(
CLIPPING SEÇÃO: Caderno 2
SERVICE DATA:
20/09/2008
CLIENTE: Gilberto Gil
VEÍCULO: O Estado de S. Paulo - SP
Na semana passada, Zezé Po-
lessa participava do programa
Happy Hour (GNT), que deba-
tia os traumas de uma separa-
ção. Em sua camisa, lia-se um
paradoxo: "Não sou feliz, mas
tenho marido".
Me intrigou o significado eo
capricho do figurino. Então,
pensei, que excelente recurso!
Da próxima vez que eu partici-
par de um debate, terei no pei-
to pinceladas do pensamento
dialético, para polemizareenri-
quecê-lo.
Foi uma decepção quando,
no fim do programa, revelou-
se que ela divulgava, na verda-
de, um espetáculo teatral que
protagoniza chamado Não Sou
Feliz, Mas Tenho Marido.
Zezé tem o direito de divul-
gar o que quiser, como quiser.
Masinaugura um procedimen-
to que causará um ruído visual
na tevê brasileira. Então, ato-
res, cineastas, músicos e escri-
tores trarão no peito o logotipo
da obra que pretendem divul-
gar, transformando o seu cor-
po num outdoor ambulante,
que anuncia a si próprio, vende
uma obra.
Lembrei-me dos anos 80,
em que condenávamos o culto
à imagem pessoal. Éramos de
corpo e alma concentrados po-
liticamente numa causa, basea-
da no dito de Brecht: pobre do
povo que precisa de heróis.
Herdeira de uma luta arma-
da fracassada, de um projeto de
utopia que deu no stalinismo e
no maoísmo, órfã de ideais, age-
ração 80 não confiava em timo-
neiros ou comandantes, mas na
revolução pelas artee, principal-
mente, pela intervenção cultu-
ral. Por isso, foi
tachada pela ve-
lha esquerda de Geração AI-5
ou Geração Coca-Cola. "A gen-
te somos inútil", foi a resposta.
O movimento punk foi uma
das primeiras expressões do
pós-modernismo que propôs o
fim dos rótulos, das tendên-
cias, da técnica, a desconstru-
ção da música, moda e razão. A
cultura de massa passava a ser
produzida pela massa. Morte
ao glamour, pop star, ídolo. Vi-
va a anarquia, pregavam.
Cada música tinha um deba-
te por trás. Ciúme, do Ultraje,
retratava a decadência do mo-
delo de homem moderno. Nós
Vamos Invadir Sua Praia, o fim
do monopólio da cultura cario-
ca, como espelho do País. Meus
Heróis Morreram de Overdose,
do Cazuza... bem, nem é preci-
so explicar.
Até Gilberto Gil aparecer
maquiado de azul, na teve, pro-
tagonizando um comercial de
uma marca de jeans, cantando
Indigo Blues.
OK, Marcel Duchamp pro-
pôs: toda obra é arte. Abando-
naram o poder de mobilização
PÁG.: D14
DOMINGO, NO CADERNO 2-CULTURA: VERISSIMO, JOÃO UBALDO RIBEIRO E DANIEL PIZA
da cultura de massa, especial-
mente da música. Roubaram a
arte da arte. Veja, Torquato,
no que a Tropicalia se meteu.
Grandes pensadores e artis-
tas não deveriam fazer comer-
ciais de teve, pensávamos, mui-
to menos vender a sua história
e talento para esse gênero me-
nor, corrompido, chamado pu-
blicidade. A poesia não deve es-
tar a serviço do capital.
*
segunda-feira
MATTHEW
SHIRTS
terça-feira
ARNALDO
JABOR
quarta-feira
ROBERTO
DAMATTA
quinta-feira
LUIS
FERNANDO
VERISSIMO
MODS Meme
CIDO GONÇALVES
VENDE-SE
TRATAR COM: EU
Enquanto eu desencorajavaado-
lescentes do ABC que queriam
fazer o meu fã-clube, sugerido
que não combinava comigo, que
acreditava que fă, de fanatismo,
era sintoma de fraqueza, meus
coleg: começaram a vender
suas músicas e imagem para “re-
clames" de teve. Alguns passa-
ram a vender produtos.
Recusei uma proposta de
R$ 150 mil para protagonizar
um comercial de um laborató-
rio farmacêutico, que anuncia-
va umremédio contra impotên-
cia sexual, pois eu não queria
manchar anos de luta para de-
sassociar a imagem de cadei-
rantes da impotência-nem ali-
mentar o preconceito que exis-
te contra a vida sexual de porta-
dores de deficiência
Eu disse não à Rede Globo,
que quis fazer uma minissérie
de Feliz Ano Velho, por nãoque-
rer expor demais uma obra
que virara peça e filme. Disse
não outra vez à mesma emisso
ra, que quis fazer um progra-
ma sobre o meu pai. E, pelo
vis-
to, estou só na trincheira. To-
dos foram à luta.
OIRA! anunciou uma faculda-
de. Arnaldo Antunes, um super-
mercado. Seu Jorge, pinga. Jota
Quest, Fanta! A família de Rena-
to Russo vendeu uma música pa-
ra um banco. O parceiro de Raul
Seixas virou... Paulo Coelho.
Cultura virou chiclete Conse-
guimos transformá-la num sub-
produto do comércio. O consu-
mo virou cultura. Vender é arte.
Um livreiro me disse que, pa-
ra vender livro, eu tinha de ter
um programa deteve. Eu olem-
brei de que tive um programa
de tevé diário, com banda e tu-
do, e larguei a emissora para es
tudar literatura em Stanford.
Quá-qua-quá. Como sou otá-
rio, anacrônico. Não tenho site.
Nem blog. Fiquei meses no
sexta-feira
IGNACIO DE
LOYOLA
BRANDO
C
sábado
MARCELO
RUBENS
PAIVA
Orkut, até uma desconhecida
me dar uma bronca, pois não a
adicioneicomo "amiga",eaban-
donei essa galeria virtual de ex-
cessos e carências.
Não tenho fotolog, nem nada
no MySpace. Nunca postei um
vídeo no YouTube. Eu não exis-
to, caro leitor. Sou um mero es-
critor analógico, idealista, low
profile, que nunca mostrou o seu
larem Caraseeletrificoua cerca
que separa o público do privado.
Podem rir de mim. Acredito
ainda no poder de transforma-
ção da literatura e liturgia da
dramaturgia. Não faço livro sob
encomenda. Nem teatro comer-
cial. Vivo na contracorrente.
Sou a piada da década.
*
Mas isso vai mudar! Começo
logo logo um blog. Elanço um
livro em novembro. Aparece-
rei de camiseta com o seu títu-
lo, A Segunda Vez Que Te Co-
nheci, na Caras, Chiques e Fa-
mosos, Flash!
Quero ser entrevistado pe-
lo Amaury Júnior e pela Lucia
na Gimenez. Quero
ser jurado
do Faustão e dar detalhes de A
Segunda vez que Te Conheci!
Quero tirar o chapéu no Raul
Gil
. Rir com Hebe de A Segun-
da Vez Que Te Conheci. Guar-
dou o nome? Aprendi ameven-
der? Quero chorar com Gugu,
ter 1 milhão de amigos e bem
mais forte poder cantar....
Hide TranscriptShow Transcript