“Na arquitetura do suíço Tschumi, a obra de Camargo está perfeitamente valorizada. É um sem-número de cores. Os ocres, os amarelados, os azuis da paleta do pintor brasileiro têm aqui um exuberante desdobramento no espaço. A sã visão do artista espalha-se aí em um alegre turbilhão. Pinceladas, inflexões, cutiladas são como um enxame encantado. À direita, nos marrons e nos tons oliváceos, uma lembrança do fetiche de Camargo: O carretel. Um ardente, um maravilhoso fluxo derrama-se por todos os lados, em direção a nós. Nesse pintor que se renovou constantemente, nesse inquieto sempre em busca de novos meios de expressão, acontece, então, como um sinal de suspensão. Chegamos ao estilo, à maneira de pintar que, durante muito tempo, será a de Iberê Camargo."
COURTHION, Pierre. Nascimento de um artista. In: Iberê Camargo. Rio de Janeiro: FUNARTE/Instituto Nacional de Artes Plásticas/Museu de Arte do Rio Grande do Sul, 1985. p. 66-67.
"[...] Mario Carneiro, ao ver o painel realizado por Iberê para a Organização Mundial de Saúde em Genebra (1966), ponto culminante de sua aproximação ao informal, confessa ter pensado: 'Iberê está perdendo a estrutura da obra...'. Na realidade, existem desenhos preparatórios que testemunham uma preparação cuidadosa desse painel, tanto na direção dos gestos quanto na distribuição das cores. Mas era necessário que toda construção se desmanchasse na execução, deixando emergir pulsões não planejadas. Estrutura, para Iberê, é civilização, cultura; a ela se opõe a matéria enquanto natureza primordial, e o gesto, que também é natureza, no que possui de impulso irrefletido.
Certamente, o painel de Genebra marca um ponto extremo de dissolução da forma. Logo depois voltam a emergir os motivos (carretéis, dados), não mais, porém, como objetos dotados de volume ou contornos, mas quase, por assim dizer, como encrespamentos, rugas da própria matéria pictórica. [...]"
MAMMÍ, Lorenzo. Iberê Camargo: as horas [o tempo como motivo]. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2014. p. 12.
"[...] Partindo do esquema que tinha levado, começou a brincar livremente com as formas, e o resultado final, após sete meses de trabalho, conserva as linhas gerais do projeto realizado no Brasil. Em declarações a Clarice Lispector, Camargo diz que uma expansão, no sentido em que ele utiliza o conceito, é uma liberação. Precisamente, essa pareceu ser a alegoria do painel de Genebra. Formas liberadas ou, melhor, presas, debaixo do emaranhado de gestos que as levaram a sua dissolução: pássaros, carretéis, dados, vórtices. Um grande bouquet floral, como sugere Carneiro, uma obra 'alegre' que evoca a situação de equilíbrio implícita na noção de saúde."
HERRERA, María José. Iberê Camargo: um ensaio visual. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2009. p. 24.
"Ninguém discordaria que as obras de grandes dimensões produzidas pelo artista a partir de 1960 eram um acontecimento inaugural na história da pintura brasileira, pela desenvoltura sóbria dos gestos, pela escala ambiental que reclamavam, fazendo supor o pintor dialogando com o espaço, num intenso vai e vem em face das telas. Além disso, diferentemente da voga tachista que dava o tom no meio artístico brasileiro, eram pinturas que guardavam, sob superfícies de tons sombrios e quentes, um travejamento de camadas e camadas de matéria meticulosamente soldadas entre si (em um cifrado diálogo, talvez, com a pintura construtiva...), o que permite supor a precoce vocação pública dessa obra, como se já se endereçasse aos espaços anônimos das grandes cidades e pressupusesse um observador inexoravelmente à distância."
SALZSTEIN, Sônia (org.). Diálogos com Iberê Camargo. São Paulo: Cosac Naify, 2003. p. 50.