isso adoro a imagem oriental, zen-budista, do
pássaro que vem e pousa nas madeiras que
são levadas pela turbulência do rio cau-
daloso. O rio continua turbulento e ele lá,
pousado no movimento.
Por que você acha que o Rio elege governantes que
não dão conta desses problemas?
Gil: A politica é particularmente complicada. É
difícil explicar por que o Rio elege gover-
nantes tão distantes do que seria o espírito
carioca. Talvez o fato de ter sido a corte, de ter
os hábitos da corte e tudo o que sempre
cercou a corte, como o funcionalismo pú-
blico, explique o comportamento político do
Rio. Talvez uma "síndrome de corte" tenha
impedido que surgisse uma nova cidadania
necessária e indispensável para uma nova
cidade que não é mais a capital do país e sim
a capital de si mesma. Mas ao mesmo tempo o
Rio continua sendo a capital simbólica do país
em muitos níveis. Talvez por isso os partidos
aqui não se consolidem como forças políticas
reais, realmente ligadas a bases sociais ativas e
profundas. Fica um pouco esse arremedo de
política que em outros lugares é menos grave,
é menos nefasto. Os governantes do Rio foram
eleitos. Então não são eles os monstros. Não!
(risos). A monstruosidade não pode ser atri-
buída a essa identificação dos governantes
como os monstros. A monstruosidade não é
deles, a monstruosidade é da cidade. É a
"monstruo-cidade". (risos)
"Nem só de pão
vive o homem,
Salvador seria mais fácil de governar que o Rio?
Gil: Não sei não. Quando eu quis ser prefeito
mas a lógica do
consumismo é
de
que tudo é
pão. É preciso
uma noua
mentalidade.”
de Salvador, tentei pleitear a candidatura do
PMDB. E Miguel Arraes era um dos grandes
líderes do PMDB, na ocasião, e eu fui con-
versar com ele, com Ulysses Guimarães, com
Fernando Henrique Cardoso, com aquele
PMDB daquela época que juntava todas
essas grandes figuras que depois se espa-
lharam por vários partidos. Miguel Arraes me
disse: "Olha, qualquer lugar é difícil, mas na
Bahia você vai se meter numa encrenca
daquelas”. (risos)
Encrenca para você, um baiano histórico? Por quê?
Gil: Não sei, ele achava... Era uma avaliação
Você teria medo de ser candidato nessa cidade? que ele tinha, como pernambucano ali vi-
Gil: Um pouco de medo dá, por causa da zinho. Foi aí que, já que não consegui a
cidade.
candidatura para prefeito, houve uma so-
licitação para que eu me candidatasse a
vereador. Foi bom, mas não era a minha, não
gosto e não tenho perfil para o Legislativo.
27.8.2006 Revista O GLOBO 25
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