouros e apenas 23% para aterros sanitários, e
apenas metade dos aterros obedece ao padrão internacional.
Gramacho foi, por mais de duas décadas, um vazadouro a céu
aberto. Um "lixão". As imagens de crianças compartilhando detri-
tos com urubus ainda estão frescas no imaginário dos cariocas. Nos
últimos anos, a Comlurb investiu na drenagem e no tratamento do
líquido tóxico gerado pela decomposição do lixo, o chorume, na
canalização do gás metano, que costuma entrar em combustão es-
pontânea, e na cobertura, com terra, das áreas mais expostas.
Trata-se, porém, de uma meia-sola. Gramacho nunca será
um aterro sanitário apropriado e está a poucos anos de seu
ponto de absoluta saturação, da mesma forma que outro vaza-
douro de lixo do Rio, em Santa Cruz, muito menor em dimen-
são mas igualmente problemático. Polui a Baía da Guanabara
e interfere perigosamente na operação do Aeroporto Interna-
cional Antônio Carlos Jobim, devido à proliferação de urubus.
Em breve, o Rio terá que encontrar nova área para o destino fi-
nal do lixo que produz, em seu próprio território. Dificilmente ou-
tro município aceitará o que foi imposto a Caxias na época do re-
gime militar. Um novo local terá que ser encontrado, com urgên-
cia, provavelmente na Zona Oeste, e fatalmente haverá desgastes.
Será preciso encontrar uma área apropriada, criar uma gi-
gantesca manta impermeável, construir dispositivos de drena-
gem do chorume e de canalização do metano, ter por perto
disponibilidade de saibro ou argila para recobrir, camada a ca-
B
cadernob@jb.com.br
mada, os resíduos e dispor de vias de acesso rodoviário ou fer-
roviário favoráveis.
Há diversos fatores impeditivos: a proximidade de um rio, a
existência de um lençol freático perto da superfície, a vizinhança
imediata de áreas habitadas. Mesmo em áreas apropriadas, sem-
pre haverá algum impacto social e ambiental; as comunidades
próximas jamais receberão com sorrisos a notícia de um aterro
sanitário nas redondezas. Acaba sempre valendo o menos pior.
Mas o xis do problema está em outro ponto: a nossa relação
com a produção de resíduos sólidos. Em outras palavras, a
"cultura de lixo" de nossa sociedade. Não existe um "deus ex
machina" ou uma forma miraculosa de fazer com que o lixo
desapareça. Os incineradores lançam dioxinas cancerígenas na
atmosfera e deixam cinzas altamente tóxicas. Sua operação se
gura, em padrões europeus ou norte-americanos, é muito cara
e na França descobriu-se recentemente
que apenas 6 entre 71 instalações fun-
cionavam dentro do padrão.
Usinas de separação, caras e comple-
xas, como a do Caju, revelaram-se um es-
candaloso desastre. Há outras, de tecno-
logia simples e adaptadas ao nosso clima
e à nossa cultura, que podem realmente
ajudar a diminuir a quantidade de lixo
que vai para os aterros. Mas elas produ-
zemi um adubo que muitas vezes não con-
segue ser escoado. Há novas técnicas de
mineralização. Nada, porém, que possa
ser considerado "a grande solução".
Com tudo isso, fica claro que o
problema precisa ser enfrentado na origem: diminuir a quanti-
dade de lixo que a nossa sociedade produz, mediante uma po-
lítica industrial, comercial, comunitária e doméstica que prati-
que os chamados três erres": reduzir, reaproveitar e reciclar.
Precisamos de leis com restrições a certas embalagens, de pro-
jetos de coleta seletiva, de programas de reciclagem e de bol-
sas de resíduos, sempre em parcerias entre poder público, co-
munidades e iniciativa privada. Também precisamos de uma
política fiscal de taxação das embalagens mais nocivas ou das
que, de tão baratas, não estimulam a coleta.
Precisamos, basicamente, acordar para o lixo. Cada vez
mais ele será um desafio cultural e econômico.
NOSSA PARTE: A Fundação OndAzul apresentou ao Fun-
do Nacional de Meio Ambiente (FNMA), à Petrobrás e ao
Sebrae o projeto Reciclagem e cultura, especialmente adap-
tado às favelas. O projeto piloto está previsto para Vigário
Geral. Combina a coleta comunitária de garrafas PET e de
outros resíduos com atividades de educação ambiental e ani-
mação cultural, em mutirões remunerados. As garrafas são
usadas na confecção de poltronas e colchões, a um custo
50% inferior ao do mercado.
TERÇA-FEIRA, 26 DE OUTUBRO DE 1999
ENERGIA EÓLICA: O vento é uma das formas mais limpas e se-
guras de produção de eletricidade. A cada ano, são instalados 1.500
mw de potência de geração mundo afora. Na Europa, as usinas eó-
licas somavam, em 97, uma potência de 4,7 mil mw, o oquivalente
a quase sete turbinas de Itaipu. O Brasil apenas recentemente co-
meçou a desenvolver projetos nessa área, no Ceará, em Minas Ge-
rais e no Paraná. No conjunto, devem ser produzidos 6,5 milhões
de kw/ano de eletricidade, quantidade suficiente para atender cer-
ca de 4 mil residências. A primeira usina de vento do país opera
desde janeiro em Horizonte, a 350 km de Curitiba.
MAROLAS
.0 conserto do emissário submarino de Ipanema ia começar em se-
tembro. Depois, em outubro. Quando vai ser, afinal? Estamos de olho...
. Multiplicam-se as concessões de postos de gasolina em locais
onde já abundam. Há dias. 14 árvores fo-
ram cortadas nas proximidades da UERJ,
no Rio, para dar lugar a mais um.
Primeiro foi o indefectível carro das "pa-
monhas fresquinhas”, cuja placa é LGI
6256. Agora os "pregões" proliferam no
Rio e em outras capitais, com anúncios dos
mais variados produtos, a qualquer hora do
dia. A atividade é proibida pela
Lei de Pos-
turas Municipais e o volume das caixas de
som ultrapassa o limite de decibéis tolera-
dos pela legislação ambiental.
Muita gente
está reclamando, mas nada acontece.
A luta por melhores salários e contra o
desemprego é muito justa. Mas os carros
de som de certos sindicatos, que andam estourando os tímpa-
nos da população, não ajudam a causa. Ao contrário, irritam e
podem provocar rejeição. Se liguem, companheiros: 85 deci-
béis, no máximo. Tímpanos unidos jamais serão vencidos!
. De amanhã a sábado, o Itaú Cultural de São Paulo (011 238-
1816) exibe o documentário Santo forte, de Eduardo Couti-
nho, sobre as experiências religiosas de moradores da Vila
Parque da Cidade, no Rio.
.0 e-mail da coluna esteve fora do ar na semana
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NAVEGAR E PRECISO
Secretaria Municipal de Meio Ambiente:
www.rio.rj.gov.br/smac
Reflexos (exposição de fotografias): www.ocario-
ca.com.br/reflexos
LER TAMBÉM
. Cidadania e política ambiental, de Celso Bredariol e Liszt
Vieira (Record).
com Sergio Sá Leitão e Alberto Santos/Fundação OndAzul
e-mail para esta coluna: ondazul ondazul.org.br
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