Bori, de Ayrson Heráclito - A performance

No acervo da Pinacoteca, a performance Bori (2008), de Ayrson Heráclito, interpreta um ritual de religiões de matriz africana no qual se oferta comida à cabeça espiritual.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Bori

A cerimônia do Bori saúda e fortalece a cabeça. Ao oferecer-lhe alimentos e flores, se evoca Oxalá e Yemanjá, um orixá mulher diretamente relacionada ao Ori e,  por isso, considerada a “senhora de todas as cabeças".  

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Ori é uma divindade que reside em cada ser, uma força conectada entre seu orixá e ao poder da criação. Já orixá é uma força natural que rege cada indivíduo

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Na obra intitulada Bori (2008/2022), Ayrson Heráclito realiza uma adaptação do ritual, preservando elementos reservados ao contexto dos terreiros, enquanto cultiva a familiaridade também de pessoas não iniciadas com aquele repertório de crenças e práticas. 

Na qualidade de artista e de ogã da nação Jeje-Mahim, Heráclito estabelece pontes entre a arte e a religião, guiado pelo respeito aos diferentes regimes de visibilidade. Partindo da interpretação dos ritos de religiões de matriz africana, a poética de Heráclito, busca criar perspectivas de cura para histórias de violência.

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A performance

Integra o acervo da Pinacoteca de São Paulo desde 2020 e foi apresentada no Octógono da Pina Luz em agosto de 2022, como parte constituinte da exposição Ayrson Heráclito: Yorùbáiano, que ficou em cartaz entre 02 de abril e 22 de agosto no edifício Pina Estação.

Nos rituais, primeiramente costumam ser servidos Exú e Pombogira. No Bori de Ayrson Heráclito, não existe a cabeça de Exú, mas ao orixá é oferecido o Padê, uma farinha de mandioca branca crua composta por quatro partes.

A primeira preparada com água;
a segunda, com pinga;
a terceira, com mel;
e a quarta, com dendê. O Padê do Pombogira, por sua vez, é contém uma parte de dendê e outra de mel.

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Orixá Ogum

Chamado de Isú em Yorubá, o inhame é oferecido a diversos orixás. A raiz faz referência ao trabalho, à cultura de subsistência e alimentação dos seres humanos. Há alguns modos de preparar o alimento, a depender da energia que se quer ativar.

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Ele pode emanar uma força mais agressiva ou ajudar a resolver um problema mais resistente. Os inhames costumam ser ornamentados com lanças ou paliteiros de Ogum.

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Orixá Oxóssi

Oxóssi (ou Odé) é ligado ao milho (axoxó), alimento que denota fartura e riqueza, meio para se obter abundância e afastar a fome.  Junto com as frutas, esse legume é um dos principais símbolos de Odé (caçador). 

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As espigas de milho com as palhas desfiadas evocam a prosperidade por meio da proteção desse orixá da expressão da vida. Nos festejos de  Oxóssi (Odé), o milho de galinha é adornado com as espigas e usado na oferenda e na cabeça do orixá. 

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Orixá Xangô

Xangô é orixá da justiça, da não imparcialidade. O seu machado nunca olha apenas para um lado, mas sua navalha corta para os dois lados. O quiabo está presente em muitos pratos de santos, como o caruru dos Ibeji’s, é um dos alimentos oferecidos a Xangô.

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Quando se prepara esse prato, não se pede por justiça, mas por misericórdia. Já que o machado de Xangô corta para os dois lados.


Curiosidade:

Quando utilizamos a palavra Santo, também estamos nos referindo aos orixás, nkisis ou voduns. A expressão Santo é um código, já que por muito tempo era proibido a prática das religiões de matriz africana.

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Orixá Oxumaré

A batata doce é um dos alimentos preferido de Oxumaré, como também a própria banana da terra. Para os orixás conectados ao ciclo da vida, como Nanã e Yewa, mãe e irmão de Oxumaré, o alimento representa as relações de enraizamento e profundidade com a terra.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Fincado no solo que encobre suas formas incertas, o tubérculo é associado às serpentes e ao ato de serpentear.

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Orixá Oxum

O feijão fradinho decorado com ovos é oferecido para orixá Oxum, o prato denominado como Omolocum, um dos principais alimento deste orixá, significa filho do mar. Oxum é a mãe das águas doces, orixá considerada a primeira Yalorixá (palavra-chave para Mãe de santo).

