2. SEGUNDO CADERNO
Uma feminista cearense no país de Beauvoir
Regina Casé faz sucesso em Cannes como a Darlene de 'Eu tu eles', que foi aplaudido por cinco minutos
Divulgação/antoem Pereira de
Pedro Butcher
Enviado especial. CANNES, França
ermina a sessão de "Eu
tu eles", o segundo lon-
ga-metragem brasileiro
exibido no Festival de
Cannes, e Regina Casé é ime-
diatamente cercada por deze-
nas senhoras francesas. Algu-
mas pedem autógrafos, mas a
maioria quer cumprimentar a
atriz por ter defendido uma
personagem feminina libertá-
ria, a arretada Darlene Linha-
res, que convive pacificamen-
te com seus três maridos no
sertão do Ceará.
- Eu aqui na terra de Simo-
ne de Beauvoir sendo chama-
da de feminista, que alegria! -
brincou Regina, já a caminho
do almoço que celebrou a pré-
estréia mundial do filme, ofe-
recido pela distribuidora Sony
Pictures Classics
As lágrimas de Andrucha e o
silêncio de Regina
A projeção oficial de "Eu tu
eles", ontem, quase lotou o ci-
nema Claude Debussy (segun-
do maior do Palácio do Festi-
val e sede da mostra Um Certo
Olhar) e terminou com cinco
minutos de aplausos. A platéia
ainda se levantou quando os
holofotes iluminaram Andru-
cha Waddington e Regina Ca-
sé. Sem conter a emoção, An-
drucha chorava sem parar.
- Foram cinco anos de tra-
balho e essa sessão marca o
nascimento oficial da criança
- disse o diretor.
Antes, Andrucha tinha subi-
do ao palco para dedicar a ses-
são à equipe de "Eu tu eles":
- Esse filme foi feito por
pessoas, para as pessoas -
disse, para depois chamar ao
palco Regina Casé e os produ-
O GLOBO
REGINA CASÉ e Luiz Carlos Vasconcellos em cena de "Eu tu eles", que passou ontem em Cannes: Darlene com um de seus três maridos
tores Leonardo Monteiro de
Barros e Flavio Tambellini.
da casa, ou a heroína da vez.
Reparou como eu fico em si-
lêncio no filme? — brincou.
blando, com sabedoria, arma-
dilhas e caminhos fáceis.
Regina Casé estava assistin-
do ao filme praticamente pela
primeira vez
homem. Era a durona, a que
briga, a que diz que não tem
dinheiro, a que corta o orça-
mento... Fazer cinema, nesse
sentido, representou um ali-
vio. Foi como se tivessem me
convidado para dançar.
A origem roteiro de "Eu
tu eles" é uma história veridi-
ca, mas não há qualquer cré-
dito informando que se trata
de uma história real.
- Porque na verdade não é.
Só o ponto de partida é verídi-
CO-diz Andrucha.
A atriz, que não fazia um fil-
me desde 1995 (quando prota-
gonizou o curta "Lá e ca", de
Sandra Kogut) conta que teria
sido incapaz de interpretar
Darlene se, pouco antes, não
tivesse se casado, e na igreja,
com Estevão Ciavatta, diretor
de "Muvuca".
- Antes só tinha visto na te-
linha, e fiquei muito feliz com
o resultado. Queria que a Dar-
lene fosse digna e acho que as
pessoas a entenderam assim.
Não que tenha sido fácil. Foi
um suplicio fazer a Darlene.
Sou forte, falo muito. Era uma
batalha diária resistir às tenta-
ções de que ela virasse a mu-
lher engraçada, ou o homem
Quase toda a comédia que
há em "Eu tu eles" está nas
mãos dos três maridos de Dar-
lene (Lima Duarte, Stênio Gar-
cia e Luiz Carlos Vasconcellos,
um trio impecável). Regina
aparece quase todo o tempo
contida e até dramática. An-
drucha conduz a história dri-
- Foi Estevão quem me en-
sinou a ser "mulherzinha", se é
que você me entende -ri. –
Antes sempre fiz o papel de
Para Regina, o grande méri-
to de Darlene é ser uma mu-
lher comum, como tantas que
entrevistou país afora nos vá-
rios anos de "Programa legal",
"Brasil legal" e "Muvuca".
Quarta-feira, 17 de maio de 2000
FESTIVAL DE NOTAS
• PORNÔ EM CANNES
O diretor dinamarquês
Lars Von Trier, que parti-
cipa do festival com
"Dancer in the dark"
anuncia que, enfim, vai
realizar um velho sonho:
fazer um filme porno
• IMPERIALISMO
Zentropa, a produtora
de Lars Von Trier, vai
abrir um escritório em
Los Angeles. "Queremos
mostrar aos americanos
como fazer filmes à nos-
sa moda. Vamos tentar
ser imperialistas cultu-
rais europeus plantando
uma semente em pleno
coração da besta", expli-
cou o pretensioso sócio
de Von Trier, Peter Aal-
baek Jensen, ao jornal di-
namarquês "Berlingske
tedende".
• DEPP E BINOCHE
Johnny Depp apareceu
no festival mesmo sem
ter nenhum filme em
projeção e aproveitou
para divulgar "Choco-
lat", de Lasse Hallström,
que ele começa a filmar
ainda este mês com Ju-
liette Binoche.
• MALKOVICH DIRETOR
John Malkovich já come-
çou a rodar sua estréia
como cineasta. "The
dancer upstairs" tem no
elenco o ator espanhol
Javier Barden.
GAFE
Uma jornalista america-
na, cheia de boa vonta-
de, abriu a entrevista co-
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