Uma Longa Viagem: os coches e os seus mitos

Retrato de D. João V (Século XVIII) de Carlos Antonio LeoniMuseu Nacional dos Coches

D. João V

"O Magnânimo" (1689-1750), Rei de Portugal e dos Algarves, foi considerado Senhor de uma vasta cultura científica e literária, conhecedor dos autores clássicos e modernos. A sua sólida educação foi muito marcada pela própria mãe e por influência de padres jesuítas.

Cortejo no Terreiro do Paço, Lisboa (Século XVIII) de Jose CiríacoMuseu Nacional dos Coches

A grandeza de alguns eventos do seu reinado ficou na memória dos portugueses e das cortes europeias, de que é exemplo o desfile organizado para a entrada da rainha D. Maria Ana de Áustria, em Lisboa, aquando do seu casamento com D. Joao V.

Assim o descreve Monsenhor Pereira Botto, no «Promptuario analytico dos carros nobres da Casa Real Portuguesa e das carruagens de gala» (...) "Vulcano e Ciclopes, Vénus e Cupido, tudo no Terreiro do Paço se move", ou na grande descrição da Embaixada ao Papa Clemente XI,em 1716.

‏‏‎ Coche de D. João V (Séc. XVIII) de Autor desconhecidoMuseu Nacional dos Coches

A Cultura de D. João V

A cultura elevada de D. João V contribuiu para que os Coches da Embaixada ao Papa Clemente XI, no ano de 1716, para além de faustosos, representado a sumptuosidade do poder absoluto da monarquia, fossem também a expressão de um reino instruído e conhecedor da herança clássica.

‏‏‎ Coche de Maria Ana D’ÁustriaMuseu Nacional dos Coches

Assim, os Coches surgem-nos recheados de múltiplos elementos simbólicos, alegorias à Pátria que se mesclam com a Mitologia clássica.

Retrato do 1º Marquês de Abrantes (Século XVIII) de Vieira Lusitano (attrib.)Museu Nacional dos Coches

O Embaixador - 3º Marquês de Fonte

D. João V, cujo reinado foi um dos mais significativos para a diplomacia portuguesa, fez desta Embaixada o ponto alto de ostentação, ao enviar a Roma D. Rodrigo Annes de Sá Almeida e Meneses, 3º Marquês de Fontes, visando obter prerrogativas para a Igreja portuguesa.

Fontein op Piazza Colonna te Rome (1675 - 1711) de anoniemRijksmuseum

O Cortejo do Marquês de Fontes

O Magnífico cortejo que conduziu o Marquês de Fontes da sua residência na Piazza Colonna ao Palácio Quirinal contribuiu para o prestígio de Portugal junto da Santa Sé e para a afirmação do poder do Reino e do monarca, no quadro internacional da Europa.

‏‏‎ ‏‏‎ (Século XVIII, 1ª metade) de Autor desconhecidoMuseu Nacional dos Coches

O Coche do Papa Clemente X

Na sequência do nascimento do primogénito da Família Real portuguesa, o Papa Clemente XI enviou por mar, a Lisboa, o Núncio Apostólico que consigo trazia este Coche e as “Faixas Bentas” para a Cerimónia do Batismo do príncipe D. José

Coches da Embaixada Coches da Embaixada (Final do século XVIII) de Autor desconhecidoMuseu Nacional dos Coches

Os Coches Triunfais

Os três coches triunfais que fizeram parte da Embaixada de D. João V ao Papa Clemente XI fazem-nos recuar a uma viagem histórica e simbólica de um Portugal feito de ostentação e sumptuosidade. Também recordam a importância política, diplomática e cultural das Embaixadas e Entradas Solenes nas cortes europeias. O dia escolhido para a primeira audiência pública do Embaixador Extraordinário enviado a Roma foi emblemático: 8 de julho, dia da evocação da Rainha Santa Isabel de Portugal.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

O Coche do Embaixador, o Coche dos Oceanos e o Coche da Coroação de Lisboa

O Coche do Embaixador, o Coche dos Oceanos e o Coche da Coroação de Lisboa, mandados construir em Roma, revelam uma grande qualidade artística, cuja mensagem alegórica dá enfase ao Título de Estado que D. João V possuía por direito, "Senhor da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia”.

