INOVANÇAS - CRIAÇÕES À BRASILEIRA

Em abril de 2017, o Museu do Amanhã inaugurou a exposição temporária Inovanças – Criações à Brasileira. Apresentada pela Finep, Inovanças recebeu 460 mil pessoas que puderam conhecer os diferentes caminhos que levam à inovação: a ancestralidade, a inspiração na natureza, os erros e desvios no processo criativo, a imprevisibilidade, o improviso e a colaboração. A exposição, que agora ganha uma versão digital no Google Arts and Culture, inspirou o público ao mostrar um Brasil que se revela afeito às novidades – às inovanças –, com diálogo entre indivíduos, grupos, empresas e instituições. Um país que pulsa, inventa e planta esperanças para o futuro. As inovações nos envolvem, conectam e atravessam a todo momento. Venha criar conosco sua própria inovança!

Fazer uma exposição sobre inovação no Museu do Amanhã era uma simples questão de tempo. Afinal, se um dos objetivos do Museu é abordar como as escolhas atuais moldarão os próximos 50 anos, o que poderia ser melhor do que exibir iniciativas que já estão dialogando com as possibilidades e desafios do futuro? Para conceber a mostra, foi preciso tentar responder questões nada simples. Era preciso definir o que torna algo inovador, indo além das meras noções de mercado. Reexaminar a ideia de gambiarra e resgatar do clichê o valor de imprevistos e improvisos no processo criativo. Compreender como as diferentes realidades sociais encontradas no Brasil revelam oportunidades para novos inventos. Inovanças - Criações à Brasileira é mais um exemplo de como podemos avançar, num processo constante de questionamentos, troca de ideias, ajustes na rota e soma de esforços. Lembrando sempre que, por trás de cada inovança, há pessoas. Gente com ideias, talentos e desafios. Assim como você.

Na língua tupi-guarani, “pyahu-açu” anuncia uma “novidade grande”. Um conceito que se conecta às potencialidades de inovação com temperos brasileiros que brotam pelo país. Mas, o que é inovação? Uns dirão que é conceber o novo. Outros, que está em aprimorar algum artefato ou processo. Ou que só inova mesmo quem cria um produto com valor econômico. São muitos os possíveis significados, e que refletimos diferentes Brasis. A necessidade urgente ou o senso de oportunidade, quando aliados à criatividade, nos impulsionam a desenvolver ideias e modos de ação que transformam a sociedade e o ambiente. Todos podem criar inovanças. Nos laboratórios das universidades, mas também em grotões remotos, criações vicejam. Estamos cercados de movimentos, transformações, alvoradas. Grandes novidades que podem nos anunciar amanhãs colaborativos e plurais.

A natureza sempre forneceu ao engenho humano modelos valiosos para enfrentarmos diferentes problemas. Estudar os seres naturais e suas atividades inspirou inovadores em todas as sociedades. Contemplar o balé dos pássaros, por exemplo, conduziu os pioneiros do voo a experimentos e avanços cumulativos que deram origem às modernas aeronaves. Não à toa, o 14-bis de Santos-Dumont foi chamado de “ave de rapina” pelos franceses. Hoje, em uma busca perene por aperfeiçoamentos, os pesquisadores unem conceitos de diferentes saberes para promover abordagens inovadoras, inspirando-se nos desenvolvimentos surgidos ao longo de milênios no imenso laboratório dos processos naturais. Sempre que formos desenhar ou construir algo, podemos nos perguntar: como a natureza faria?

Para se perpetuar, os seres vivos têm de se adaptar a mudanças no ambiente. Os organismos são sistemas capazes de repetir sua forma ao se reproduzirem. Essa replicação é administrada por um “manual” em linguagem bioquímica, o genoma, que regula o desenvolvimento de cada organismo e suas interações com outros seres e com o ambiente. Contudo, mutações, alterações casuais do “texto” original, podem ocorrer. Se esses “erros” não impedirem a reprodução, uma nova variedade de organismo surge, com características e capacidades diferentes. O conjunto da Vida realiza assim um perene jogo de adaptações: a Evolução. O “errar” tem aqui um novo sentido, positivo, produtivo. Essas “errâncias” naturais originam o diverso, “infinitas formas de grande beleza”. Ideias inovadoras, surjam em laboratórios ou quintais, costumam se materializar após uma série de tentativas e falhas, de diretrizes e desvios, de intenções e acasos. Todos essenciais para que, ao fim, a inovação possa se instaurar.

