6 Caderno Brasília Personagem
Jornalista Vera Viana faz da alimentação vitalícia sua filosofia de vida
Clientes ilustres e saudáveis
LUCIANA BARBO
REPÓRTER
Enquanto vários políticos
são atraídos pela alta gastro-
nomia oferecida por restau-
rantes badalados de Brasília,
uma porção menor de parla-
mentares, como Fernando
Gabeira (PV/RJ), Luiz Eduar-
do Greenhalgh (PT/SP) e Sig-
maringa Seixas (PT/DF) Cos-
tuma almoçar em um apar-
tamento numa das quadras
da Asa Sul. Já o ministro da
Cultura, Gilberto Gil, manda
alguém buscar sua "quenti-
nha" nos dias em que está na
cidade. A principal
passa longe dos molhos à ba-
se de azeite, manteiga ou
queijo. A decoração conta
com algumas plantas, duas
mesas de seis lugares cada e
um quadro com pensamen-
tos e imagens de personali-
dades como Mahatma Gan-
dhi. O cardápio é baseado na
alimentação hoje chamada
de vitalícia, mas conhecida
por décadas como alimenta-
ção macrobiótica. Misso-shi-
ro, tortinhas, arroz integral,
sopa, legumes cozidos e chás
têm lugar garantido à mesa.
A responsável pela cozi-
nha e todo o resto (compras
e administração) é a jornalis-
ta Vera Viana, que nem gosta
de revelar seu endereço para
não perder a qualidade do
serviço. Por dia, são servidas
cerca de 25 refeições e esse
número vai continuar o
mesmo por muito tempo,
tendo em vista que a cozi-
nheira nem cogita a idéia de
expandir. "Não daria conta,
porque sou
eu que faço toda
comida. Já recusei algumas
propostas para abrir um res-
taurante porque não é meu
objetivo, não faço isso para
ganhar dinheiro. Quero fazer
o meu melhor, dentro desse
espaço", afirma ela.
o
pensamento tem tudo
a ver com a filosofia de vida
seguida por Vera. Um dia-a-
dia simples, sem excessos, e
baseado no autoconheci-
mento. "Precisamos apren-
der a conviver com a dualida-
de das coisas, com o bem e o
mal, por exemplo, e também
DOMINGO, 17 a 23/9/2006, DISTRITO FEDERAL, HOJE EM DIA brasilia@hojeemdia.com.br
Vera se curou com macrobiótica e hoje cozinha em petit comitê. Entre seus clientes, Gil
acreditar que a felicidade está
dentro de nós mesmos. O
conselho básico é faça por
você mesmo o melhor que
você puder diariamente".
Vera Viana atribui à ma-
crobiótica o papel de salva-
dora de sua vida. Numa via-
gem à Argélia na companhia
do então marido (o arquite-
to Walter Hanashiro, que
trabalhava com Oscar Nie-
meyer) a goiana de Jataí pe-
gou uma doença misteriosa,
causada por um vírus. Du-
rante cerca de três anos, ela
sofreu com uma febre alta
diária e uma sucessiva perda
de peso. Nem médicos fran-
ceses conseguiram desco-
brir que mal era aquele e Ve-
ra, com 28 anos, 18 quilos
mais magra e bastante debi-
litada, voltou ao Brasil sem
esperanças de sobreviver.
"Vim para morrer aqui",
lembra.
No Brasil, ela conheceu a
Escola de Auto-Educação Vi-
talícia, dirigida pelo japonês
Tomio Kikuchi, o maior di-
vulgador desse estilo de vida
no país. A partir de uma ali-
mentação baseada em pou-
co tempero, grãos, como o
arroz integral, legumes e raí-
zes, como a bardana, ela re-
cuperou os quilos perdidos
e, principalmente, a saúde.
Também adotou o exercício
físico em sua rotina e apren-
deu a preparar os alimentos.
"Hoje, meus maiores praze-
res são
cozinhar e malhar",
afirma a quase sexagenária,
que tem disposição suficien-
te para levantar às quatro
horas da manhã e correr
quatro quilômetros no Par-
que da Cidade, antes de ir
para a academia de ginásti-
ca. Três vezes por semana, o
percurso é de 10 quilôme-
tros. De acordo com a cozi-
nheira, graças à alimentação
vitalícia e ao exercício físico,
ela nunca mais necessitou
consumir nenhum tipo de
medicamento. Também diz
ter se fortalecido, ajudando
outras pessoas a encontrar o
mesmo caminho. "Quando
você se fortalece, fortalece
também o sentimento e o
coração e quando vê a vida
de uma forma positiva, tudo
vem para você naturalmen-
te", conta ela.
Em 1988, ela deixou o sí-
tio de Kikuchi em Mairiporã,
em São Paulo, e voltou a Bra-
sília. Começou a servir a co-
mida para um e outro políti-
co até que seu apartamento,
na 203 Norte, ganhou fama.
Os então deputados Luiz
Gushiken e Luiz Inácio Lula
da Silva eram freqüentado-
res assíduos. Hoje, além de
parlamentares, Vera recebe
advogados, jornalistas, estu-
dantes, que confraternizam
e trocam experiências ao re-
dor das duas mesas dispos-
e Gabeira (detalhes)
tas na sala por, no mínimo,
uma hora a cada dia (tempo
aconselhável para uma refei-
ção completa). "A integração
entre os clientes é muito
boa", diz Vera.
A macrobiótica ganhou
popularidade nos anos 70
com a difusão das idéias do
japonês George Osawa. Em-
bora a alimentação seja o
vértice mais perceptível,
tendo em vista que parte da
premissa de que o alimento
é remédio, essa filosofia de-
fende ainda um comporta-
mento novo diante de si
mesmo e dos outros, basea-
do principalmente no auto-
conhecimento e em outras
formas de alimentação (da
mente e do espírito). O tam-
bém japonês Tomio Kikuchi
mantém o sítio no interior
de São Paulo e ainda um res-
taurante no bairro da Liber-
dade, na capital paulista,
chamado Satori.