Sendo o mais novo dos pintores de "segunda geração" da arte moderna portuguesa, António Dacosta exprimiu na sua pintura a dualidade de um artista atento à história contemporânea mas, ao mesmo tempo, de um temperamento isolado em virtude da sua condição natural de ilhéu açoriano.
O resultado foi uma pintura onde ressalta a suspensão temporal num cenário de angustiante silêncio e isolamento, como este Episódio com um cão bem o demonstra. Escalonada em três patamares distintos, coincidentes com outras tantas metáforas, esta pintura oferece a imagética surrealis ta da água, avatar natural da insularidade, como elemento primordial e inconsciente ao qual sucede o absurdo do cão quieto que cohabita com uma criatura híbrida, alada e agressiva, para culminar no duelo dos dois espadachins sem rosto que se degladiam numa luta de morte, metáfora da Guerra Mundial que então grassava, numa anti-narrativa insólita que sugere a sobrerealidade da própria História. (Raquel Henriques da Silva)