The production of the 49 square meters imposing painting of Iberê Camargo, a gift from the Brazilian government for the headquarters building of the World Health Organization, opened in 1966, in Geneva.
“A Organização Mundial de Saúde foi construída com a colaboração de cada país participante. O Brasil oferecerá uma obra de arte que se integre no ambiente do edifício e eu fui convidado para criar essa obra, a contribuição brasileira. O painel é de grandes dimensões, assim como me apraz trabalhar: medirá 49 metros quadrados e será colocado sobre um suporte de madeira.”
Study for World Health Organization panel, Geneva (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
Uma das instituições criadas no segundo pós-guerra (1947), no contexto da reconstrução e da reorganização do mapa político internacional, a OMS recebeu doações de todos os países membros para construir e equipar a sua sede na Suíça. O Brasil, por meio de seu Ministério de Relações Exteriores, ofereceu um presente cultural: uma pintura original que Iberê realizaria in loco.
“Pintar o painel é um desafio. Vou operar o rei”, disse o artista na época, em entrevista ao O Globo.
Quando foi convidado para realizar o mural em Genebra, Iberê já havia provado sua competência. Então com 52 anos de idade, possuía uma carreira consolidada a ponto de tornar-se merecedor da distinção de representar seu país.
“Estou pensando numa maneira de levar, pelo menos, o desenho já idealizado e riscado. [...] Meus esboços são, como vou dizer… um pouco sumários. Quero que neles fique apenas a sugestão mais importante em torno da qual vou trabalhar depois.”
“Será uma composição abstrata, porque é assim meu trabalho atualmente. Já tenho mais ou menos o plano para sua realização, a propósito estive conversando com vários arquitetos (é necessário que haja integração entre o trabalho do arquiteto e do artista) e Lúcio Costa me fez uma observação interessante, que vou aproveitar na composição do painel.
Observando a planta do edifício, que veio a meu pedido, Lúcio fez notar que o painel começará a ser visto já de uma distância de quarenta metros, num ambiente todo neutro, portanto aberto à qualquer coloração que se queira empregar.
O interessante é que devido a um falso forro que lhe cobre, à distância, a parte superior, o painel somente será visto em sua totalidade à uma distância de poucos metros.
E isto eu vou aproveitar para dar um movimento, uma dinâmica visual à obra, realizando um painel em dois planos.
O primeiro que se vê a distância e um que possibilite a realização de um outro, que cause um novo impacto ao observador que vê de perto. Procurarei no entanto que estas duas concepções se conciliem para, numa visão total, oferecer de novo um quadro diferente.”
Study for World Health Organization panel, Geneva (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
“Minha pintura é como a visão de criança pura, como deve ser todo ato criador.”
Incluindo o período em que realizou uma série de estudos, foram aproximadamente 4 meses de trabalho para uma pintura de 49 metros quadrados.
Para criar uma “vegetação colorida”, Iberê realizou esboços, começando a brincar livremente com as formas. Formas presas, debaixo do emaranhado de gestos que as levaram à dissolução: pássaros, carretéis, vórtices. Um grande bouquet floral, como sugeriu o amigo e cineasta Mario Carneiro, uma obra “alegre” que evoca a situação de equilíbrio implícita na noção de saúde.
Iberê enfrentou uma série de desafios, como o pó da construção do prédio que impossibilitou iniciar a pintura na data prevista, os andaimes que não permitiam ver plenamente a evolução da obra e o frio que congelava as mãos.
Em cartas que D. Maria, esposa de Iberê, escrevia aos familiares no Brasil, falava do enorme esforço que o artista realizava pintando, inclusive, até altas horas da noite.
“Um edifício nasce do barro, assim como o homem e por isso também tive que enfrentar o pó que vinha do edifício em construção e que me turvava a vista a maior parte do tempo.”
“Passei muitas noites sem dormir, e às vezes ficava pintado até altas horas da noite, apesar da insuficiência de luz, porque eu não precisava dela: a minha luz vem de meu interior.”
Iberê observes the World Health Organization panel in production process (1966)Iberê Camargo Foundation
World Health Organization panel (detail) (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
Iberê painting the World Health Organization panel (1966)Iberê Camargo Foundation
World Health Organization panel (detail) (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
Iberê painting the World Health Organization panel, 1966 (1966)Iberê Camargo Foundation
“Eu trabalho com impetuosidade. O gesto que coloca a cor. Cria o tom, estabelece relações novas, inesperadas. As metamorfoses se sucedem, os contrastes se acentuam, a composição adquire uma estrutura. Eu busco a dinâmica e o equilíbrio em figuras que se abrem e se dispersam. Sinto-as fisicamente, com todo o meu corpo.”
“A pintura é uma viagem ao desconhecido e uma tela em branco é sempre um desafio para o pintor. Preferi o risco do fracasso a reproduzir uma obra já feita.”
Conta Iberê que visitantes de todas as raças perguntavam-lhe o que representava sua pintura.
