Itinerários da Demolição
Na década de 1920, Campinas passou por uma diversificação das práticas econômicas e industriais, encaminhando a cidade para um novo padrão de urbanização. A partir de 1925 a área urbana se ampliou consideravelmente, acompanhada do crescimento populacional, do surgimento de novos bairros e da valorização dos terrenos municipais.
Vista Parcial (1920/1929), de Phot. Leal - EstúdioCentro de Memória-Unicamp
Vista Parcial (1920), de DesconhecidoCentro de Memória-Unicamp
Marcada pelos interesses crescentes em torno da utilização de automóveis, surgiu no final da década de 1920, por setores das elites locais, uma proposta de remodelação urbana para a cidade. Tomando por base uma planta cadastral organizada pelo Prefeito Orosimbo Maia em 1929, em 1931 foi criada pela Prefeitura Municipal uma Comissão de Urbanismo. Em 1934, foi contratado o engenheiro arquiteto Francisco Prestes Maia para estudar um plano de urbanismo, aprovado e regulamentado no ano de 1938.
Entre as propostas discutidas no Plano de Melhoramentos Urbanos de Prestes Maia estavam a abertura de avenidas, o alargamento de ruas e a necessidade de demolições de construções. Uma das que causaram grande desconforto em setores da sociedade campineira se referiu à intenção de alargamento das ruas Campos Sales e Francisco Glicério pelo lado da Igreja do Rosário, causando críticas e indignação em relação à proposta de demolição da igreja.
Avenido Franciso Glicério (1930), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Vista aérea da cidade de Campinas (1938), de EnfaCentro de Memória-Unicamp
As obras de alargamento das avenidas centrais iniciaram-se lentamente após 1938 e até o início da década de 1950 as alterações na paisagem urbana ainda eram relativamente pequenas. A partir de 1956, na gestão do prefeito Rui Novais, aceleraram-se os trabalhos de alargamento das ruas e de demolições de antigos casarões na região central, e até 1965, Campinas foi marcada por uma transformação mais radical da paisagem urbana, uma intensificação do processo de renovação e modernização do centro. Entre os novos prédios construídos estavam o do Palácio da Justiça (Fórum) e do Centro de Ciências, Letras e Artes.
Construção do Fórum - Palácio da Justiça (1939/1943), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Centro de Ciências, Letras e Artes (1940/1949), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
A nova sede do Centro de Ciências, Letras e Artes (fundado em 1901), foi projetada pelo engenheiro Lix da Cunha e inaugurada em sessão magna realizada em 9 de junho de 1942.
Rumo à demolição
Para acelerar as demolições indicadas pelo Plano de Melhoramentos Urbanos a Câmara Municipal de Campinas aprovou em 1951 a lei nº.640 que dispunha sobre as construções existentes nas ruas Francisco Glicério e Campos Sales. Em janeiro de 1956, jornais locais noticiaram a interdição imediata da Igreja do Rosário, justificada por técnicos da prefeitura pela existência de muitas trincas observadas em uma vistoria, colocando em risco o público que frequentava o templo e demandando reformas imediatas e bastante custosas. Contudo, tal laudo foi contradito por outros engenheiros paulistanos, que mostravam que a igreja deveria ser reformada e não demolida.
Vista Parcial de Campinas (1946), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Entretanto, tendo em vista que a lei municipal de 1951 vedava ou colocava dificuldades para reformas em construções da Francisco Glicério que envolvessem custos altos, em abril de 1956 foi assinado o acordo de desapropriação da Igreja do Rosário. O projeto do executivo a respeito foi votado pela Câmara de Campinas que o aprovou por 19 votos contra dois.
Rua Francisco Glicério (1955), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Manchete de jornal sobre a demolição da Igreja de Nossa Senhora da Rosário (1956-07), de Não identicadoCentro de Memória-Unicamp
Em 9 de maio de 1956 foi assinada a escritura definitiva entre a Prefeitura e o Bispado de Campinas, para a efetivação da desapropriação. Poucos dias depois, em 12 de maio, sob consternação de diversos setores da população, foi iniciada a demolição da Igreja do Rosário, finalizada em setembro deste ano.
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956), de Aristides Pedro da SilvaCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja do Rosário (1956-05/1956-09), de Aristides Pedro da SilvaCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956-05-12/1965-09-01), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956), de Aristides Pedro da SilvaCentro de Memória-Unicamp
Demolição da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956), de Aristides Pedro da SilvaCentro de Memória-Unicamp
Toque para explorar
Do acervo do templo, algumas peças acabaram se deteriorando devido a falta de armazenamento correto. Outras foram preservadas, guardadas na Casa das Conferências de São Vicente. Somam-se, ainda, as obras removidas por particulares. Um exemplo foi o do médico campineiro José de Angelis que, dias antes da derrubada da igreja, pediu autorização ao Prefeito Rui Novaes para “salvar” algumas obras sacras. Consta que teria trazido da Europa um restaurador para preservar os painéis e chegou a ampliar a sua residência para abrigar os fragmentos salvos da demolição.
