Eu só disse o meu nome

Em memória de Alexandre Vannucchi Leme (1950-1973)

Alexandre Vannucchi Leme retratado em estúdio fotográfico aos 2 anos de idade (1952), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Alexandre Vannucchi Leme nasceu em Sorocaba, a 100 km de São Paulo, no dia 5 de outubro de 1950. Mais velho de seis irmãos, quatro meninas e dois meninos, era filho dos professores José Oliveira Leme e Egle Maria Vannucchi Leme.

Alexandre Vannucchi Leme em sua primeira comunhão, aos 7 anos (1956), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Com um tio padre e três tias freiras, Alexandre foi desde cedo influenciado pela fé católica. Em abril de 1964, apenas cinco dias após um golpe militar no Brasil, o garoto de 13 anos se surpreenderia com a prisão desse tio, Padre Aldo, acusado de subversão.

Alexandre Vannucchi Leme recebe prêmio de desempenho escolar aos 10 anos (1960), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

O início da vida escolar se deu em Itu, vizinha a Sorocaba, onde viveu a maior parte da infância, desde que o pai passou a lecionar na Escola do Senai, naquela cidade. Aluno do Instituto de Educação Regente Feijó, Alexandre logo se destacou como melhor aluno da sala.

Boletim escolar de Alexandre Vannucci Leme no 4º ano (1961), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Trecho de entrevista com Beatriz Vannucchi Leme, irmã de Alexandre Vannucchi Leme
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As notas acima de 9 seriam uma constante em sua adolescência. Na memória das irmãs, Alexandre gostava de ficar sozinho em seu quarto, sempre estudando. A exceção eram os dias de jogos do Corinthians, que o faziam disputar a TV com os irmãos.

Alexandre Vannucchi Leme na recepção aos calouros do curso de Geologia da USP (1970), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Aprovado em 1º no vestibular para Geologia, Alexandre (à esquerda) entra para a Universidade de São Paulo (USP) em 1970. Um dos trotes consiste em ter o corpo lambuzado com óleo. O país é governado pelo general Emílio Garrastazu Médici e vive a fase mais truculenta da ditadura.

Calouros do curso de Geologia da USP diante de barracão construído para a semana de recepção (1970)Instituto Vladimir Herzog

Um galpão foi construído pelos estudantes especialmente para a semana de recepção aos calouros. “Centro de sobrevivência”, dizia o cartaz. Referência ao terrorismo de Estado cada vez menos discreto? Alexandre é o rapaz de camisa branca e óculos em pé no centro da foto.

Alexandre Vannucchi Leme aos 19 anos, em foto para a carteirinha do Centro Acadêmico (1970)Instituto Vladimir Herzog

Na Geologia, Alexandre ganhou o apelido de “Minhoca”. Poderia ser uma referência ao corpo franzino e à paixão pela terra, mas homenageava um professor do curso, Sérgio Estanislau do Amaral, que era conhecido como Minhocão e que Alexandre se especializou em imitar.

Excursão de Alexandre Vannucchi Leme com os colegas do 1º ano de Geologia ao município de Itu (1970), de Roberto NakamuraInstituto Vladimir Herzog

Trecho de entrevista com Adriano Diogo, colega de Alexandre Vannucchi Leme no curso de Geologia
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Trabalhos de campo eram frequentes no curso de Geologia. Em viagem a Itu, no interior de São Paulo, Alexandre é o rapaz de óculos com a mão no ombro do amigo, à esquerda na foto.

Registro da comemoração de Natal da família Vannucchi Leme em Sorocaba (1972)Instituto Vladimir Herzog

Alexandre costumava voltar a Sorocaba nos fins de semana. Em 1972, as visitas rareavam, conforme se intensificava sua participação no movimento estudantil e na Ação Libertadora Nacional (ALN), grupo de enfrentamento à ditadura. No Natal, apresentou a namorada Lisete à família.

Obituário de Alexandre Vannucchi Leme no jornal O Globo (1973-03-23), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Preso no DOI-Codi, o mais temido centro de tortura da ditadura, Alexandre agonizava quando voltou à cela no dia 17 de março de 1973. “Meu nome é Alexandre Vannucchi Leme”, disse. “Me acusam de ser da ALN. Eu só disse o meu nome”. Os jornais divulgariam versão falsa de sua morte.

Catedral da Sé lotada para missa em memória de Alexandre Vannucchi Leme (1973-03-30), de Estadão ConteúdoInstituto Vladimir Herzog

Sete dias após a divulgação de sua morte, ao menos 3 mil pessoas foram à catedral da Sé para missa em intenção de Alexandre, celebrada pelo arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns em 30 de março. O músico Sérgio Ricardo cantou Calabouço, uma música de protesto que acabara de compor.