“Se eu estava de bom humor respondia: Não representa: é. Se estava de muito bom humor dava uma pequena conferência: – Você ao ver um gato pela primeira vez se surpreendeu? Você aceita as árvores? Habitue-se com as novas formas criadas, elas enriquecem o mundo, além do mundo de Deus, existe o mundo do artista.”
Iberê and the World Health Organization panel in production process (1966)Iberê Camargo Foundation
A obra foi finalmente inaugurada no dia 23 de maio de 1966.
“Empreguei todos os meus esforços para realizar uma obra digna do Brasil.”
“Na arquitetura do suíço Tschumi, a obra de Camargo está perfeitamente valorizada. É um sem-número de cores. Os ocres, os amarelados, os azuis da paleta do pintor brasileiro têm aqui um exuberante desdobramento no espaço. A sã visão do artista espalha-se aí em um alegre turbilhão.
Pinceladas, inflexões, cutiladas são como um enxame encantado. À direita, nos marrons e nos tons oliváceos, uma lembrança do fetiche de Camargo: o carretel.
Um ardente, um maravilhoso fluxo derrama-se por todos os lados, em direção a nós.
Nesse pintor que se renovou constantemente, nesse inquieto sempre em busca de novos meios de expressão, acontece, então, como um sinal de suspensão. Chegamos ao estilo, à maneira de pintar que, durante muito tempo, será a de Iberê Camargo."
Pierre Courthion
World Health Organization panel (detail) (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
Por mais de 40 anos, a agência de Saúde da Organização das Nações Unidas guardou em seus porões uma caixa lacrada com obras inéditas de Iberê Camargo, e que só poderia se aberta pelo diretor-geral da OMS.
Nessa caixa havia 30 estudos feitos com guache, grafite, lápis de cor, nanquim, tinta a óleo e outros materiais, com uma mensagem do próprio artista escrita na tampa: “Não dobre e não remova nada sem a autorização do diretor-geral.”
Esses estudos só foram redescobertos em 2007, após uma consulta feita à Organização pela Fundação Iberê, a pedido de Maria Coussirat Camargo.
“Quando fomos contatados, estranhamos o pedido, pois de fato ninguém nunca havia ouvido falar nisso. Mas depois fomos investigar e encontramos uma caixa com desenhos e rascunhos inéditos de Iberê”, contou Fadela Chaib, porta-voz da OMS à época.
A caixa foi aberta em janeiro de 2008, na presença de autoridades da OMS, incluindo a então diretora-geral, a chinesa Margaret Chan. Uma parte foi cedida em empréstimo para a exposição do centenário de nascimento de Iberê, em 2014, na Fundação Iberê. Hoje, encontram-se preservados no Arquivo da OMS, em Genebra, como parte do presente do governo brasileiro.
Study for World Health Organization panel, Geneva (1966) by Iberê CamargoIberê Camargo Foundation
The roadmap for WHO panel production from correspondence:
April 30, 1964 The Brazilian government approves the offer of furniture or a room for the new WHO headquarters building in Geneva, Switzerland.
May 12, 1964 WHO sending documents, plans and photos of the building under construction to the Brazilian government to define the offer more precisely.
May 29, 1964 Note for records: instead of decorating a room, the government of Brazil offers the WHO a $ 50,000 fresco.
September 1964 Iberê Camargo starts studies for the WHO headquarters panel.
13 de outubro de 1964
O diretor-geral da OMS, o brasileiro Dr. Marcolino Gomes Candau, informa que a pintura será fixada livremente no salão principal do edifício e não na parede, e descrição dos materiais utilizados pelo arquiteto no edifício.
November 17, 1964 Iberê Camargo describes the composition of the panel and asks for advice on the different woods available in Switzerland. He wishes to start painting on the spot at the end of winter (1965).
January 18, 1965 Acceptance, by the headquarters building committee, of a donation from the government of Brazil.
January 20,1965 Sent, by the architecture office of Jean Tschumi and Pierre Bonnard to WHO, a suggested structure for the painting – that is, 25mm thick Multiplex panels with “abachi” veneer.
2 de fevereiro de 1965
OMS envia exemplos de propostas de materiais a Iberê Camargo.
February 8, 1965 Iberê Camargo accepts the proposal of 25mm thick Multiplex panels with “abachi” laminate as support for the painting. Iberê's proposal to start work in May 1965, if not in winter, provided that there are adequate heating conditions.
February 26, 1965 WHO letter to Iberê Camargo: proposal to start painting in November 1965, installations will be heated.
August 25, 1965 Confirmation by the WHO Directorate-General that Iberê will start painting in late December 1965 and will end in 4 months, just in time for the building to open in May 1966.
21 de setembro de 1965
Iberê avisa que sua ida a Genebra será em dezembro, e solicita ajuda a Sra. Lúcia Olinto: verificar se o painel está devidamente instalado e se há um andaime móvel. “Meu contrato com o Itamaraty estabelece um prazo para a execução da obra. Pretendo iniciá-la tão logo chegue aí. Não posso perder um só dia em outra atividade que não seja a de pintar."