A história do Brasil pode ser contada de várias formas. Uma delas é pela inovação. A combinação das culturas africanas, europeias e indígenas criou uma gente original: o brasileiro. Essa mistura, manifestando-se na economia, na política, nos costumes, levou o Brasil a se constituir múltiplo. Nossa identidade é a diversidade. De um lado, uma cultura de pluralidades; de outro, uma sociedade marcada por desigualdades. Por mais que soe paradoxal, o que nos une é o que nos diferencia, e a diferença é nosso traço de união. Essa unidade de disparidades instiga os brasileiros - independentemente da região, classe social, etnia, gênero ou instrução - a inventar, a buscar saídas, a gingar, driblar e passar. A inovar. E a inovação de ser brasileiro só pode ser compreendida se olharmos para os próprios brasileiros e suas histórias de vida. Confira nossa homenagem a inventores do país que continuam nos inspirando!

O imprevisto está intimamente ligado às inovações, e os grandes criadores sabem fazer uso das surpresas que encontram. Ficou famosa a história da penicilina, quando em 1928 o bacteriologista escocês Alexander Fleming, ao invés de simplesmente descartar culturas de bactérias que estavam contaminadas por fungos, se deu conta de que existiam áreas vazias em algumas delas, indicando a ação de uma substância bactericida. Inadvertidamente, nascia uma importante descoberta médica. O imprevisto, o inesperado (“inexspectata”, em latim), está ligado a fatores naturais - como as mudanças no padrão de chuvas no Brasil, que exigem criatividade na busca por adaptações - e também sociais, culturais e econômicos. A ciência e a inovação no Brasil hoje devem responder às novidades que surgem pelo caminho e fazer do imprevisto uma oportunidade.

Podemos sempre improvisar. Viver em casas fincadas em terrenos irregulares ou alagadiços, fazer da rua uma quadra poliesportiva, reaproveitar materiais em novos usos. A inovação pode florescer de improvisos, de situações que nos surpreendem e nos levam a preencher lacunas - do latim “impromptu”. Nas ciências ou nas artes, o improviso - a invenção em tempo real, sem preparação prévia específica, com base em criatividade notável e inspiração instantânea, e muitas vezes amparada por profunda habilidade técnica - pode ser uma resposta ao imprevisto. Surgem soluções eficazes que, em seguida, podem ser ampliadas e aperfeiçoadas por métodos tradicionais.

Grandes personalidades se notabilizaram por buscar essas zonas de inconformismo, esses caminhos não-lineares, do invento. Artista multifacetado, Hermeto Pascoal transforma até microfonia em notas agradáveis; Dercy Gonçalves dominou os palcos com tiradas inusitadas; no futebol, Mané Garrincha foi o expoente de um espetáculo único e arrebatador. A beleza, a surpresa e a eficácia podem surgir do improviso. Conheça alguns dos grandes improvisadores brasileiros, homenageados na exposição Inovanças.

Hoje, num mundo em que a tecnologia conecta todas as pessoas, o “faça você mesmo” virou modelo para os processos criativos. Mas o “fazer em conjunto” (do iorubá “awani jö”, ou “estamos juntos”) mantém-se como plataforma para soluções mais ágeis, amplas e equitativas. Da colaboração entre arquitetos e profissionais do Carnaval à construção de complexos satélites, produtos e processos desenvolvidos coletivamente se mostram eficientes e dinâmicos. A criatividade compartilhada pode mudar significativamente a vida de um grupo, estimular o funcionamento de uma empresa ou apoiar o desenvolvimento do país. Valorizar a construção coletiva do conhecimento impulsiona a sociedade, a cultura e a economia, possibilitando inovanças das quais todos podem se beneficiar.

A produção do catálogo “Manual de Inovanças” aconteceu ao mesmo tempo em que a exposição era elaborada, sendo finalizada nos meses que antecederam a inauguração da mostra. O resultado são 480 páginas com muito conteúdo detalhado de "Inovanças - Criações à Brasileira", além de jogos e brincadeiras que convidam o leitor, de qualquer idade, a botar a mão na massa. No livro, o leitor é convidado a interagir. A publicação foi finalista da 60ª edição do Prêmio Jabuti, em 2018, na categoria Economia Criativa do Eixo Ensaios.