OS PEQUENOS MUNDOS
As palmeiras que se agitam dentro da caixa são movidas por ventoinhas que, ligadas por um arcaico mas eficaz sistema, captam o vento exterior – convertido em energia eléctrica, reconvertida em energia eólica. À sua escala de brinquedo, a maqueta que é a obra de arte replica o mundo, num vaivém entre realidade e ficção transformado em quase-jogo-infantil.
Os modelos de René Bertholo são dos poucos, muito poucos, exemplos em Portugal de uma arte lúdica. Maravilhosos nos seus dispositivos, parecem produzidos por um Gepeto pop, um engenheiro de insignificâncias que movem um poderoso imaginário.
Membro do grupo KWY, iniciou estes modelos reduzidos (assim lhes chamava) em 1966 partindo de mecânicas aparentemente rudimentares – mas tão pessoais que é hoje particularmente difícil recuperar alguns destes modelos –, que animavam pequenas paisagens, microcosmos idiossincráticos.
A sua pequena poesia mecânica situava-se no cruzamento entre os nouveaux réalistes franceses, que conheceu em Paris (e com quem conviveu) e uma mundividência próxima de Joseph Cornell. Foi neste caminho irredutivelmente pessoal que construiu os vários momentos da sua obra, próxima da literatura e da biografia, sempre orientada por uma compulsão de produção de imagens.
É disso que trata a imaginação.
Delfim Sardo