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Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil

Instituto Gilberto Gil

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Brasil

  • Título: Documentos do Arquivo Pessoal de Gilberto Gil
  • Transcrição:
    ANDAR COM FÉ Nas ruas de Manhattan, em 1971. Gil estreia em Nova York no mesmo palco em que Bob Dylan fez sua primeira apresentação casado a São Paulo com a intenção de se estabelecer como executivo. Ao mesmo tempo aliou-se a Augusto Boal, no espetáculo Arena Canta Bahia, embrenhando- se cada vez mais na carreira artística. Havia em suas escolhas um comprometimento com uma vontade maior da família ou você se enxergava mesmo exercendo o papel de um cidadão comum! Você se sentia dividido nessa fase da juventude? Gilberto Gil - Eu tinha sido muito naturalmente prepara- do pra me encaixar em um modelo de êxito pessoal, que estava ligado a um êxito familiar, também. Um projeto de família de classe média baiana, negra, mestiça, que era alguma coisa bem estabelecida como modelo e como eleição pela sociedade toda. Um jeito consagrado. Tinha sido preparado pra isso, sem muito questionamento. Tudo aquilo era complementação de um conjunto amplo de elementos da educação, da formação. Fui seguindo os passos e, evidentemente, a vida, a minha vida, entrou na questão. Passei a trabalhar com música. Passei a encon- trar pessoas. Encontrei Caetano, Bethânia, Gal: gente de teatro, na Bahia, gente de interesses diversos – por cine- ma, artes e variedades, pela questão existencial. Tudo isso passou a constituir uma outra vida, minha, própria, que, como você pergunta, tudo isto estava em conflito? Esta- belecia um conflito? Eu não percebia como tal. Percebia como partes da minha vida e, de alguma forma, tinha de atender a todas elas. Naturalmente, uma escolha iria sobrepor-se a outra, muito fortemente, depois de minha chegada a São Paulo Brasileiros - Nos dias que precedem sua prisão, um dos mais ferozes críticos do tropicalismo foi o próprio dra- maturgo Augusto Boal, que classificou o movimento de neorromântico, homeopático, inarticulado, tímido, gentil, importado e desprovido de lucidez, chegando à ironia de intitulá-los Conjunto de Havaianos e de classificar um depoimento de Caetano Veloso de cafajeste e reacionário. Você é tido por muitos como um sujeito conciliador. De que maneira interpretou essa postura de Boal? Concor- da que seja, de fato, um conciliador? G.G. - Boal era um teatrólogo e dramaturgo muito enga- jado. Dedicava partes importantes de sua ação, seu traba- lho intelectual e sua capacidade de reflexão a essa coisa do movimento revolucionário. Tinha todo o direito de discordar de qualquer coisa, com quem quer que fosse. Aliás, ele compartilhava este sentimento com muita gente, em relação ao tropicalismo, de que nós éramos alienados, entreguistas, deslumbrados. Tudo isso é maneira de ver e de interpretar. Não concordo com ele com relação à cafa- jestice de Caetano. Não sei se ele entendia as atitudes e os gestos de Caetano como movidos por cafajestice. Brasileiros 77
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