Em julho de 2023, o Museu da Língua Portuguesa inaugurou a exposição temporária Essa Nossa Canção, que oferece um mergulho no universo da palavra cantada no Brasil, mostrando como são profundas as relações que se dão aqui entre a língua e a música.
Em nosso país, as canções atravessam todos os recantos, misturam cultura oral e escrita, tradição e modernidade, raízes e influências, classes sociais e idades. Elas marcam a nossa história e praticamente se confundem com o Brasil e os brasileiros.
Entre outras surpresas, o visitante descobre como, ao longo do tempo, foram criados diferentes recursos tecnológicos para capturar os sons e reproduzi-los, tornando-os acessíveis para todos: de gramofones ao streaming, este é um caminho fascinante que percorremos aqui.
O Violeiro (1899/1899), de Almeida JúniorMuseu da Língua Portuguesa
Música para todos
Até a segunda metade do século XIX, só era possível ouvir música ao vivo: uma orquestra no teatro, uma banda na rua ou alguém cantando e tocando um instrumento em casa.
Quem gostava muito de música sonhava com o dia em que seria possível capturar sons e canções, para poder ouvi-los de novo, sempre que desse vontade. Naquela época, porém, esse dia parecia impossivelmente distante.
Cilindros de cera para fonógrafo (1901/1930), de Edison RecordsMuseu da Língua Portuguesa
A máquina que fala (e canta)
O sonho de gravar e reproduzir os sons tornou-se realidade em 1877, quando o norte-americano Thomas Alva Edison apresentou ao mundo sua nova invenção: o fonógrafo.
O fonógrafo era constituído por um cilindro que, girando, permitia que uma agulha riscasse sua superfície, reproduzindo as ondas sonoras. E ele logo se popularizou pelo mundo...
Um jornal do Rio de Janeiro anunciava, em 1892:
Nesta cidade, na rua do Ouvidor, 135, estará em exibição a máquina que fala, um dos inventos mais estranhos e surpreendentes. Esta máquina não só reproduz a voz humana, senão também toda a classe de sons, como canções, óperas e músicas militares.
O Phonographo (1913/1913), de Ilustrador não identificadoMuseu da Língua Portuguesa
O gramofone rouco toda noite
Em 1893, o alemão Emile Berliner apresentava uma nova máquina falante: o gramofone.
O gramofone trazia uma pequena inovação, que se revelaria uma vantagem comercial em relação ao fonógrafo: em vez de reproduzir os sons em cilindros, ele usava discos de cera.
Os flat discs ou “chapas”, como eram chamados na época, eram mais fáceis de produzir e logo se popularizaram.
No Brasil, a Casa Edison, uma loja que comercializava fonógrafos e gramofones importados, começou a produzir discos em massa a partir de 1904.
A espreguiçadeira, a cama, a gangorra,
o cigarro, o trabalho, a reza,
a goiabada na sobremesa de domingo,
o palito nos dentes contentes,
o gramofone rouco toda noite
Carlos Drummond de Andrade, “Família”, em Alguma Poesia (1930).
Rádio General Electric (1940/1949), de General EletricMuseu da Língua Portuguesa
Cruzando o espaço azul
A primeira transmissão radiofônica aconteceu no Brasil, em 1922. Em poucos anos, o rádio estaria em praticamente todas as casas, transmitindo notícias, anúncios e muita, muita música.
Entre os anos 1930 e o início da década de 1960, as grandes emissoras mantinham orquestras e elencos de cantores exclusivos, que se apresentavam em espetáculos de auditório transmitidos ao vivo para todo o Brasil.
Uma canção famosa, gravada em 1936 por Carmen Miranda e sua irmã, Aurora Miranda, dizia:
Nós somos as cantoras do rádio
Nossas canções cruzando o espaço azul
Vão reunindo num grande abraço
corações de norte a sul
Vitrola portátil Delta (1975), de DeltaMuseu da Língua Portuguesa
Girando na vitrola sem parar
Os discos de vinil, no formato Long Play (LP), surgiram em 1948, substituindo os velhos discos de 78 rotações, que duravam apenas três ou quatro minutos na vitrola.
Já os LPs, girando a uma velocidade de 33 rpm, duravam mais de vinte minutos de cada lado. As novas vitrolas tinham ajustes de velocidade, para poder tocar tanto os velhos como os novos discos.
Vitrola era o nome de um toca-discos (Victrola) produzido pela Victor Talking Machine Company, uma empresa norte-americana. Ficou tão popular que passou a designar o próprio toca-discos.