Coches da Embaixada Coches da Embaixada (Final do século XVIII) de Autor desconhecidoMuseu Nacional dos Coches

O Coche do Embaixador

O Coche dos Oceanos

O Coche da Coroação de Lisboa

‏‏‎ Coche dos OceanosMuseu Nacional dos Coches

As Alegorias e os Coches

Nestes Coches Triunfais, idealizados pelo próprio Embaixador, Marquês de Fontes, são visíveis as alegorias relativas aos feitos heróicos da História de Portugal, no domínio dos Descobrimentos e conhecimento dos mares. As decorações refletem também uma linguagem clássica cujo incremento se foi afirmando desde o Renascimento e de que é exemplo o poeta Luís de Camões.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

O Coche do Embaixador

Dedicado à Navegação e Conquista, o Coche apresenta, no alçado traseiro à esquerda, a figura de Tétis, que aqui simboliza a Navegação. É sustentada por um Atlante e está a desenhar rotas num globo.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

No mesmo alçado, um Tritão, ser mitológico a que se associava o Ocidente, emerge das águas e segura uma agulha de marear.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

Do lado direito, Belona, divindade de origem romana, simboliza, por sua vez, a Conquista, empunhando um escudo e comanda um Leão, símbolo do poder real.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

Coche do Embaixador e os seus Mitos

No jogo dianteiro é visível Sileno, o tutor de Baco, conduzindo um cavalo marinho ladeado pelas alegorias da Guerra, aqui figurada como Minerva, divindade que simboliza os feitos heróicos, e da Esperança.

‏‏‎ Coche dos OceanosMuseu Nacional dos Coches

O Coche dos Oceanos

Este Coche evoca, no alçado traseiro, o encontro dos Oceanos Atlântico e Índico e a passagem do Cabo da Boa Esperança, pelos portugueses em 1487.

Coches da Embaixada Coches da EmbaixadaMuseu Nacional dos Coches

Apolo, o deus da Luz, acompanhado pela sua lira, glorifica e dá a conhecer ao Mundo, representado pelo globo terreste, o feito histórico da Passagem do Cabo da Boa Esperança. Esse acontecimento surge aqui simbolizado através do aperto de mão dos dois oceanos, figurados por velhos sentados sobre golfinhos.

‏‏‎ Coche dos OceanosMuseu Nacional dos Coches

O Coche dos Oceanos e as 4 Estações

As Estações do Ano, figuras mitológicas de grande expressão no período barroco, completam este quadro com a representação da Primavera e do Verão.

Do lado esquerdo apresenta-se o Verão aqui figurado por Ceres, que segura um molho de espigas.

Apolo ladeado pelo Verão e pela Primavera.

Do lado direito apresenta-se a cornucópia da Abundância, simbolizando a Primavera.

‏‏‎ Coche dos OceanosMuseu Nacional dos Coches

O Outono e o Inverno

No alçado dianteiro, de cada lado do banco do cocheiro figuram o Outono, com frutos da época, e o Inverno, segurando um braseiro. As Estações do Ano, também elas figuras mitológicas de grande expressão no período barroco, adequam-se perfeitamente à fisionomia dos coches.

O Inverno está figurado com as vestes adequadas à estação do ano.

Coche da Coroação de Lisboa Coche da Coroação de Lisboa (Século XVIII, 1ª metade) de Autor desconhecidoMuseu Nacional dos Coches

O Coche da Coroação de Lisboa

O Coche da Coroação de Lisboa é dedicado a «Lisboa Capital do Império» e também ele está pleno de alegorias.

Coche da Coroação de Lisboa Coche da Coroação de LisboaMuseu Nacional dos Coches

No alçado traseiro estão figuradas a Fama, com a sua trombeta, e a Abundância com a cornucópia. Ambas ladeiam a figura de Lisboa com o ceptro apontado aos continentes africano e asiático.

Coche da Coroação de Lisboa Coche da Coroação de LisboaMuseu Nacional dos Coches

Façam pois esta longa viagem … entre os "Coches e os seus Mitos"!

Créditos: história

Ficha Técnica

Coordenação: Silvana Bessone
Conceção: Teresa Abreu
Conteúdos: Filomena Barata; Rosinda Palma; Teresa Abreu
Fotografias: Pedro Beltrão; Nuno Augusto; DGPC-DDF-MNCoches
Tradução: Luis Ramos Pinto
Apoio Informático: Luís Ramos Pinto

Bibliografia Sumária:
BESSONE, Silvana, «De passeio com deuses e heróis» in Actas do Colóquio Internacional, Mytos», pp.103-118, 2008
BOTTO, J. M. Pereira, «Prontuário Analítico dos Carros Nobres da Casa Real Portuguesa e das Carruagens de Gala», Imprensa Nacional, tomo I, Lisboa, 1909
PEREIRA, João Castel-Branco, «Tronos Rolantes da Monarquia Portuguesa», in Oceanos, nº 3, Lisboa, 1990, pp.121-122

Créditos: todos os meios
Em alguns casos, é possível que a história em destaque tenha sido criada por terceiros independentes, podendo nem sempre refletir as visões das instituições, listadas abaixo, que forneceram o conteúdo.
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