"Iberê era muito amigo da minha tia Istellita, que tinha alguns trabalhos dele. Lembro-me de um prato de cerâmica, um gato, que era maravilhoso! Fui com ela algumas vezes no ateliê dele quando criança, e depois fui conhecendo seu trabalho em exposições. Em 1991, assisti um Carnaval na Sapucaí, e, quando começou a amanhecer, vi uma combinação de cores impressionante, e pensei no Iberê, talvez pelo aspecto gestual da pintura dele. Havia blocos de cores, fragmentos de cores, e eram as cores dele.
Quando acabou, fui direto para casa e comecei a fazer a canção que veio por ele, mas ainda com a sensação do Carnaval. Roxos, todos, pretos, partes, tudo isso tem a ver com ele - por isso a canção é para ele. Iberê quis retribuir fazendo um retrato meu, e foi quando o vi trabalhando pela primeira vez. Nunca tinha visto aquela urgência: 'cadê o vermelho, cadê o amarelo?...'. Levei um susto enorme, pois ele pintava e, de repente, passava um branco por cima, apagava tudo e pintava de novo. É uma questão de camadas, que a gente não vê, mas que estão ali.
Eu era tímida e foi tudo tão forte que fiquei travada. Ele disse que teve dificuldade de chegar em mim e solucionou a questão pintando um díptico: o corpo, que era eu naquele momento, e a alma, que é sem idade. O retrato da alma tem feições que lembram minha família paterna e minha avó materna. As pessoas dizem que a gente sempre reconhece ancestrais quando ele nos retrata. E isso é lindo! Quanto mais o tempo passa, mais o retrato me representa."
Depoimento de Adriana Cacanhotto em fevereiro de 2020 para a exposição Iberê Camargo – O Fio de Ariadne.
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