Jorge com um Papai Noel em um shopping em
Orlando, em 2006. O artista tinha ido levar um de
seus cachorros para tomar banho
NÃO SEI, TEM ALGUM PALPITE ?
Ah, fico pensando. A começar pelo tal de jabá. O
grupo de cantores, autores, nunca pode ter uma rádio
própria pra tocar seus trabalhos. Nunca ninguém
foi premiado. Hoje é um lobby pra ter radio...
AQUELA HISTÓRIA DO PLÁGIO DE ROD
STEWART (O CANTOR USOU A MELODIA DE
"TAJ MAHAL" EM SUA “DA YA THINK I'M SEXY?",
DE 1978)? VOCÊ PROCESSOU ELE?
Não, foi a editora que foi atrás. A editora, sem eu
estar acionado nem nada, fez uma aposta com ele.
Uma aposta, não, fizeram um acordo.
(CHEGAMOS AO LOCAL DO SHOW. ACOMPA-
NHAMOS A PASSAGEM DE SOM, MAS A CON-
VERSA SE INTERROMPE AQUI. DEZ DIAS DEPOIS,
JORGE JÁ NÃO ESTÁ TÃO FALANTE, E O PAPO
CONTINUA AO FIM DO CORUJÃO DA POESIA,
AS 3H30 DA MANHA, ENQUANTO A POETA
NATALIA PARREIRAS AJEITA A GRAVATA FLO-
RIDA PARA A SESSÃO DE FOTOS. O REPÓRTER
PÕE UMA MÚSICA NO CELULAR PARA JORGE
OUVIR.) VOCÊ CONHECE ESSA?
[Depois de uns segundos.] Black Eyed Peas.
É, ELES SAMPLEARAM UM PEDAÇÃO DE CINCO
MINUTOS" (1974), EM "POSITIVITY" (1998), E
NÃO TE DERAM CRÉDITO.
[Ele sorri, não fala nada. Penteia os cabelos.] Estão
sem camisinha, estou sem meu boné. (As fotos
são feitas lá fora, embaixo de chuva.]
VOCÊ JÁ VINHA FAZENDO AS MÚSICAS DE A
TABUA DE ESMERALDA NO SHOW?
Não, aquilo foi em São Paulo. A gente tocou
um mês antes em Campinas, e lá tinha um
pessoal com uma placa do disco A tábua de
esmeralda, e outra placa pedindo "Hermes
Trismegisto". Nesse dia fiz, não estava
ensaiado. A banda que está comigo agora está
mais ligada nas músicas recentes. Tem que
ensaiar tudo com eles, senão...
VOCÊ SABE DAR NÓ EM GRAVATA?
Eu? Não. Até hoje não sei. Tenho duas gravatas
floridas, consegui duas, mas não como eu queria,
com as flores todas. Uma delas só tem rosa.
ESSA AI É BOA?
É. [Terminada a sessão, Jorge se despede, mas
convida a reportagem para a próxima escala,
uma padaria do Leblon. Uma comitiva o acom-
panha embaixo de chuva: músicos, o jovem
palhaço Lucas, duas
jovens jornalistas cariocas.
Jorge pede água com gás,café com leite e pão
com manteiga, e se diverte com Mama Giulia,
de 71 anos, sotaque italiano, figura carimbada
nos saraus.] Mama Giulia, una ova, ou due?
[Pede um ovo estrelado]
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VOCÊ NÃO TEM COLESTEROL ALTO?
Não.
DEPOIS DOS SHOWS
RANGO TAMBÉM?
Não, depois de show, não. No camarim tem muita
fruta, queijo e refrigerante, de todo tipo [Jorge não
fuma nem bebe, e não permite bebidas alcoólicas
para ninguém nos camarins).
COSTUMA BATER UM
O QUE SENTIU AO SABER QUE MANO BROWN,
DOS RACIONAIS, BATIZOU OS FILHOS DE JORGE
E DOMÊNICA? (DOMÊNICA É UMA DAS VARIA-
ÇÕES QUE ELE USA EM MÚSICAS PARA FALAR
DA MUSA DOMINGAS; A PARTIR DE UMA DELAS
MANO BROWN FEZ SUA "FIM DE SEMANA NO
PARQUE", DE 1994.)
PÔ, demais, ne? Eu conheci Jorginho e Domenica
num show [em 2004, em Itaquera, zona leste de
São Paulo). Fui saber disso lá, naquele show. Antes
a gente tinha ido ver B.B. King em São Paulo. B.B.
King esteve aqui, e a consulesa americana era amiga
da minha mulher, e falou: "Olha, quero convidar os
artistas brasileiros que estão aqui, o B.B.King vai
se apresentar no consulado". Aí nós fomos, eu, Jair
Rodrigues, todos os artistas que estavam disponíveis
em São Paulo. E Brown era pra ir, mas... ele não sai,
não dá entrevista. Falei: "Não, nós vamos ver B.B.
King no teatro, você vai comigo". E ele foi. E o B.B.
King aquele dia tava inspirado, tocou tudo, embora
tivesse que tocar sentado um tempo. Mas ele tocou,
rapaz... É um dos guitarristas que não têm nada
ensaiado, não ensaia o solo dele, vai procurando
a nota, você sente isso.
IGUAL ALGUÉM QUE A GENTE CONHECE...
[Ri, satisfeito.] Ele vai procurando, vai achando, vai
achando, vai embora, aquela coisa maravilhosa.
EO QUE BROWN FALOU DO SHOW?
Ah, adorou. Ele é fã do Marvin Gaye, tem toda a
coleção. Criou-se aquele mito de que o rap tinha
que ser bandido, agora começou a mudar. No rap
americano, hoje em dia, tá todo mundo chique,
vestindo Giorgio Armani, todo mundo na estica...
A poesia já está mais doce...
ACHA ISSO RUIM?
Não, muito bom, porque estava aquela poesia
gầngster que eles têm muito lá. É poesia doce
no sentido de o cara não botar que vai matar o
outro, o gangsta.
AQUI NÃO TEM TANTO A PARTE DA RIQUEZA,
MAS OS RAPPERS TAMBÉM TEM FALADO MENOS
DE VIOLÊNCIA.
É, tem que sair. (A comilança acaba, Ben Jor se
despede de sua corte improvável e mergulha na
madrugada. Num dos bolsos, leva a gravata florida
presenteada pelo Trip)
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