Pintura Mural da Morte de São José (1943/1956), de Studio EurydesCentro de Memória-Unicamp
Fragmento de Pintura Mural (1924/1928), de Thomaz ScheuchlCentro de Memória-Unicamp
A antiga e estreita Rua do Rosário, agora avenida Francisco Glicério, se tornou uma avenida moderna, larga, ladeada por altos edifícios. Consolidou-se uma visão de progresso técnico, aliado à valorização de novos padrões estéticos associados a edifícios altos, ruas mais largas e avenidas que poderiam propiciar uma circulação mais livre de automóveis.
Avenida Francisco Glicério (1957/1962), de José Gomes GuarnieriCentro de Memória-Unicamp
Toque para explorar
O novo Rosário
A demolição da antiga igreja do Rosário levou a uma gama incontável de manifestações. Apesar de constar um acordo entre Dom Paulo de Tarso Campos (Arquidiocese de Campinas), o padre João Batista Engler (Província Claretiana) e o Prefeito Municipal Rui Novaes, foi pequeno o apoio do poder público no período da demolição e posterior a ela. A comunidade campineira, contudo, continuava desacreditada com o ato.
Neste período pós-demolição, os padres claretianos permaneceram hospedados com amigos, até que encontraram uma casa na região da Vila Nova. Apesar da ideia de voltarem para São Paulo, os claretianos resolveram continuar em Campinas, construindo novas casas e a igreja em terreno que eles haviam adquirido anos antes, na região do Jardim Chapadão, impulsionando então o desenvolvimento e urbanização do bairro.
Estrutura no Terreno (1956/1989), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Com a aceitação das autoridades civis e eclesiásticas, os padres iniciaram os projetos, mantendo a ideia de uma casa que pudesse acolher os missionários em suas atividades de evangelização e o noviciado, além de uma nova igreja à imagem da anterior, porém mais simples e maior em suas dimensões, buscando preservar os sentimentos da coletividade.
Construção da Nova Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1964), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
A pedra fundamental foi lançada em 7 de outubro de 1956, festa de Nossa Senhora do Rosário, com a forte presença da comunidade. Os recursos para o templo foram alcançados por meio dos esforços dos padres claretianos, em especial do missionário espanhol Damião Ormaeche, o qual se responsabilizou pelos trabalhos. Em 28 de outubro de 1965, a igreja ainda em obras foi elevada à categoria de Paróquia de Nossa Senhora do Rosário, sendo o primeiro pároco o padre Artidório Aniceto de Lima, CMF.
Padre Damião Ormaeche Leguerica, CMF (1956/1989), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Padre Damião Ormaeche Leguerica, CMF (1956/1989), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
A casa ficou pronta antes da igreja, no início de 1971, mesmo ano da cobertura do templo, ato que marcou a retomada dos atendimentos e das celebrações litúrgicas. A finalização do templo ocorreu no final de 1978, com algumas modificações que o distinguiram da igreja demolida, sobretudo na fachada principal, das quais destacam-se os detalhes da rosácea e a manutenção de uma mesma altura para as torres que, conforme o pároco da época, Padre Geraldo Jarussi, seria resultado de uma economia dos recursos.
Construção da Nova Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1956/1983), de Não identificadoCentro de Memória-Unicamp
Construção da Igreja do Rosário (Castelo) (Entre 1957 e 1967), de Aristides Pedro da SilvaCentro de Memória-Unicamp
Em 7 de outubro de 1989, a Igreja Nossa Senhora do Rosário foi oficialmente inaugurada, marcando um novo capítulo dessa história de fé, arte e cultura do povo campineiro.
Corredor Principal (1990/2010), de Não identicadoCentro de Memória-Unicamp
Fachada da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (2000/2009), de Não identicadoCentro de Memória-Unicamp
Continue sua visita em:
Parte 1: Um Rosário de Memórias: 1817-1928
Diretor
André Luiz Paulilo
Director Associado
Edivaldo Góis Júnior
Curadoria
Ana Cláudia Cermaria
João Paulo Berto
Maria Sílvia Duarte Hadler
Marileide Rayane de Macedo da Silva
Gabrielle Caroline dos Santos Garcia
Agradecimentos
Padre Fernando Garavaglia, CMF
Caio Felipe Gomes Violin
Realização
Centro de Memória-UNICAMP
Junho, 2020
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