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Documents from Gilberto Gil's Private Archive

Instituto Gilberto Gil

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Brazil

  • Title: Documents from Gilberto Gil's Private Archive
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    Companhia de Correios e Telégrafos. No dia em que os filhos chegavam e diziam que não queriam estudar mais, que preferiam trabalhar, a decisão era aceita e respeitada. "Cada um fez o que quis e hoje todos são felizes”, diz. Bela lição de uma mãe que veio de origem muito humilde, mas teve aces- so a teatro, música e poesia; estudou em escola particular; aprendeu a falar francês e a tocar piano. Tudo porque foi criada na casa de uma família rica da região. Assim, arte e cultura perme- avam o dia-a-dia da família Velloso. A própria Dona Canô costumava cantar para todos e sempre disse que a músi- ca é a melhor coisa do mundo. Sob tal influência os oito filhos aprenderam a tocar instrumentos. Os dois famosos não são os únicos que seguiram liga- dos à arte: Nicinha também toca piano na igreja e Rodrigo faz tecelagem. Se perguntada sobre sua fama, Dona Cano garante que não entende. "Apenas fiquei conhecida por causa de meus dois filhos que nunca se esquece- ram de onde vieram nem da mãe que têm", diz. "Cumpri o meu dever, soube criar meus filhos, todos são os mesmos da época em que eram crianças”, fala, ressaltando que Nicinha, Clara Maria, Maria Isabel, Rodrigo, Roberto, Caeta- no, Maria Bethânia e Irene não deram trabalho. E conclui que talvez, pelo fato de ter criado bem os filhos, tenha sido recompensada por uma vida tão boa. Reunir a família toda é difícil - Nici- nha e Rodrigo estão sempre por perto; Mabel, Clara e Irene vivem em Salvador e aparecem com freqüência; já Roberto, Bethânia e Caetano moram mais longe, trabalham muito e são mais raros. Isso sem falar nos nove netos e cinco bisne- 01 Edson Ruiz 1 2 e 3 Marcelo Tabach/Contigo! tos. Mas juntar todo mundo, como ein setembro, em seu aniversário de 100 anos, é motivo de muita alegria. Os que vêm de fora se dividem entre os dez quartos da casa e o encontro, regado a muita comida gostosa e bom papo, estende-se noite adentro. O carinho de todos é evidente. "Caetano quando chega logo põe a cabeça no meu colo e todos ainda me pedem a bênção", fala, já sonhando com o próximo encontro. Celebração da vida A fragilidade do corpo miúdo es- conde uma força que, segundo ela, vem da fé. Sinais de sua devoção estão por toda parte. Bem na entrada de seu quarto, há um santuário com grande coleção de imagem de santos. “Nem sei quantos tem, nunca contei”, comenta. Na cabeceira da cama, colares dos san- tos e fitas do Senhor do Bonfim confir- mam o tão falado sincretismo religioso da Bahia. "Sempre tive muita fé. Assisto à missa na TV todos os dias e uma vez por semana vou à igreja", afirma Dona Cano, que gosta de festejar os santos. Na véspera de São João, faz ques- tão da fogueira na porta, da casa toda enfeitada, da mesa farta de comidas típicas - canjica, amendoim, milho co- zido, bolo de fubá - e licores, em espe- cial o de jenipapo, para receber quem quiser entrar e papear um pouco. Ela celebra também São Pedro, faz o ca- ruru de São Cosme e São Damião, a trezena de Santo Antônio, passa Natal e ano-novo na casa de praia em Cabu- çu, a 29 quilômetros de Santo Amaro, e em fevereiro comanda a tradicional lavagem da escadaria da Igreja Nossa Senhora da Purificação. Aliás, por cau- sa dela essa comemoração entrou para o calendário oficial do estado. Tudo é motivo de festa em Santo Amaro e, por extensão, na casa dos Velloso, onde os quitutes são preparados por Isaura, a cozinheira de 40 anos, as ajudantes Fifi e Odília e mais quem se oferecer para dar uma mãozinha. E invariavelmente aparece ajuda para mexer os panelões e caprichar nas iguarias. Coração franco Mesmo tendo sido sempre muito animada, Dona Canô não quis tomar conhecimento de como seria a come- moração do centenário. Do que ela fez questão mesmo foi da missa. O resto foi combinação dos filhos. Veio gente famosa - Gilberto Gil, Regina Casé, só para citar algumas –, mas o povo de Santo Amaro também participou da celebração, é claro. Para eles, foi orga- nizado um brunch em plena praça, em frente à igreja. Pela eterna disposição de receber as pessoas, seja lá quem for, e por tudo o que já fez por Santo Amaro, Dona Cano é adorada nesse pedacinho do Recôncavo Baiano. Da mesma manei- ra que adotou e deu muito amor a duas de suas filhas - Nicinha e Irene -, ela é também a mãezona dos santo-ama- renses. Quando ela passa nas ruas, todo mundo já sabe: Dona Cano está indo fazer o bem. Em seus aniversários nun- ca quer presentes, só comida ou mate- rial de higiene que recolhe para doa- ção. Seu nome batiza um centro oftal- mológico para pobres, um teatro e uma biblioteca na cidade. Segundo ela, está aí a razão de sua longevidade: “Re- cebo e dou muito amor, tenho prazer de viver e paciência, sei que tudo tem seu tempo". E alguém duvida?
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