Dom Paulo Evaristo Arns celebra missa em intenção de Alexandre Vannucchi Leme (1973-03-30), de Estadão ConteúdoInstituto Vladimir Herzog

Desafiando o cerco policial, com a cavalaria à porta e agentes infiltrados espalhados pelos bancos, Dom Paulo denunciou a execução de Alexandre sob tortura. “Só Deus é dono da vida; dele a origem, e só ele pode decidir o seu fim”, começava a homilia do arcebispo.

Gilberto Gil se apresenta na Escola Politécnica da USP (1973-05-26), de Carmen PradoInstituto Vladimir Herzog

A fim de denunciar a prisão de mais de trinta estudantes da USP além da morte de Alexandre e do colega Queiroz, Gilberto Gil topou fazer um show na Escola Politécnica em maio. Ali, driblou a censura e cantou Cálice pela primeira vez. Ao fundo, os nomes de quem continuava preso.

Egle, a mãe, em vigília junto aos restos mortais de Alexandre Vannucchi Leme (1983), de Pedro ViegasInstituto Vladimir Herzog

Apenas dez anos após a morte de Alexandre, enterrado como indigente em São Paulo, sua família pôde transferir os restos mortais para Sorocaba. Na foto, a mãe, Egle, em vigília na Escola Getúlio Vargas. Retrato de Alexandre começa a virar símbolo de luta por justiça e reparação.

Inauguração da Praça Alexandre Vannucchi Leme, em Sorocaba (1978), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

Cinco anos após a morte de Alexandre, uma praça com seu nome foi inaugurada em Sorocaba. À medida que a abertura lenta e gradual prometida pelo então presidente Geisel começava a sair do papel, a morte sob tortura de um estudante de 22 anos provocava indignação e solidariedade.

Carta do escritor Gabriel García Márquez para a inauguração da Praça Alexandre Vannucchi Leme (1978), de Autor desconhecidoInstituto Vladimir Herzog

A inauguração da praça motivou manifestações de apoio de intelectuais como o escritor colombiano Gabriel García Márquez, que enviou uma carta para ser lida na ocasião. “Estou aí, ao lado de vocês, e ao lado da luta dura que vocês vêm travando pela democracia”.

José de Oliveira Leme e Egle Vannucchi Leme com retrato do filho Alexandre (2006), de Epitácio PessoaInstituto Vladimir Herzog

José e Egle Vannucchi Leme tornaram-se grandes referências na luta por memória, verdade e justiça desde a corajosa busca pelo paradeiro de seu filho, entre prisões e centros de tortura, nos dias que sucederam 17 de março de 1973. Ele faleceu em 2014 e ela, em 2019. 

Ato na USP marca a concessão póstuma de anistia política a Alexandre Vannucchi Leme (2013), de Marcelo Camargo / Agência BrasilInstituto Vladimir Herzog

Alexandre foi anistiado pelo Estado quarenta anos após sua morte, em cerimônia póstuma, celebrada em 2013 no Instituto de Geologia da USP. Entre os presentes estavam a então ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, e o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão.

Bandeira com o rosto de Alexandre Vannucchi Leme em passeata pela democracia (2022), de DCE-Livre Alexandre Vannucchi LemeInstituto Vladimir Herzog

Seu rosto foi eternizado na logomarca do Diretório Central dos Estudantes da USP, fundado em 1976 com o nome de DCE-Livre “Alexandre Vannucchi Leme”. Faixas e bandeiras com a imagem são vistas com frequência em manifestações populares por democracia e direitos humanos.

Créditos: história

Exposição "Eu só disse o meu nome" - Em memória de Alexandre Vannucchi Leme (1950-1973)

Coordenação - Camilo Vannuchi
Curadoria - Carolina Vilaverde

Pesquisa -  Carolina Vilaverde e Camilo Vannuchi
Montagem - Carolina Vilaverde
Textos - Camilo Vannuchi
Traduções - Aline Matos Gurgel 

REALIZAÇÃO

Instituto Vladimir Herzog
Presidente - Clarice Herzog
Presidente do Conselho Deliberativo - Ivo Herzog
Diretor Executivo - Rogério Sottili
Memória, Verdade e Justiça - Gabrielle Abreu (coord.), Mayara De Lara e Valquíria Ferreira
Comunicação - Lucas Barbosa (coord.), Bruna Pereira e Gabriela Teixeira

AGRADECIMENTOS
Adriano Diogo, Alberto Alonso Lázaro, Beatriz Vannucchi Leme, Caio Túlio Costa, Carmen Prado, Cristina Vannucchi Leme, DCE Livre da USP Alexandre Vannucchi Leme / Gestão É Tudo Pra Ontem, Dirceu Pagotto Stein, João Paulo Teixeira, Juliana Nunes, Juca Varella, Pedro Antônio Chiquitti, Pedro Viegas e Roberto Nakamura. 

Créditos: todas as mídias
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