O VIRA
Wro Ricardo L
ACERVO. Ney Matogrosso colecionou fitas dos Secos & Molhados
CAOS. Cenas de Arnaldo Baptista iam para o arquivo de Amado Batista
da Record, onde Simonal mantinha pro-
grama semanal, assim como Elis Regina e
Jair Rodrigues, o trio Roberto, Erasmo
Carlos e Wanderléa, Elizeth Cardoso e ou-
tros. Entre elas, há uma encenação inacre-
ditável, na qual o cantor é tratado como
"um negro" e impiedosamente empaste
lado por um grupo de bailarinos brancos.
oposto é o de Ney Matogrosso, para quem
o Canal Brasil prepara o documentário
Olho Nu, sob direção de Joel Pizzini.
"Ney tem um armário cheio de fitas,
quase 500 horas de gravação desde a época
dos Secos & Molhados. Começamos a di-
gitalizar, é fantástico. A vida do cara está
toda lá", surpreende-se Mendonça.
Um terceiro exemplo é Titas - A Vida Até
Parece uma Festa, dirigido por Oscar Ro-
drigues Alves em dupla com Branco Mel-
lo, um dos integrantes da banda de rock
surgida nos anos 1980. Nesse caso, gran-
de parte
do material inédito pertence ao
próprio Mello, que adquiriu uma câmera
caseira em 1986 e documentou mais de
duas décadas da rotina da banda.
incluí-las com maior qualidade no filme,
descobrimos que a maioria dessas ima-
gens não existe mais nas emissoras", ex-
plica Mello. Ficou a cargo de sua esposa,
Angela Figueiredo, a tarefa complexa de
obter autorização de uso de imagem por
parte de cada uma das cerca de 250 figu-
ras que passam pela tela, de Roberto Car-
los e Jorge Ben Jor às chacretes e boletes. Produtores e diretores são unânimes no
Ela conta que foi procurada pela produ- relato sobre as dificuldades no processo de
ção do programa de Gugu Liberato por encontrar registros, pagar direitos auto-
conta de um quadro resgatado no filme, rais e, eventualmente, dispor verbas a te-
em que alguns dos Titãs escalavam uma vês e participantes para que autorizem o
grande teia e "salvavam" uma
uso. "A grande e desalen
donzela de um ator fantasia Caras e difíceis tadora dificuldade reside
na questão de direitos e
riam
exibir a cena, disseram de achar nas
autorizações. São proces-
que existe lá no SBT, mas não
tevês, muitas
sos longos, sofridos e de
está documentada. Se fos-
garantias legais duvido-
sem procurar
, iam passar das imagens sas", afirma Marcelo Cas-
tello Branco, presiden-
estão de graça te da EMI, que lançou
DVDs históricos de Chi-
co Buarque e Elis Regina.
"Incorporei a câmera como se fosse
um instrumento nosso", conta. "Eu cui-
dava do registro, já com a idéia de no fu-
turo fazer um documentário. Não existia
internet, rádio de rock nem tevê de mú-
anos tentando localizar", diz.
A preservação precária é
um entrave enfrentado por
sica, eu e os outros Titās íamos gravando todos. “A sensação é de que no YouTube
e guardando, para usar não sei como."
Nem por isso seu filme prescindiu dos
acervos das emissoras, procurados para
resgatar exibições de rocks como Sonifera
Ilha (1984) e Televisão (1985) em progra-
mas do Chacrinha, Silvio Santos, Bolinha
e outros. Numa cena impagável, Arnaldo
Antunes aparece ao lado de Chacrinha,
com a cabeça “vestida" pelo esqueleto de
um aparelho de tevê, cantando que a tele-
visão me deixou burro, muito burro demais.
“Muitas foram gravadas diretamente
da tevê, com videocassete, por fãs ou pa-
rentes. A mãe do Nando Reis gravava di-
reto. Quando fomos pedir às teves, para
os caras não sabem o tesou-
ro em que estão sentados",
diz Mendonça. Segundo Fontenelle, em
uma emissora na qual não constava ne-
nhum material sobre Arnaldo Baptista
ele foi encontrar, posteriormente, ima-
gens guardadas no arquivo dedicado ao
cantor "brega" Amado Batista.
“É impressionante quanta coisa foi
perdida. As teves apagavam as fitas para
gravar futebol por cima", diz o diretor de
Loki. Os próprios artistas podem ajudar
nesse quesito, ou não. Baptista, por exem-
plo, não guardava praticamente nenhum
registro audiovisual de sua carreira. Caso
"Nos chocou o valor que
se paga por essas imagens", afirma Cal-
vito Leal. "Havia uma discrepância
enorme entre o preço que cada emisso-
ra estipulava, não existe nenhuma regu-
lamentação. Uma das emissoras insti-
tuiu, no meio da negociação, uma taxa
abusiva de 50% sobre o valor, por se tra-
tar de imagens antigas."
A Central Globo de Comunicação res-
ponde por escrito sobre a cessão de ima-
gens: "A emissora comercializa ou for-
nece gratuitamente material do acervo,
de acordo com a destinação, e sempre
CARTACAPITAL 3 DE DEZEMBRO DE 2008 57
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