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CLIENTE: GILBERTO GIL
as estrofes da velha can-
ção "Nos Bailes da Vi-
mento, Bituca alerta para o fato
de que todo o artista tem de ir
aonde o povo está". Ao come
morar dez edições - efeméride
que em qualquer circunstância
abre espaço para reflexões criti-
casa Mostra de Cinema de
Tiradentes, encerrada último sá-
bado, soube como nenhum outro
evento dedicado à exibição de
filmes brasileiros no Pais seguir
à risca o "conselho" da música.
Nenhum outro festival de ci-
nema no Brasil é tão acessível e
democrática quando assunto é
atingir o público quanto a Mos-
tra criada pela Universo Produ-
ções. A prova disto é que em
suas 10 edições o evento reuniu
350 mil espectadores.
O sucesso do festival mineiro,
portanto, nos leva a uma questão
crucial sobre o atual momento
do cinema brasileiro: por onde
anda o público dos filmes feitos
nesta terra? Explica-se. Há duas
semanas, o Sindicato das Em-
presas Distribuidoras Cinemato-
gráficas do Rio de Janeiro divul-
gou os números gerais do de-
sempenho do mercado exibidor
nacional em 2006. A má notícia:
4,9% de espectadores a menos
nos cinemas no ano passado na
comparação com 2005.
A Os dados tornam-se ainda
mais alarmantes ao se atentar pa-
ra o fato de que em 2006 somen-
te três filmes brasileiros dos
mais de 60 lançados em circui-
to comercial ultrapassaram a
marca de 1 milhão de especta-
dores. A maciça maioria não
chegou a atingir sequer os 100
mil bilhetes, sendo que alguns
VEÍCULO: GAZETA
***
02 A 04.02.2007
SEÇÃO:
DATA:
Onde o
povo está?
10 Mostra de Tiradentes expõe os
descompassos do cinema brasileiro
MERCANTIL-SP
filmes não conseguiram sequer
fazer mil espectadores.
Dados sobre investimentos no
setor audiovisual levantados pe-
lo advogado Fábio de Sá Cesnik,
especialista em leis de incenti-
vo(veja o artigo sobre o assunto
assinado por ele na página ao
lado) dão conta de que o inves-
timento na produção cinemato-
gráfica vem crescendo sistema-
ticamente nos últimos cinco
anos. Logo, estamos vivendo um
momento de mercado aquecido.
Infelizmente, apesar da eufo-
ria de boa parte dos realizadores
e do Ministério da Cultura, ve-
PÁG:
"Noel - Poeta da Vila", de Ricardo van Steen, prêmio do furi popular
consenso surgiu entre criticos e
curadores do evento: a necessi-
dade discutir a estética cinema-
tográfica que vem brotando nas
obras dos últimos anos.
Contudo, enquanto que de
maneira quase unânime boa par-
te desta crítica falava em temas
já tão discutidos como a crise
deflagrada pelo então presidente
Collor no início dos anos 90 e a
pluralidade de temas e diretores
lhos problemas de distribuição e
exibição de filmes brasileiros
verificados por criticos da en-
vergadura de um Paulo Emilio
Sales Gomes há quatro décadas,
continuam os mesmos.
Com o tema "Vitalidade do
Cinema Brasileiro", a Mostra de
Tiradentes reuniu críticos de to-
do o País para discutir a produ-
ção dos últimos 10 anos. Da sé-
rie de debates promovidos, um
surgidos com a reto-
mada, questões es-
senciais para o bom
andamento de cine-
ma nacional conti-
nuaram de fora.
Como em outros
importantes festivais
de cinema existentes
pelo Brasil afora, em
Tiradentes temas es-
pinhentos que envol-
vem o funcionamen-
to do mercado de ci-
nema no Brasil não
tiveram chance de ser
discutidos. Por exem-
plo, representantes
das grandes majors
americanas como a
Warner Bros., Fox e Paramount,
que com seus filmes abocanha-
no ano passado quase
70% do mercado exibidor nacio-
nal, não estiverem presentes no
evento, assinalando que a falta
de diálogo entre produtores e os
principais distribuidores presen-
tes no Pais
continua a mesma.
Sem distribuição e exibição
adequada, como já alertou Paulo
Emilio Sales Gomes em "Cine-
Foto: Leonardo Laravação
Mais de 40 mil pessoas assistiram aos filmes exibidos em nove dias do evento mineiro
ma
Brasileiro: Trajetória no
Subdesenvolvimento", o cinema
brasileiro definitivamente não
tem como ir para frente. Claro
que uma aproximação com ma-
jors americanas, com interesses
tão diversos de nossos realizado-
res não é fácil. Mas um diálogo
com elas e outros distribuidores
de origem nacional são funda-
mentais para que nossos filmes
não façam sucesso apenas em
mostras e festivais.
Iniciativas como a criação da
Programadora Brasil - projeto
que visa a exibição de recentes
produções nacionais e filmes
históricos em circuitos não-co-
merciais, cineclubes, pontos de
cultura, escolas e universidades
públicas e privadas, entre outras
- que deve ser anunciada pelo
nistro Gilberto Gil na segunda
(5) podem ajudar neste processo
evidentemente. Mas não são su-
ficientes para escoar toda a pro-
dução hoje pronta e que não en-
contra telas disponíveis para se-
rem exibidas no País. São mais
uma vez paliativos para uma
questão que continua pendente e
clamando por resposta.
Conquistar o povo continua
sendo o grande desafio do cine-
ma brasileiro, Público interessa-
do filmes brasileiros existe, co-
mo prova o sucesso da Mostra
de Tiradentes, que teve 40 mil
espectadores este ano.
A estética naturalmente brota
numa produção efervescente e
fomentada de maneira razoavel-
mente democrática como a que
existe agora no País. As solu-
ções de mercado, infelizmente
não surgem da mesma maneira.
Os "autores" cinematográficos
brasileiros terão que abrir o dia-
logo entre povo e o mercado se
não quiserem que dezenas de fil-
mes produzidos anualmente
com renúncia de dinheiro públi-
co continuem jazendo sem lan-
çamento e, consequentemente,
longe dos olhos do público. Uma
situação que definitivamente
não interessa a nenhuma das
partes interessadas.
(M.R)
* O jornalista viajou à
convite da organização da
Mostra de Cinema de
Tiradentes