FOLHA DI S.PAULO
quarta-feira, 9 de abril de 1997 ilustrada 49
MÚSICA Cantor lança ‘Quanta', sua leitura poética sobre ciências e interfaces da ciência com filosofia, religião e arte'
Gilberto Gil faz ponte entre ciência e arte
LUIZ ANTÔNIO RYFF
da Reportagem Local
o "engenheiro musical" Gilberto
Gil constrói uma "ponte" unindo
ciência e arte, modernidade e tra-
dição em seu novo disco, o CD du-
plo "Quanta".
Para o cantor, "Quanta" é seu
disco mais conceitual. "Pelo me-
nos é o que me deu mais trabalho,
levou mais tempo e me deu mais
dúvidas", diz ele, que concedeu
ontem entrevista à Folha. O cantor
mostrará "Quanta" no Palace, a
partir de amanhã e até domingo.
No disco, Gil elabora "uma leitu-
ra poética sobre a ciência e sobre
suas interfaces com a filosofia, reli-
gião e arte", como define.
No disco, ele fala de fractais, In-
ternet, hackers, quarks etc. Ao
mesmo tempo, trata de filosofia
chinesa e candomblé.
O disco almeja criar "pontes en-
tre o campo mágico e o campo da
física", algo que, segundo ele, re-
trata uma aproximação que já
acontece entre a ciência e misticis-
mo, como a ufologia.
No CD, Gil afirma a vocação para
construtor da ponte. "Desde o tro-
picalismo a idéia era essa, pontes
em universos contínuos. Criei esse
hábito. Por isso que eu digo que
sou tropicalista até hoje."
O manifesto de intenções de Gil é
exposto nas duas primeiras músi-
cas do disco, "Quanta", de Gil, e
"Ciência e Arte", de Cartola e Car-
los Cachaça.
"Sei que a arte é irmã da ciência/
Ambas filhas de um Deus fugaz",
canta Gil em "Quanta", dueto
com
Milton Nascimento.
A música "Ciência e Arte" foi
uma das inspirações do disco, "É
um samba-enredo ornamental,
poético e dedicado a louvar as
ciências e os campos do conheci-
mento no Brasil. E a música emble-
ma do disco", diz.
Com 25 músicas, o álbum foi
concebido com uma coluna verte-
bral: "Quanta", "Dança de Shiva",
"Ciência em Si", "Atimo de P6",
"'Pop Wu Wei", "Objeto Sim, Ob-
jeto Não". "Objeto Ainda Menos
Identificado", a 26 faixa, ficou de
fora. Para entrar em próximas
prensagens depende da anuencia
dos autores das citações e dos sam-
plers usados.
As outras músicas, segundo Gil,
orbitam em volta desse eixo abor-
dando conceitos adjacentes. Reli-
gião, por exemplo, está presente
em "Agua Benta
Gil não se preocupa com a possi-
bilidade das músicas que falam de
tecnologia, como "Pela Internet",
ficarem datadas.
"Pelo Telefone' (oficialmente o
primeiro samba gravado), do Don
ga, é datado. Está comemorando
80 anos. Está datadíssimo", ironi-
za. “É por estar falando em quark,
neutrino, internet? Tem coisas que
são datadas. Qual é o problema
com datas?", pergunta.
Gil elaborou "Quanta" seguindo
os conceitos do Yin e Yang (os dois
opostos/complementares da filo
sofia taoísta. O primeiro disco é
mais pulsante, o segundo é mais
tranquilo. No segundo estão con-
centradas as homenagens: "De
Ouro e Marfim", para Tom Jobim,
"Sala do Som", para Milton Nasci-
mento, "Um Abraço no João", pa-
ra João Gilberto, "O Mar e o Lago,
para Mário Lago.
Há outras homenagens. O disco é
dedicado a Cássia Eller, Zeca Pago-
dinho e Chico Science, que recebe
uma homenagem indireta em
"Vendedor de Caranguejo", de
Gordurinha.
"Cheguei a oferecer essa música
para o Chico gravar. Eu dizia para
ele: "Olha aqui o manifesto man-
gue beat. Já tinham feito antes de
você", diz.
colaborou Armando Antenore
Show:Quanta
Artista: Gilberto Gil
Onde::Palace (av.dos Jamaris, 213, Moema,
tel. 011/531-4900)
Quando: Hoje, às 21h30, amanhã e sábado,
às 22h, e domingo à 20h
Quanto: R$ 20 a R$ 50
Adriana Zebrauskas/Folha Imagen
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