Retrato de Nicolaus Padavinus

A atividade de Jacopo Tintoretto como retratista, durante os últimos anos da sua vida, foi desenvolvida, sobretudo, ao serviço dos membros da alta aristocracia veneziana. Continuando uma grande tradição inaugurada por Tiziano, o pintor soube criar uma fórmula de sucesso, unindo a descrição cuidadosa dos elementos necessários para qualificar o nível social dos personagens, o ambiente e o traje, a uma penetrante análise dos traços fisionômicos, com resultados de grande realismo psicológico. Ocupado com a realização de grandiosas encomendas para a república e para as principais instituições religiosas de Veneza, Tintoretto deixava em grande parte a execução aos seus colaboradores limitando a sua intervenção às partes mais importantes das telas. No belo retrato da Casa Museu Eva Klabin aparece uma inscrição em latim identificando o retratado e a ocasião da encomenda: “Nicolaus Padavinus a Decemvirum secretis extra ordinem electus MDLXXXIX” (Nicolò de Pádua, eleito secretário dos Decênviros secretos no ano de 1589). A grafia correta do nome seria “Nicolaus Patavinus”: é possível, portanto, supor que o erro seja fruto da incompreensão de um texto mais antigo durante restauro realizado no passado. Toda a inscrição seria assim de uma época posterior. O Nicolò de Pádua mencionado poderia ser o jurisconsulto Nicolò Genua Patavino, morto em 1615, autor de tratados de direito, editados em Veneza ainda em 1621. O texto nos informa de que Nicolò teve a honra extraordinária de ser eleito como um dos quatro secretários do Conselho dos Dez, do governo da República de Veneza, embora não fizesse parte da ordem dos juristas da cidade. O cargo era um importante passo para poder conseguir a admissão no selecionado círculo do poder e da mais elevada aristocracia veneziana. A importância da nomeação, que deu origem à encomenda a um dos mais celebrados pintores de Veneza, justificaria a pose orgulhosa e solene do retratado. O traje é típico dos nobres venezianos da segunda metade do século XVI: a toga longa preta, forrada de pele, de amplas mangas; bem como o ambiente áulico enfeitado por grandes colunas de mármore. O retrato traduz a imagem de dignidade, de sobriedade, de equilíbrio almejada pelo homem de estado da república: as virtudes e as características humanas que o tornariam digno de continuar a tradição de bom governo de que a nobreza veneziana se orgulhava, para formar uma casta extremamente fechada na defesa dos próprios privilégios. Por outro lado, o olhar agudo e as feições do rosto, realizadas com admirável maestria pelo pincel do pintor, sugerindo uma profunda compreensão do temperamento do modelo, traduzem inteligência e perspicácia no manuseio dos assuntos diplomáticos e políticos, dignos de um estadista da época de Maquiavel, experimentado conhecedor da realidade humana.