Você concorda que as pessoas enveredam para a
direita com o passar do tempo?
Fernanda: Lula falou aquilo num momento de
descontração, possivelmente baseado na sua
própria experiência.
Você endireitou?
Fernanda: Não, eu acho que continuo torta. Não
sou vivandeira ou triunfalista de nada. Mas é
muito difícil se congelar. Mesmo dentro das
esquerdas, o fenômeno se apresenta a cada
momento com uma face. A reação de uma
esquerda de hoje não é igual à de uma esquerda
dos tempos dos militares, da Intentona de 35.
Existe, sim, uma sensação eterna de se buscar
justiça social. De 1930 para cá, tentou-se e se
conseguiu muito da modernização do Brasil.
Somos sobreviventes de muitas propostas, de
muitos ganhos, e homens também de posições
definidas. O Brasil ainda responde pelos pro-
cessos que foram equacionados nesses 60 anos.
Quais são seus planos para 2007?
Fernanda: Por enquanto, 2007 é resultado de 2006
(ri). O ano de 2006 foi um ano de muito trabalho.
Fui ao Festival de Berlim e ao de Toronto. Fiz duas
viagens para Colômbia, uma viagem para Lon-
dres, dez encontros pela periferia do Rio, e ainda
filmei um bom pedaço de "Belíssima". Fiquei
presa no filme "O amor nos tempos do cólera" até
fim de dezembro, quando acabaram as filma-
gens. Foi um ano tão atarefado, cheio de viagens,
que não pensei em 2007. Mas nunca armei muito
a minha vida. Deixo que a alquimia funcione. E
nunca parei, não vai ser em 2007 que vou parar,
espero. Se der uma relaxada, tudo bem. A
guerreira merece. De 2001 para cá, fiz uns quatro
ou cinco filmes, palestras, oficinas. Tem um
trabalho que é altamente visível como ir para a
televisão e fazer novela. Mas tem um outro
trabalho que não tem a visibilidade de uma mídia
eletrônica. Tive convite do filme do Jorginho
(Jorge Fernando), que é uma comédia rasgada,
mas não pude aceitar. Bom, 2007 está em aberto,
até mesmo para as férias.
Como foi filmar Gabriel García Márquez?
Fernanda: Uma surpresa muito espantosa. Um dia
o diretor do filme, Mike Newell, me telefona e diz
que quer a minha participação. Eu achava
melhor uma atriz colombiana. Essa experiência
de fazer filme lá fora não me inquietava. Mas ele
foi muito incisivo, elogioso ao meu respeito.
Aceitei. A equipe é de primeira, a produção,
corajosa. A cidade de Cartagena é lindíssima. A
história se passa num país sul-americano, o
elenco é de latinos e a direção é de um inglês.
20 Revista O GLOBO 7.1.2007
Foi difícil esse entrosamento?
Fernanda: Não, foi irmanado, bem conduzido
Mike Newell é um homem de extrema elegância,
muito talento, muita vivência com atores. É um
cineasta de qualidade e tem muito humor, não é
frio. Vê as cenas e vai se emocionando, cum-
primenta quando acaba de fazer Entusiasmase.
Como não é um sentimento fácil nele, quando
acontece, é na sua plenitude. Não vem dar
pipoca para a foca que fez o looping fora d'água.
Foi um encontro muito adulto. Éramos quatro
brasileiros (Fernanda e a equipe de fotografia). É
difícil para um outro continente adaptar os sul-
americanos e isso foi muito interessante. O
Primeiro é a cultura,
depois a educação.
Primeiro você se
propõe no seu
querer. Aí está a
condição cultural do
ser humano.”
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