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Cada grão de feijão e também os ovos fazem alusão aos óvulos, que representam a fertilidade feminina e o nascimento. O feijão fradinho está presente em outros pratos, como o acarajé, que simboliza a fecundidade, prosperidade e fartura. 

O feijão fradinho está presente em pratos das Yabás (Orixás mulheres). O grão também compõe a base da massa do acarajé de Yansã, que simboliza a fecundidade, a prosperidade e a fartura.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Orixá Iansã

Acarajé é um bolinho feito de feijão fradinho, que passa por uma preparação até se tornar uma massa, logo batida com cebola e sal e frita no azeite de dendê. Alimento da Yabá Yansã, acarajé significa bola de fogo. 

Seu preparo é realizado por uma filha de Iansã, cuja fertilidade e força de guerreira acredita-se estarem representadas nesses bolinhos.

A preparação da massa do acarajé envolve várias etapas, desde a hidratação do feijão à lavagem, à retirada da casca e à moagem dos grãos. Depois isso, o ingrediente chega ao estado de farinha e vai para um grande tacho para vai ser batido com sal e cebola. 

O movimento deve ser intenso e ter momentos de descanso para que a massa cresça. Quando mais batida, mais aerado ficará o bolinho, que depois será frito no azeite de dendê.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

ORIXÁ OXALÁ

O milho branco, mais conhecido como canjica, é o alimento de Oxalá, o orixá FunFun. Presente em todas as obrigações, do ebó à iniciação, esse grão representa calmaria e purificação. É oferecido ao orixá apenas cozido na água, sem nenhum outro ingrediente, e servido frio.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

ORIXÁ YEMANJÁ

Na culinária do axé, os grãos representam prosperidade e fecundidade, e não à toa estão presentes nos alimentos das divindades femininas. Pode-se dizer que Iemanjá não é apenas a mãe das águas salgadas, mas também do encontro das águas doces.  

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

O arroz e a fava também denotam a fertilidade e a abundância que germinam em terrenos alagados. Quando cozida, a fava branca chega à tonalidade de madrepérola, a coloração faz alusão ao mar e evoca as histórias relacionadas a Yemanjá.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

ORIXÁ TEMPO

O amendoim está presente no alimento de muitos orixás: no caruru oferecido aos Ibeji, na preparação da cobra de batata doce para Oxumaré, no doce feito para Ogum, entre outros. O alimento é também oferecido ao orixá Tempo, também denominado Kitembo pelos Bantu da nação Angola.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Essa entidade que comparece em diferentes matrizes representa o senhor do afiar o tempo, a navalha, atributos ligados ao povo da palha, mais especificamente aos filhos de Nanã, atribuídos do conhecimento sobre os ciclos da vida.  

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ORIXÁ OSSANHA

O xerém lembra uma farinha feita a partir de milho quebrado. Na performance Bori, de Ayrson Heráclito, este alimento, junto com o fumo de corda, é ofertado à cabeça deste orixá.  Santo das matas e curandeiro, Ossanha é associado ao ciclo da vida.

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ORIXÁ NANÃ

A cabeça dedicada a Nanã tem feijão preto, em alusão à terra, o mesmo feijão preto que integra a feijoada de Ogum. Nanã ainda recebe milho branco, mais conhecido como canjica, também dedicada a Oxalá como símbolo da pureza e da água.

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Além desses dois ingredientes, a pipoca não estourada é um alimento votivo ofertado à matriarca Nanã, senhora da vida e da morte, entidade do reino dos Egum, mãe de Omolú e  esposa de Oxalá. Não à toa, os alimentos destes dois orixás estão presente na comida de Nanã.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

ORIXÁ OMOLÚ ou OBALUAÊ

Milhos de pipoca são considerados as rosas do velho e representa a transmutação, a modificação do corpo e das chagas, por isso, simboliza a cura. Conta a história que, por meio do vento, Yansã revelou um homem lindo embaixo das vestes de palha e transmutou suas chagas em pipoca.

A performance Bori (2008) de Ayrson Heráclito integra o acervo da Pinacoteca de São Paulo, desde 2020. Apresentada no octógono em agosto de 2022, como parte da exposição Ayrson Heráclito: Yorùbáiano na Pina Estação.

Sua poética que parte dos ritos de religiões de matriz africana é um modo de cura para uma história de violência.

Imagem da performance "Bori", de Ayrson HeráclitoPinacoteca de São Paulo

Créditos: história

Fotografias de Christina Ruffato
Vídeos de Produtora Poseídos

Créditos: todas as mídias
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