Os desenhos realizados por Iberê durante suas idas ao Parque da Redenção, em Porto Alegre, evidenciam fortes preocupações de fixar, por meio deles, o instante fugidio, e de captar o mistério das coisas.
As árvores desgalhadas, surradas pelo vento, com galhos tortos, pelas quais Iberê tinha muito apreço, remetem à paisagem como a metáfora de um estado da alma.
"As contínuas reformas na nossa cidade – a cidade é a nossa casa – nos transformam em forasteiros. O progresso é uma ação de despejo em execução. Por isso, um belo dia, na temida velhice, sentimos a incontida vontade de voltar a nosso pátio, para reaver as nossas coisas que lá deixamos.
Procuramos, nesse retorno, o velho cinamomo que nos fornecia a munição – seus pequenos frutos – para as nossas guerras, a velha laranjeira onde tantas vezes nos encarapitamos, brincando de esconder, e, enfim, as coisas que compunham nossa paisagem. Aí sentimos vontade de abraçá-las, de beijá-las, de chorar e de fazer como os gatos, que alçam a cauda e ratificam a posse. Mas aí percebemos assustados que o gato não tem mais força e que as coisas não estão mais."
CAMARGO, Iberê; MASSI, Augusto (org.). Gaveta dos guardados: Iberê Camargo. São Paulo: Cosac Naify, 2009. p. 103.