February 7, 1966 Maria Coussirat Camargo reports to her sister and mother that she and Iberê have been together for nine days on the Augustus ship in the direction of Genoa, Italy, from where they will depart by train to Geneva.
February 16, 1966 Information about the type of paint used by Iberê Camargo, who had not yet started painting due to delays in the execution of the building's works.
March 3, 1966 Letter from Maria to her mother, Felicidade Cruz, reporting that Iberê has not yet been able to start painting. Paints have not yet arrived from the Netherlands and the built scaffolding was fixed and was installed very close to the panel.
16 de março de 1966
Iberê Camargo informa o Ministério das Relações Exteriores do Brasil que, finalmente, inicia o desenho do painel, visto que antes não havia condições adequadas.
7 de abril de 1966
A direção-geral da OMS informa o embaixador do Brasil que a construção do prédio está demorando mais que o esperado. Devido à poeira gerada pela obra, Iberê não pode aplicar a tinta a óleo. Ele tem que parar o trabalho por algumas semanas.
7 de maio de 1966
Inauguração da sede.
Raimundo Brito (Brazilian Minister of Health), Iberê Camargo and Maria Coussirat(?) at the inauguration of the World Health Organization headquarters (1966)Iberê Camargo Foundation
11 de maio de 1966
Maria descreve a cerimônia de inauguração da OMS. O evento ocorreu no hall principal, junto ao painel. Os andaimes foram removidos e sinalizou-se ao público que a pintura estava em andamento.
15 de maio de 1966
Maria escreve que Iberê trabalha intensamente até à noite, que durante a madrugada reflete sobre as soluções para a pintura e que espera concluir o painel em uma semana.
23 de maio de 1966
Iberê comunica a Juracy Magalhães, Embaixador e Ministro das Relações Exteriores do Brasil, que concluiu a pintura. “Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que acabo de concluir o painel da Organização Mundial da Saúde, cuja execução me foi confiada por esse Ministério. Empreguei todos os meus esforços para realizar uma obra digna do Brasil.”
28 de maio de 1966
Maria relata a longa jornada de trabalho de Iberê até a finalização do painel. É realizada uma inauguração discreta, reunindo o artista, o diretor-geral e representantes brasileiros na OMS.
11 de junho de 1966
Maria escreve à sua mãe dizendo que o casal chegou em Paris no dia 9 de junho. Comenta sobre visita ao ateliê de André Lhote, onde Iberê estudou, e ao Museu do Louvre, onde reviram pinturas das quais Iberê havia feito cópias em 1949.
23 de junho de 1966
O diretor-geral da OMS, Marcolino G. Candau, solicita ao Ministro das Relações Exteriores do Brasil a doação dos esboços de Iberê: “Esses esboços em guache, pastel e óleo representam a progressão da inspiração e as sucessivas etapas do pensamento de Camargo." Candau diz que os esboços serão emoldurados e organizados em uma sala ao lado da obra principal, para que os visitantes possam apreender a lição de estética que emerge.
July 28, 1966 Response from Juracy Magalhães, Ambassador and Minister of Foreign Affairs of Brazil, stating that the government would be happy to keep the sketches at WHO headquarters and that it will inform the artist.
October 11, 1966 During the solo exhibition of Iberê Camargo at Galeria Bonino, in Rio de Janeiro, a slide show showing the stages of production of the WHO panel is carried out. Presentation and comments by the critic José Roberto Teixeira Leite. This is Iberê's first exhibition since the return of Europe.
November 14, 2014 A set of studies for the panel, belonging to the WHO Archive, is exposed for the first time in Brazil. They were part of the exhibition Iberê Camargo: 21st Century, held at the Iberê Foundation in honor of the centenary of the artist's birth.
Research and organization
Gustavo Possamai
Translation to English
Henrique Ferrari
Sources:
Icleia Borsa Cattani. In: SALZSTEIN, Sônia (org.). Diálogos com Iberê Camargo. São Paulo: Cosac Naify, 2003. p. 81.
Maria Celina. "Iberê Camargo pinta presente do Brasil para OMS na Suíça". Última hora, Rio de Janeiro, October 4, 1966.
María José Herrera. Iberê Camargo: um ensaio visual. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2009. p. 20-25.
"Mundo do gaúcho Iberê Camargo vai virar painel que pintará em Genebra". O Globo, Rio de janeiro, September 3, 1964.
"O pátio é a nossa verdadeira pátria". [s.n.], Porto Alegre, February 21, 1965.
Pierre Courthion. Nascimento de um artista. In: Iberê Camargo. Rio de Janeiro: FUNARTE/Instituto Nacional de Artes Plásticas/Museu de Arte do Rio Grande do Sul, 1985. p. 66-67.
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