Os concorrentes bem que tentaram inventar outros nomes, como “eletrofone” ou “grafonola”, mas nenhum pegou. A vitrola se impôs e se instalou em alto volume em nossa língua.
Máquina de espetáculos
A primeira emissora de televisão do Brasil foi inaugurada em 1950. Nos primeiros anos, as apresentações musicais na TV eram uma espécie de “rádio filmado”, com cantores de pé, voltados para microfones típicos das emissoras de rádio. Com o tempo, porém, isso foi mudando.
Nos anos 1960, os famosos festivais de canções, concursos de música popular que eram televisionados, permitiam que as pessoas assistissem aos shows de seus ídolos sem sair de casa. Nos anos 1970, surgiram os primeiros clipes musicais, que se tornariam cada vez mais populares.
Anúncio de aparelho televisão - General Electric (1950/1950), de Não identificadoMuseu da Língua Portuguesa
Em qualquer lugar a qualquer hora
As fitas magnéticas, ou cassetes, reproduzidas em gravadores, surgiram nos anos 1960. Nessa época, os lançamentos musicais, em sua maioria, podiam ser encontrados no formato LP ou em cassete, também conhecido como K7.
Você podia comprar cassetes virgens e gravá-los com as canções de sua escolha, criando fitas únicas e personalizadas.
As fitas K7 eram mais práticas que os discos. Podiam ser ouvidas no gravador do carro ou nos gravadores a pilha carregados para qualquer lugar.
Essa mobilidade explodiu em 1979, quando a Sony lançou o primeiro modelo do Walkman, um minigravador com fones de ouvido. Seu slogan era: Uma nova maneira de apreciar música de alta qualidade em qualquer lugar e a qualquer hora.
Anúncio de Walkman Sony (1979/1979), de DesconhecidoMuseu da Língua Portuguesa
Mil canções em seu bolso
O primeiro compact disc (CD) foi lançado em 1982, juntamente com o primeiro CD player, provocando uma nova revolução musical. Pequenos, mais baratos de produzir e com a promessa de um som mais puro e sem chiados, os CDs logo superaram os discos de vinil.
Mas seu domínio durou pouco. Na década de 1990, a chegada da internet e das canções digitais no formato mp3 atropelaram a indústria fonográfica tradicional. Nas redes de compartilhamento de arquivos, qualquer pessoa podia “baixar” centenas de músicas e “queimar” seus próprios CDs, ou ainda transportar verdadeiras fonotecas em pequenos pen drives.
Nesse cenário imprevisível, um novo tipo de aparelho conquistou o mundo: os tocadores de mp3, como o iPod. Em sua campanha de lançamento, em 2001, o iPod fazia uma promessa simples e irresistível: “1.000 músicas no seu bolso”.
Fones de ouvido Sansui, iPod Apple e Fones de ouvido sem fio (2023/2023), de José MotaMuseu da Língua Portuguesa
Nuvens em movimento
Atualmente, as canções encontram-se principalmente nas nuvens dos aplicativos de streaming, que acessamos pelo celular. Hoje é assim que escutamos música. Mas como será no futuro? Pela variedade de aparelhos que vimos até aqui, será bem diferente daquilo que conhecemos.
Já há notícias, por exemplo, de um fone de ouvido “invisível”, que deve ser lançado nos próximos anos. Esse aparelho será capaz de criar “bolas sonoras” junto aos ouvidos das pessoas, reproduzindo canções com a mesma qualidade dos melhores dispositivos atuais.
Um fone invisível formado pelos próprios sons! Já imaginou?
Governo do Estado de São Paulo
Tarcísio de Freitas | Governador
Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo
Marilia Marton | Secretária
Frederico Mascarenhas | Secretário-Executivo
Daniel Scheiblich Rodrigues | Chefe de Gabinete
Vanessa Costa Ribeiro | Coord. da Unidade de Preservação do Patrimônio Museológico
IDBrasil Cultura, Educação e Esporte – Organização Social de Cultura
Conselho de Administração
Carlos Antonio Luque | Presidente
Renata Vieira da Motta | Diretora Executiva
Vitoria Boldrin | Diretora Administrativa e Financeira
Roberta Saraiva | Diretora Técnica
Exposição Essa Nossa Canção
Carlos Nader e Hermano Vianna | Curadoria
José Miguel Wisnik | Consultoria
Isa Grinspum Ferraz | Curadoria especial
Marcelo Macca | Pesquisa
Exposição virtual
Marcelo Macca | Texto original
Cecilia Farias e Leonardo Arouca | Adaptação e montagem
Camila Aderaldo | Revisão
Cecilia Farias | Tradução
*Todos os conteúdos estão protegidos por direitos autorais*