Esta pequena tela – na verdade uma pintura sobre cartão colado sobre tela, técnica muito adotada no período romântico por unir a maciez do cartão à durabilidade da tela – é uma das poucas pinturas executadas por Jean Baptiste Debret durante sua estada de mais de quinze anos no Brasil. Provavelmente pintada poucos meses depois de o artista chegar ao Rio de Janeiro em março de 1816, a cena faz menção ao episódio histórico em que o governo português, então sediado na cidade do Rio de Janeiro, decidiu enviar ao Sul do Brasil uma divisão do Exército para tratar da Questão Platina. O rei Dom João VI decidira anexar a Banda Oriental – hoje o Uruguai – ao Reino do Brasil e envolveu o Império em conflitos que se estenderam até a Guerra da Tríplice Aliança, mais conhecida como Guerra do Paraguai, que ocorreu entre 1864 e 1870. Dom João enviara as tropas porque sua mulher, Dona Carlota Joaquina, como membro da casa reinante espanhola dos Bourbon, teria direito aos territórios espanhóis na América, já que a Espanha estava sob domínio de Napoleão Bonaparte. As forças enviadas ao Sul do Brasil eram compostas de 4.831 homens. O grupo ficou estacionado por algum tempo na Armação (mais tarde chamada de Praia Grande, em Niterói) e partiu para Santa Catarina em duas etapas, a primeira em janeiro de 1816 e a segunda em junho do mesmo ano. Debret relatou o episódio em seu livro Viagem pitoresca e histórica ao Brasil: “A decisão tomada de há muito pelo governo português de apossar-se de Montevidéu, a fim de fazer desse território a fronteira do Brasil com as possessões espanholas, teve execução em 1816 (…). Entretanto, após as evoluções militares realizadas diariamente em presença do Regente, para sua distração, o Marechal Beresford, generalíssimo das tropas portuguesas, organizou uma última revista, com uma pequena guerra simulada, nesse lugar pitoresco que apresentava posições variadas para o ataque e a defesa.” Nesta tela, o artista apresenta a pequena guerra sendo encenada para distração de Dom João VI, que está no centro da composição sobre um cavalo branco. À esquerda do monarca estão três figuras, que provavelmente são o príncipe Dom Pedro (futuro Dom Pedro I), o infante Dom Miguel e, com um chapéu na mão direita, o marechal-general Lorde Beresford, comandante das tropas portuguesas, que parece indicar ao monarca a pequena simulação. À direita de Dom João se vê a princesa Dona Maria Teresa e ao fundo uma série de figuras da corte. É interessante notar que Debret, pintor histórico formado pela Académie des Beaux-Arts de Paris, teve poucas oportunidades de exercitar esse papel durante o período que residiu no Brasil, na medida em que a corte portuguesa não tinha o hábito de encomendar pinturas desse tipo. Esta pintura de Debret, provavelmente um estudo para um trabalho de maiores dimensões que não chegou a ser executado, constitui uma tentativa de criar uma pintura histórica abaixo do Equador.